Jair Messias Bolsonaro não é o Lula, não se assemelha a ele em nada nem mesmo quando o tema se volta para a privação de liberdade, assim vemos diferenças gritantes no comportamento social em relação a essas duas personagens, em que um (Lula) é levado ao cárcere com seus direitos solapados pelo cinismo de uma elite cáustica e o outro (Bolsonaro), por mais provas que se tenha dos crimes cometidos, tem-se um respeitar canônico, santo, imaculado ao processo e seus ditames.
Quando se fala em prisão, questões do direito penal, como a presunção de inocência, vêm à tona em nossa mente. Isso é assim e deve ser assim, pois, de fato, em uma sociedade democrática é o que se aprende por premissa desde tenra idade.
A presunção da inocência é um fundamento do Direito, esse princípio, inclusive, é consagrado na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no seu artigo 5º, inciso LVII em que diz: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Vindo da Revolução Francesa, 1789, tomando corpo, voz e assento na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Foi um princípio revolucionário, inovador que visava combater os desmandos oriundos dos Estados Absolutistas e sua interpretação divina de soberania e poder, em que a vontade do rei era a vontade do próprio Deus, sendo alguém condenado respondia a essa vontade totalitária. Para o homem burguês sujeitar-se aos caprichos de uma nobreza sem capital, era, além de humilhante, uma questão de humanidade. Buscou-se com esse princípio limitar os poderes de um Estado tirano, dando a oportunidade daquele que é acusado lutar por sua inocência até prová-la. Não provando, garantiria que os meios acusatórios não se limitassem à vontade de um monarca ou de seus representantes, mas recaíssem em dados objetivos (provas) até o ato final de um processo.
Uma questão, entretanto, surge naquilo em que se demonstra fundamental: para quem é o Direito? Ou melhor: a quem serve o Direito?
Vive-se em uma sociedade capitalista e burguesa, o Direito estabelecido nesta sociedade é do burguês- feito para os donos do capital, servindo a eles-, por isso há nas prisões pessoas que não passaram pelo devido processo legal, existem, neste momento, pessoas que estão presas sem o trânsito em julgado- a formação da culpabilidade-, pela cor da pele ou pela condição social, em grande maioria dos casos, pela somatória das duas condições.
A sociedade não é justa, o Direito não faz justiça a não ser que o sujeito de direito tenha dinheiro e seja preferencialmente branco. Os dizeres de uma sociedade ideal não a faz ideal nem tampouco os dizeres de justiça tornam-na mais justa. Assim é comum nos depararmos com homens brancos e ricos que cometem crimes e têm o direito de esperar a prisão em liberdade até o trânsito em julgado das ações que correm contra eles, mas a mesma “sorte” não acompanha o homem preto, pobre, vindo das periferias que deverá encarar o ódio social daqueles que clamam por “justiça”.
Desta feita, tem-se o exemplo do presidente Lula, que ao responder ao processo da Lava a Jato, foi preso antes do trânsito em julgado de sua ação, à época, o STF até discutiu a possibilidade da alteração da interpretação da lei, alterando da terceira instância para a segunda o início da prisão, mesmo ainda cabendo recursos que poderiam trazer liberdade aos condenados. Tudo isso aconteceu por um fato: Lula não é recebido pelas elites, elas não o enxergam como um dos seus pares. Nordestino, retirante, metalúrgico… pobre! Aquele que recebeu o seu primeiro diploma quando se tornou presidente da república. Nunca foi bem-visto e, na primeira oportunidade, criminalizaram-no por algo que nunca provaram que o alegado, de fato, tinha ocorrido. Lula foi levado ao cárcere sem um processo legal transitado em julgado por ter sido sentenciado como pobre, nordestino e analfabeto, refletindo, portanto, o que é o Direito e para quem é o Direito.
Bolsonaro é caso diverso, goste ou não, ele tem curso superior em Educação Física e foi abraçado, até certo ponto, pela elite brasileira que achou puerilmente de controlá-lo. Ledo engano! Contudo, ele consegue transitar livre dos preconceitos brasileiros por ser rico e branco. Desta feita, o Direito é para ele e, quando enojados nos deparamos com a sordidez de suas ações, esbarramos no devido processo legal, na presunção de inocência, na paridade de armas e em todos os fundamentos do processo penal que é negado a milhões de cidadãos. Infelizmente, bandido tem cor, tem classe social e, pasmem, tem nome! Além do mais tem que morrer…
Assim sendo, Bolsonaro será preso, mas não por ter disseminado o não uso de máscaras na pandemia e ajudado inflar o número de vítimas pelo vírus letal, não será preso pelos casos sistemáticos de corrupção em seu governo (ainda que investigado por isso, pode-se até ser a desculpa pelo cárcere vindouro).
Sim, será preso pelos inimigos que fez na elite; pela afronta que seu governo representou aos seus pares; pela sede de poder cega e absoluta que, inclusive, visava à morte ou à prisão de seus antagonistas. O dissabor de sua truculência tem um caminho final que ele traçou, imperdoável, sem anistia, mas com as reverências do respeito ao Direito e à democracia, não será preso como um qualquer, será respeitado o devido processo legal, o trânsito em julgado e as benesses do Direito burguês para a burguesia serão dadas a ele.