Paz é a expressão que se escutará nos próximos dias, em todo o ocidente, por conta de um desejo, de um sentimento coletivo; um ciclo se finda, e com ele nasce um novo ciclo. A esperança de que, nesse novo ciclo, a vida se encontre plena de felicidade faz parte do ideal do ego- o princípio do prazer.
Entretanto, o desejo de paz não é idêntico ao sentimento de paz. Há, aqui, um abismo entre aquilo que se deseja; aquilo que se sente e aquilo que se ordena no cotidiano. E isso acontece, exatamente, por um princípio natural: a agressividade é inerente ao ser humano. Há quem discuta sobre o papel da mesma na constituição biológica- psíquica do ser como fato material, ou como instinto formal do pertencer ao estar vivo. Ainda, é consenso que o ambiente e suas formas trazem os meios de integrar, positiva ou negativamente, a agressividade, sendo responsável pela adaptação ou não do indivíduo e sua potencialidade.
Desta feita, pode-se entender uma evolução no conceito da paz, que até o século XIX era um entendimento restrito, negativo, e falava de um equilíbrio entre as relações de poder e potências bélicas: pax absentia belli. Literalmente, a paz é a ausência da guerra. O estado de paz era a ausência do conflito armado, ou da disputa bélica pelo poder. Assim tal definição não era suficiente à compreensão, ou não correspondia, epistemologicamente, ao todo finalístico, uma vez que o conteúdo é mera ausência de, e seu sentido restringido ao alcance: apenas guerra. Não se tinha no que consiste a paz.
Na segunda metade do século XIX, e princípio século XX houve uma progressão do conceito de paz, o seu núcleo adquiriu forma abrangente, e a paz um conceito de construção intimamente ligada à justiça: pax opus iustitiae. Contudo, seria primário considerar o esgotamento do problema pala abrangência do sentido com alteração do núcleo. Da guerra à violência, o entendimento da paz como obra da justiça trata de forma positiva, ampla, contudo, estruturalmente e indireta à violência. Assim, tem-se que a paz positiva existe quando há justiça social, harmonia, satisfação das necessidades básicas, autonomia, diálogo, integração e igualdade de direitos e deveres.
Há, entretanto, dois problemas com o conceito positivo da paz. O primeiro de forma geral se dá quando a questão da dominação geradora de violência vem camuflada com mecanismos de disfarce: faz-se guerra para ter a paz, ou grupos religiosos, étnicos e minorias históricas se insurgem de modo agressivo. Tais indicadores revelam um problema quanto o modelo de paz positiva estrutural. E, assim, apontam para o segundo problema: a agressividade inata, que no modelo da paz como obra da justiça não contempla em seu conceito tal possibilidade. Assim, paz seria a capacidade de uma sociedade se tornar visível e resolver favoravelmente os tipos de violência nela existentes (Jorge Brovetto). Contudo a relação intrínseca, o princípio causal ainda está sendo, nessa concepção, ignorado e a paz continua sendo um conceito abstrato de ausência de... Na mudança da guerra para violência, mas violência meramente formal. Ou seja, a questão do conflito não foi superada e a abrangência na mudança do núcleo não refletida em sua totalidade.
A agressividade inata foi domesticada pelo processo civilizatório, mas não deixou de existir, foi sublimada e, ainda, permitida em determinadas situações com o conceito do INIMIGO EXTERNO. Tal conceito explica à necessidade das guerras e, até mesmo, nos orienta à compreensão do sentido de se perdurar durante séculos o conceito da paz como ausência do conflito bélico.
Tal conceito também nos revela o caráter frágil de se modelar a compreensão da paz como o incentivo da solução dos fatores sociais carentes da justiça, uma vez que, a violência e agressividade estão presentes no sujeito como fatores de pulsões. E a agressividade é conditio sine qua non à cultura, e estabelecida, sendo através dela que o controle, a lei, a proibição se dá como renúncia de um estado primitivo para a vida em sociedade, mas não de forma efetiva ou total.
Essa renúncia, agora, encontra um fator teológico. Uma vez Cristo disse: “... Aquele que quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me (Lc 9, 23).” Esse é sentindo da paz, uma renúncia de um estado dominador, controlado pela satisfação ou disputa de um desejo em que faz a todos ou a tudo que se encontra se submeter. Cristo diz, afirma, enfatiza, que tal estado primitivo deve ser negado, mortificado (tome sua cruz) numa construção da paz que é diferente da conquista do mundo, dos desejos e dos ideais... Assim ele conclui no mesmo texto: “... Do que adianta o homem conquistar o mundo inteiro, perdendo-se, destruindo-se a si mesmo? (Lc 9, 25)”.
Destarte, a paz é um passo positivo ao outro, construída no indivíduo, que abre mão de seu individualismo, egoísmo e caminha em direção ao próximo, sendo capaz de renunciar a si mesmo, perdoar os excessos e as mazelas alheias em amor a si mesmo, a Deus, amando por um ato de renúncia da vontade de agredir seu semelhante em prol da harmonia.
Pode parecer utópico, então toda a paz seria utópica. A guerra nasce de uma palavra mal dita; de uma ofensa ao irmão, à mãe, ao pai; de um gesto antipático para com o amigo, para com o vizinho, com o colega de trabalho; de uma intolerância para com o diferente, para com alguém que possuía entendimento diverso. Nasce do desejo de querer estar sempre certo, sempre no controle ou sempre satisfeito, levando a melhor em toda ou qualquer situação. Nasce do sentimento da vingança, ou do não levar o desaforo, o de ir à forra.
A paz surge quando se dá a outra face, quando se caminha duas léguas, quando se é obrigado a caminhar uma, quando se dá a outra túnica, quando uma se é tomada. Nasce a paz quando se nega a si mesmo, os próprios desejos e se diz: POR HOJE EU VOU AMAR!
FELIZ 2010 A TODOS VOCÊS, UM ANO CHEIO DE PAZ E BEM!
Your blog keeps getting better and better! Your older articles are not as good as newer ones you have a lot more creativity and originality now keep it up!
ResponderExcluirThanks anonymous for the appreciation and encouragement. We are also grateful for his participation here in this space. Thank you very much!
ResponderExcluir