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sexta-feira, 1 de agosto de 2014
Edir Macedo e o desrespeito aos judeus
por João Marinho
Gente, sou somente eu que considero um tremendo desrespeito aos judeus religiosos a inauguração do templo de Salomão pela Igreja Universal?
Sim, o cristianismo é tributário do judaísmo e compartilha com ele uma parte da Bíblia... Uma religião influenciar outra e reinterpretar símbolos de outras em seu desenvolvimento é também algo corriqueiro na história.
Daí a se apropriar de todo um arcabouço simbólico e sagrado de outra religião para despi-lo integralmente de seu sentido ainda existente e substituir esse sentido cirurgicamente por signos de sua própria, macaqueando a outra religião e falsificando os signos dela, eu considero demais.
O Templo é o lugar mais sagrado para os judeus hoje. Salomão era judeu. Seguia o judaísmo. A arca da aliança, pelas histórias bíblicas, teria sido dada por Iavé ao povo judeu, e nela foram guardados os 10 mandamentos, ícones da Lei – que, na interpretação dos cristãos, já passou, uma vez que vivemos na "era da Graça".
Aí, você pega tudo isso, replica um templo judeu que, na verdade, é uma igreja... Traz uma arca judaica, que, na verdade, é agora um símbolo cristão. Veste o Edir Macedo com cara de rabino, quando ele é bispo e pastor... E enche a decoração com símbolos típicos do judaísmo, como o candelabro, destituindo-os de todo o sentido que possuem no próprio judaísmo. Isso parece correto?
A iconoclastia é interessante enquanto estratégia de crítica às religiões, críticas que todas merecem. No entanto, quando uma religião faz isso com outra – e aí, não estamos, portanto, falando mais de iconoclastia –, considero um assunto particularmente sensível.
Fosse eu judeu religioso, de nascimento ou converso (e uso "religioso" porque existem judeus étnicos que não seguem o judaísmo), estaria imbuído de profunda ojeriza e consideraria isso aviltante – e, se eu fosse a presidenta, o ilustre governador, um deputado, um político, teria levado isso em conta antes de decidir ir à inauguração.
Qual o próximo passo? Construir uma Caaba cristã?
terça-feira, 4 de fevereiro de 2014
Gays de direita
Gays de direita
por João Marinho
Está aí um assunto polêmico que merece importantes considerações. Muitos LGBTs acreditam, erroneamente, que seja "impossível" ou "paradoxal" existirem LGBTs direitistas.
Não é.
Tal como acontece na esquerda, existem diferentes extratos da direita no espectro político. Alguns são realmente fundamentalistas, misturam religião com Estado laico e falso moralismo, em um conservadorismo chocante e hipócrita. Aí, sim, há um paradoxo – só que nem todos são assim. Até porque, também existem esses tipos de personagens, mudando uma coisa ou outra, que, no entanto, denominam-se "esquerdistas com orgulho".
Na verdade, é preciso entender que existem LGBTs em todos os segmentos e cores políticas. Embora eu seja utopicamente anarquista e, na prática política, esquerdista social-democrata – não compactuo com a esquerda mais comunista e aguerrida: nunca acreditei no "Estado operário" nem na "ditadura do proletariado" –, não me incomoda haver gays que são direitistas, no sentido político da palavra "direita", ou seja, que defendam o livre mercado, o Estado mínimo, a regulamentação individual e a lei de oferta e procura.
Não acho que ser LGBT signifique necessariamente, ou tenha de significar, ser esquerdista. Até porque, sejamos sinceros, num passado não muito distante, a esquerda foi tão ou mais homofóbica quanto segmentos de direita, a ponto de chamar a homossexualidade de "vício burguês". Não podemos deixar de observar, também, que os ex-países socialistas estão hoje entre os mais legalmente homofóbicos do mundo. Foram os países capitalistas que começaram uma mudança, notadamente os nórdicos social-democratas.
Mesmo hoje, há esquerdistas que veem na luta contra a LGBTfobia uma "luta menor", sendo a maior a luta de classes. João Silvério Trevisan já escreveu exaustivamente sobre isso em seus artigos, contando como a esquerda cooptou o movimento LGBT. Portanto, ser dono do capital ou ser trabalhador não deve ser parâmetro para respeitar ou não uma pessoa.
Há donos de capital que são mais simpatizantes que trabalhadores assalariados homofóbicos. É natural que nos unamos na luta contra a homofobia e outras "fobias", mas, na hora de discutir sobre o papel do Estado e da economia, discordemos, se eu tomar como parte as minhas ideologias políticas.
O ponto principal é que o direitista (e/ou o esquerdista) não seja um retrógrado moral e homofóbico, por ser esta uma condição que nos retira a cidadania – e há os que não são – e que seja terminantemente democrático, porque não é possível hoje defender nenhum tipo de ditadura. Nem as de esquerda. Resolvido esse ponto, a direita, no espectro político, é um interlocutor tão ou mais respeitável que a esquerda.
Ademais, é bastante positivo que existam, inclusive, LGBTs direitistas. É natural da democracia a alternância de poderes. Havendo LGBTs com tendência à direita e seus simpatizantes, não corremos ou corremos menos o risco de ter nossos direitos cassados pelas alas fundamentalistas, quando a esquerda sair do poder... E ela irá sair, como é próprio da democracia.
quarta-feira, 28 de agosto de 2013
Cuba e a medicina da discórdia
Cubanos
por João Marinho
A notícia da semana é a chegada dos médicos estrangeiros ao Brasil, atendendo ao programa Mais Médicos, do governo federal, e a um convênio com Cuba – e as vaias com que foram recepcionados em Fortaleza/CE. Como não podia deixar de ser, resolvi também dar meu pitaco.
De cara, eu digo que o maior problema nessa discussão toda é que todos têm razão em um ponto – e o problema é que, por causa disso, advogam em causa própria, com fortes cores ideológicas, sem admitir os erros de sua posição ou as deficiências do quadro completo.
Para isso, é preciso considerar alguns “falsos argumentos” que tenho visto por aí.
1. O problema do SUS não será resolvido com mais médicos, se faltam condições de trabalho mínimas.
Este é o argumento preferido da oposição ao programa e ao convênio, e há razão. Não é preciso ir longe para perceber a carência de que sofre o Sistema Único de Saúde: nas periferias das grandes cidades, como São Paulo, faltam equipamentos, faltam remédios, falta gaze, falta tudo. Pessoas, inclusive, morrem em filas de hospitais.
No entanto, essa não é toda a verdade. Existem, sim, casos em que há condições de trabalho, postos novinhos, equipamentos de última geração: o que não há são médicos.
Resumo da ópera: o SUS tem muito de ser melhorado e a carência de profissionais de medicina é crônica no Brasil, além da distribuição desigual desses profissionais. Dito isso, é verdade que a contratação de mais médicos, por si só, não resolve o problema da saúde – mas também é verdade que a contratação de mais médicos para regiões onde há carência de profissionais é, sim, parte da solução!
2. Se o problema da infraestrutura do SUS for resolvido, médicos irão aos rincões do País.
O problema desse argumento é que ele é pura especulação. De verdade, não critico os médicos que optam por viver em grandes cidades e/ou localidades mais estruturadas. Eu mesmo não viveria numa tribo da Amazônia – e, provavelmente, não faria jornalismo gonzo ali.
As pessoas são livres para decidirem o que é melhor para si. Em relação aos médicos, não são apenas os salários que contam. Quando se pensa em ir para uma cidade, levamos em conta as condições de vida, as escolas, o transporte. Médicos não são diferentes, e há aqueles que, por motivos personalíssimos, preferem não se arriscar e trilhar carreiras onde os ganhos são maiores, o que também não é moralmente errado.
Há, porém, aqueles que têm a paixão e a motivação pelo desafio. O problema é que, historicamente, eles têm sido menos que o necessário. Assim, não é possível dizer, com certeza cartesiana, de que, com infraestrutura adequada, ainda assim, uma cidadezinha do Amapá atrairia milhares de profissionais.
Então, temos de nos guiar pelo que temos em mãos: essas cidades não têm atraído profissionais suficientes... Assim, se há profissionais que se dispõem a ir a esses lugares, devem ser estimulados a tal, independentemente de onde venham.
Afinal, há uma questão de urgência: todos sabemos que o SUS precisa melhorar, mas não podemos pedir às pessoas doentes: “olha, esperem o SUS melhorar que, depois, haverá médicos aqui”. No “depois”, a pessoa já estará morta. Ela precisa de um profissional para agora, mesmo que as condições não sejam ideais...
3. Os médicos cubanos são “escravos”.
Não há dúvida de que o convênio entre Brasil e Cuba precisa ser mais elucidado, sob pena de desrespeitarmos nossa CLT.
Afinal, como Cuba é comunista, a bolsa de R$ 10 mil não será paga diretamente aos cubanos. O dinheiro vai para a Organização Panamericana de Saúde, que o encaminhará ao governo cubano, que reterá uma parte e dará a outra ao profissional.
O problema: não se sabe qual quantia será efetivamente recebida pelo profissional. As autoridades brasileiras falam entre R$ 2,5 mil e R$ 4 mil. A oposição e os veículos nacionais – “Folha” e “Época” na dianteira , como em artigo de Ruth de Aquino – rebatem, dizendo que, na Venezuela, segundo “fontes independentes”, um médico cubano recebe módicos R$ 550.
Fui atrás e pesquisei sobre isso.
O problema: as tais fontes “independentes” respondem pelo nome de Ramón Guillermo Aveledo, oposicionista direitista do regime de Chávez/Maduro.
Embora isso não o torne automaticamente um mentiroso, seria interessante que fosse informado ao leitor, pois dá margem a analisar a informação ideologicamente, ou, ao menos, pesquisá-la antes de lhe dar a chancela de verdade inquestionável.
Segundo Aveledo, um médico cubano na Venezuela recebe 1.200 bolívares, o que, convertido em real, daria R$ 550 segundo um câmbio mais antigo.
O problema: segundo averiguei, a informação de Aveledo é baseada em dólar – e encontrei um blog sobre medicina cubana que dá valores mais exatos.
O blog é mantido por um médico cubano, Dr. Eloy A. González, e está no ar desde 2005. Traz notícias sobre a situação de médicos cubanos no exterior e, por sinal, é crítico quanto à retenção de valores pelo governo de Havana.
Segundo González, fontes também independentes dão conta de que, na Venezuela, o médico recebe cerca de 230 dólares, outros 125 a 225 dólares são depositados em uma conta em Cuba para serem resgatados ao fim do programa e mais 50 dólares vão para a família do médico na ilha, tudo mensalmente.
Questionei o Dr. González sobre as fontes independentes, e estou aguardando. Enquanto isso não acontece, porém, somando tudo, o valor geral que um médico cubano ganha na Venezuela, segundo ele, chegaria a mais de 2,5 mil bolívares – pouco mais do que o salário mínimo venezuelano.
Resumo da ópera: médicos cubanos ganham pouco frente a estrangeiros naturais de seus próprios países, sobretudo na Venezuela; existe polêmica sobre o valor que Cuba retém para o governo, mas o convênio, por si só, não significa escravidão, estando dentro dos parâmetros mínimos venezuelanos (e brasileiros).
Os módicos “R$ 550” são por causa do câmbio, pois o real vale mais que o bolívar – e causam uma distorção da realidade por sua causa... Que vergonha, Aquino!
Segundo: o Brasil não é a Venezuela. O próprio González admite que, na África do Sul, onde trabalhou, os médicos cubanos recebiam mais.
É preciso que essa questão de salário seja melhor esclarecida pelo governo federal, sem dúvida – mas, se o governo estiver com a razão, ainda que os cubanos recebam menos que os brasileiros, não caracteriza escravidão...
Além de que os valores em dólares, quando na realidade cubana, significam um inquestionável alívio para o profissional e sua família em um contexto de carestia, como o da ilha.
4. Houve racismo em Fortaleza.
Essa é uma das preferidas do pessoal pró-Dilma acrítico. Vejam o vídeo aqui. Há muitos médicos brancos igualmente hostilizados.
Os médicos de Fortaleza foram imbecis, pois cubanos e outros (eram 96 estrangeiros, dos quais 79 cubanos) vieram atendendo a um programa governamental.
Se esse programa é questionado pelos médicos do Brasil, os estrangeiros não têm culpa. Que os brasileiros resolvam essa questão entre si.
Houve, sim, xenofobia dos médicos brasileiros no Ceará. Mas não necessariamente racismo.
Dito tudo isso, o que fica: o governo brasileiro precisa deixar mais claras as condições do programa Mais Médicos e do convênio com Cuba, sim, e é preciso fiscalização para que algo que é parte de uma solução não se torne a solução... Mas a vinda de médicos de fora, em si, é parte dela e não merecem eles ser hostilizados por assuntos internos nossos.
Resta saber se os pró-Dilma acríticos e os conservadores vão querer encarar as coisas com equilíbrio e realismo.
sexta-feira, 26 de julho de 2013
Porque investem as prefeituras em eventos gays?
Pink money com autoestima
Sim,
gays têm dinheiro, mas pode não ser tanto assim –
e,
principalmente, não deve ser para todo mundo!
por
João Marinho
Dois milhões e duzentos mil
reais. Informados por seu diretor executivo, Nelson Matias, em uma reportagem
publicada no portal iG e assinada por
Pedro Carvalho, os custos da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, cuja 17ª
edição foi realizada em 2 de junho de 2013, impressionam – e se tornaram fonte
de crítica por parte de setores conservadores e religiosos tradicionalmente
avessos a eventos com foco no público de lésbicas, gays, bissexuais, travestis
e transexuais.
Isso porque, do total de R$ 2,2
milhões, a Prefeitura de São Paulo bancou, ainda segundo a reportagem, R$ 1,6
milhão. Foi o que bastou para que religiosos e conservadores reclamassem, em
sites da imprensa, evangélicos e afins, da “conta absurda” a ser paga por
dinheiro público, que deveria ser usado para o bem de todos – e não de uma
“minoria”.
Lucro alto
A Parada de São Paulo, como
outras pelo Brasil e pelo mundo, surgiu espontânea, fruto da mobilização de
ativistas LGBTs. Apenas posteriormente, passou a fazer parte de calendários
oficiais do poder público. A verdade nua e crua, porém, é que não existe almoço
grátis – e isso se aplica ao apoio dos governos.
Dito isso, é necessário
considerar que os custos da Parada de
São Paulo, tradicionalmente a maior do País, representam apenas a ponta do iceberg – e o que está debaixo dela se
reverte, sim, em benefícios extremos para a população e para o poder público.
Sem levar em conta que os gastos
da Prefeitura são com infraestrutura,
o que já os justificaria, a mesma reportagem do iG informa que, segundo dados da São Paulo Turismo (SPTuris), 39,5%
do público da Parada é de turistas, que gastam, em média, R$ 1.272 no fim de
semana do evento.
Bem, 39,5% de 600 mil pessoas
(estimativa do público segundo a Polícia Militar no ano de 2013) ou 39,5% de
220 mil pessoas (estimativa do Datafolha) resultam, respectivamente, em 237 mil
pessoas e 86,9 mil pessoas. Cada uma gastando, em média, R$ 1.272, isso
significa que os turistas deixaram aproximadamente, na cidade de São Paulo,
quase R$ 301,5 milhões, ou, se apelarmos para os números de público do
Datafolha, mais de R$ 110,5 milhões.
Com esse retorno – dinheiro que
os turistas gastam em hotéis, alimentação, transporte, lojas, etc. –, quem, em
sã consciência, não gastaria R$ 1,6 milhão no evento? Em termos comparativos,
isso significa que, para cada R$ 1 gasto pela Prefeitura de São Paulo no
evento, são retornados cerca de outros R$ 187 que ficam na cidade, ou mais de
R$ 68, seguindo as estatísticas do Datafolha.
Se a Parada fosse uma poupança e
o dinheiro público fosse ali aplicado, ela renderia, em um fim de semana,
18.741,50% de juros, considerando o público estimado pela PM, ou 6.808,55%,
considerando o público estimado pelo Datafolha. Isso falando apenas dos
turistas, sem levar em conta o dinheiro que os próprios habitantes da cidade e
municípios próximos gastam, em transporte, comida, compras.
Posso estar errado, mas acredito
que nenhum banco, no Brasil ou em outros países, forneça taxas de juros tão
formidáveis em sua carteira de investimentos. Portanto, em vez de reclamar
porque o poder público gastou R$ 1,6 milhão, por que não agradecer pelo
verdadeiro investimento que ele fez?
Parte dos outros R$ 600 mil não
bancados pela Prefeitura veio de empresas públicas, como Caixa e Petrobras. Não
foi possível definir, para este artigo, quanto do dinheiro deixado em São Paulo
é recolhido em impostos federais, mas a julgar por números tão expressivos e
impostos tão universais quanto os brasileiros, não soa imprudente dizer que o
governo federal recebe, também, um gordo quinhão.
Marginalidade e baixa autoestima
Os números impressionantes se repetem
em outra cidade com uma tradição de eventos LGBTs: Juiz de Fora, em Minas
Gerais, que realiza sua 36ª edição do Miss Brasil Gay em agosto/2013 e seu
igualmente tradicional Rainbow Fest, no mesmo mês. As últimas estatísticas
sobre o Rainbow, datadas de 2006, mostram que, naquele ano, 10 mil turistas
injetaram nada mais, nada menos que R$ 4 milhões na cidade. Estratosféricas,
novamente.
Os dados de São Paulo e Juiz de
Fora parecem fazer jus à fama do pink
money. A expressão é oriunda do final da década de 1970, nos Estados
Unidos. Na época, grupos de direitos de homossexuais não dispunham de
patrocinadores para suas ações e tiveram uma ideia brilhante: em um dia de
protesto nacional, toda nota de dólar que passasse na mão de um gay deveria ser
riscada com uma caneta rosa, no canto. Isso mostraria o potencial que os
patrocinadores estavam perdendo.
De lá para cá, cresceu o
interesse no “dinheiro cor-de-rosa”, que movimentaria mercados bilionários
envolvendo a população LGBT: respectivamente, cerca de US$ 100 bilhões anuais
no Brasil e US$ 800 bilhões nos Estados Unidos, segundo reportagem publicada há
dois anos na revista IstoÉ Dinheiro.
O texto ainda se refere a uma estatística do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), segundo a qual essa população gasta, em média, 30% mais
que seus pares heterossexuais em consumo e lazer.
No entanto, toda essa “orgia
financeira” tem três lados que são bem negativos.
O primeiro e mais premente é que,
no Brasil, não se vê as empresas – sobretudo as grandes marcas – envolvidas
fortemente na conquista desse público. Com uma visão embotada de negócios e com
receios extremados de “desagradar” a população conservadora, LGBTs permanecem,
para essas marcas, relegados a uma posição marginal e oculta.
Se, nos Estados Unidos, companhias
como Apple e Google se envolvem em campanhas pró-diversidade sexual, no Brasil,
são comuns comerciais polêmicos, como o da marca de cuecas Lupo – que, se não
pode ser considerado homofóbico per se,
ao menos é de gosto duvidoso e flertou com uma ideologia, no mínimo, questionável.
Na Parada de São Paulo, para manter o exemplo, a única empresa privada a
adquirir uma cota de patrocínio foi a marca de camisinhas Olla.
Os empresários com negócios
voltados diretamente aos LGBTs não fazem mais bonito. Tirando honrosas exceções,
investem pouco pelo dinheiro que recebem e falham no treinamento de
funcionários, sobretudo seguranças. Casos de espancamentos homofóbicos em
boates GLS – absurdo! – têm tomado os jornais ultimamente. Finalmente, o poder
público tampouco faz jus ao que recebe. Como se explica o desbotado combate à
homofobia em cidades que recebem tantos milhões de reais do bolso do público
LGBT?
O segundo lado diz respeito ao
fato de que a tese do pink money
esconde uma questão social importante: não; o público LGBT não é
necessariamente endinheirado, branco, de classe média e disposto a gastar
centenas ou milhares de reais por noite. Em termos estatísticos, se, no Brasil,
a maioria da população é de classe média-baixa (a atual classe C) a classes
menos abastadas, isso se reflete entre os LGBTs. Especialmente no caso do/as
transexuais e travestis, tão maltratados/as que, não raro, são vítimas da
evasão escolar, com oportunidades profissionais mais restritas.
Essas pessoas têm de ser tratadas
com respeito – não por causa do dinheiro que podem gastar, mas por seu lugar
como cidadãos e cidadãs. O pink money
pode nublar a existência de demandas sociais, reais, objetivas e prementes para
a população LGBT. Ora, se está endinheirada, o que falta a essa população? Na
verdade, falta tudo, a começar pelo combate à homofobia/transfobia, passando
por políticas públicas de prevenção à violência e promoção da saúde e de
promoção da autoestima. Gay morto não gasta. Gay agredido não consome: deixa o
salário no hospital – e tanto pior quando se está frente à realidade de que não
há tanto dinheiro assim no bolso.
Finalmente, um terceiro lado ecoa
uma questão que acabamos de mencionar: a autoestima ela-mesma. Cercados por uma
cultura homofóbica e sofrendo de preconceito internalizado, LGBTs estão ainda
longe de serem “craques” nessa faceta tão importante para o ser humano. É comum
que “encontrem” desculpas para a homofobia de terceiros, especialmente quando
compram e consomem.
Se, nos Estados Unidos, boicotes
promovidos pela GLAAD (antes, Gay & Lesbian Alliance Against
Defamation) são efetivos e temidos pelas marcas, no Brasil, consumidores LGBTs
se esmeram em “justificar” comportamentos discriminatórios de empresas e
comerciais, mesmo quando patentes. Pior: às vezes, sequer se preocupam em
investir em lugares que os respeitam.
Quem nunca teve um
amigo ou amiga que se recusa a ir a um lugar porque “é gay demais” ou “tem
muito ‘viado’”? Ou que, ao presenciar um flagrante desrespeito em um ambiente
comercial, como em um restaurante que tenta impedir uma simples troca de beijos
homoafetiva (“selinho”), concorda com o estabelecimento, em vez de se colocar
ao lado do consumidor injustiçado que, no limite, é gay como ele?
É preciso, portanto, ter em mente que o pink money tem, sim, sua relevância, mas que ele, por si só, é
insuficiente para conquistar cidadania. Esta se conquista por meio de luta
política, de mobilização social – e, sobretudo, por meio de um intenso e
interno trabalho de autoestima. Inclusive na hora de se recusar a deixar parte
do salário, normalmente ganho a duras penas e em ambientes nem sempre liberais
e libertários, nas mãos de quem não merece.
Pense nisso.
Texto originalmente publicado no Rainbow
Guia do 16º Juiz de Fora Rainbow Fest.
Referências:
http://www.unip.br/ensino/pos_graduacao/strictosensu/comunicacao/download/com_irineuramosribeiro.swf
sábado, 22 de junho de 2013
Exija o PSDB contra a cura gay!
EXIJA O PSDB CONTRA A CURA GAY!
por João Marinho
Não, você não leu errado: os fatos sobre a "cura gay" vão além da briga entre PT e PSDB, não importa de que lado você esteja no espectro político.
Primeiro, vamos aos fatos que têm responsabilidade do PT na subida de Marco Feliciano, do fundamentalista PSC, à Comissão de Direitos Humanos.
O PT é parcialmente responsável por isso? É, sim. Desistiu da comissão histórica em favor de "outras mais importantes", e o jogo realizado com a base aliada permitiu ao PSC pleitear a comissão. E ganhar o direito de indicar seu presidente.
Só que tem outro detalhe. PMDB (do Temer e Calheiros), PSDB (do Aécio) e PP (do Maluf) também têm responsabilidade, porque cederam, juntos, cinco vagas para o PSC na comissão depois que o PSC assumiu com a estratégia do PT.
PSB (sim, o partido da Erundina!), o PTB, o PSD, o PR e o PV (do Gabeira) também têm a sua, porque indicaram parlamentares evangélicos para a comissão. Confira: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,sessao-que-elegeria-pastor-nos-direitos-humanos-e-suspensa-na-camara,1005182,0.htm.
A união desses parlamentares e das cinco vagas permitiu que Feliciano fosse eleito presidente da comissão, após indicação do PSC.
Resumindo: nas próximas eleições, avalie você gay, você lésbica, você travesti, bissexual ou trans, analise com bastante critério os candidatos do PT, PMDB, PSDB, PP, PSB, PTB, PSD e PV porque todos esses partidos nos traíram! Os fundamentalistas PR e PSC, não é nem pra cogitar votar!
Mas e a "cura gay"? Aí, existe responsabilidade do PSDB também. O autor do projeto de "cura gay" é mesmo do PSDB: o deputado-pastor João Campos.
Sim, o PSC do Feliciano é da base aliada e um câncer, cujas responsabilidades acabamos de apurar acima. E o PSC tem sua cota particular de responsabilidade: Feliciano pôs um pastor pra relatar o projeto! E o pôs em votação, agindo também para garantir a aprovação. E a comissão está dominada por evangélicos fundamentalistas agora.
No entanto, a verdade é que, sem projeto, não haveria relator e nem votação em comissão. E o projeto só existe por causa do João Campos do PSDB. Agindo e pressionando, realmente o PSDB poderia fazer o Campos retirar o projeto de pauta.
Então, a pressão é válida, sim, sobre o PSDB - ainda mais tendo um pré-candidato à presidência da República que se declarou a favor da união homoafetiva.
Pressionem o PSDB e não mirem apenas no Feliciano. João Campos é um outro câncer, autor não só da "cura gay", mas também do projeto que permite às igrejas interferirem no Supremo - e está passando "pianinho" nisso.
http://www.psdb.org.br/psdb/fale-conosco/
quinta-feira, 13 de junho de 2013
Abram passagem!

DE BOA, EU APOIO OS PROTESTOS EM SP E NO BRASIL CONTRA O AUMENTO DAS PASSAGENS DE ÔNIBUS.
por João Marinho
... E digo mais: eu fico besta com a miopia de parte da população paulistana.
Não, eu não sou a favor de depredar o patrimônio público, como estações de metrô em São Paulo – mas sei também que não foram as 5 mil ou 10 mil pessoas que estavam lá e fizeram isso, mas uma minoria, que utiliza o protesto como catapulta.
No entanto, a demanda é mais do que justa. Pode parecer pouco: o aumento da passagem foi de R$ 0,20 em São Paulo (de R$ 3 para R$ 3,20) e foi dentro da inflação.
Ocorre que existem outros dados que maquiam a realidade. Um deles é o fato de que desde que a passagem de ônibus de São Paulo, a segunda mais cara do Brasil, passou de R$ 0,50 para R$ 3,20 nos últimos anos, já superou em muito a inflação do período.
Mais do que isso: o serviço de transporte público na capital e na região metropolitana é deficitário, sobretudo na periferia, e não condizente com o valor que é cobrado.
Some-se a isso o fato de que metrô e CPTM também aumentaram os preços – e que a população que mora na periferia e trabalha na região central usa até 3 conduções de ida e 3 conduções de volta para trabalhar, nem todas elas cobertas pelas empresas.
O Bilhete Único, válido na capital, alivia, mas não resolve (inclusive porque tem prazo de 2 horas para funcionar), e, no limite, as pessoas pagam caro para ficarem em pé, sem conforto, em veículos com falta de manutenção e demorando horas para ir e voltar para casa. Já se preocuparam em contar quantas vezes houve panes no metrô e na CPTM nos últimos tempos?! Além disso, o metrô e a CPTM fazem greves por causa do descaso do governo e prejudicam milhares, em estações lotadas e ônibus piores ainda. A questão gera problemas para as empresas, porque fatalmente as pessoas não podem trabalhar nesses casos.
Resultado: uma hora, tudo isso explode.
De resto, façam uma conta, matemática mesmo. Uma pessoa que é arrimo de uma família de 3 pessoas em que cada uma utiliza 2 conduções para ir e duas para voltar terá gasto cerca de R$ 28,50 por dia com essa despesa (já descontado o Bilhete Único). Multiplicados por 24 dias úteis e 12 meses, dá R$ 8.208 reais por ano.
Com o aumento da tarifa, a mesma pessoa ganharia uma despesa de R$ 30,36 por dia. Ao ano, R$ 8.743,68. É uma diferença de mais de R$ 500. Algo bem superior aos R$ 0,20 que tanto alardeiam. É quase um salário mínimo a mais por ano, considerando que essas pessoas que pagam esse valor não ganham tanto assim também.
Também considero que é preciso lembrar que a PM paulista não é lá muito inocente. O Movimento Passe Livre comenta que os casos de vandalismo começaram após a polícia responder com força excessiva. Bom, ninguém apanha de graça.
E a Polícia não andou agredindo ATÉ JORNALISTAS?! Isso diz muito.
Entendo também que existe muita revolta nessa população que protesta, jovem. Não apenas por causa do serviço deficitário de transporte, mas porque vemos a polícia usando até de helicópteros nessas manifestações, mas totalmente apática tanto no centro quanto na periferia, dos quais os arrastões, os dentistas queimados e as chacinas nos bairros afastados são apenas a ponta do iceberg. Onde fica toda essa força policial, quando os jovens morrem à luz do dia?
Tudo isso também explode.
Então, ainda que eu não concorde com os excessos, parte deles eu entendo – e, ainda que entenda e não apoie esses excessos, a verdade é que as manifestações são legítimas, sim – e é preciso que se proteste e saia da apatia.
E um aviso aos navegantes, que, sempre que ocorrem mobilizações populares, dizem que "há coisas mais importantes para protestar". Considero uma idiotia sem tamanho, porque, para um caso como o que relatei na conta, um salário mínimo a mais por ano (o que, para muitos, equivale a quase 1 mês a mais de trabalho!) já é importante o suficiente para protestar.
Mais do que isso: e onde estão essas pessoas que sempre acham que "tem coisa mais importante" quando essas coisas mais importantes estão em voga? Nada fazem, nunca vão, e só sabem torcer o nariz diante do computador, no conforto de suas casas, enquanto alguns tentam, ainda que apenas pela passagem de ônibus, conter os desmandos que cotidianamente têm lugar no Brasil.
A Prefeitura e o Governo do Estado dizem que não têm dinheiro para pagar as diferenças inflacionárias. Não têm? São os governos que podem reduzir os impostos. São os governos que podem auferir se as empresas de ônibus estão lucrando mais do que determina a lei (em Porto Alegre, o Tribunal de Contas já desconfia que sim) – e, se apenas 1 deputado estadual ou 1 vereador deixar de receber suas benesses, desconfio que, em 1 ano, boa parte do gasto adicional com os subsídios para manter o preço já estaria sanada.
quinta-feira, 15 de março de 2012
Em nome de um Estado secular
A palestra “Globalização, Religiões e o Secular”, ocorrida no dia 07 de março na UERJ, abordou os caminhos que aproximam cada vez mais a religião e o Estado, em uma dinâmica de tensão que envolve também a participação de movimentos sociais cujas demandas são afetadas por esta aproximação. Em jogo, a capacidade de influenciar e definir decisões de governo através de barganhas. Organizada pela Linha de Pesquisas Religião e Movimentos Sociais (PPCIS/UERJ), pelo Núcleo Religião, Gênero, Ação Social e Política (ESS/UFRJ), pelo Centro Latino-Americano de Estudos do Pentecostalismo (Projeto PCIR/UERJ) e pelo Grupo de Estudos do Cristianismo (PPCIS/UERJ), a palestra contou com a participação do sociólogo especializado em religiões José Casanova (Georgetown University), da socióloga Maria das Dores Campos Machado (UFRJ), do sociólogo Paul Freston (Wilfrid Laurier University, Canadá), da teóloga e socióloga Brenda Carranza (PUC Campinas) e da socióloga Cecília Mariz (UERJ). O crescimento de novos movimentos religiosos nos últimos anos – como os neopentecostais (evangélicos) e os carismáticos (católicos) – foi um tema que gerou ampla discussão, sobretudo por causa da atuação política desses grupos. Paul Freston destacou que a campanha eleitoral de 2010 foi um momento de destaque desse fenômeno. “Notamos que a questão dos valores religiosos foi uma bandeira levantada e defendida com vigor. Ao menos no embate do processo eleitoral, a temática do aborto obrigou os candidatos a serem cautelosos ou recuarem de suas convicções. Na hora do voto, no entanto, conforme entrevista que fiz com algumas lideranças religiosas, tais temas não necessariamente foram decisivos para definir o candidato. O que chamo a atenção é para o poder de mobilização que alguns valores imprimiram na campanha”, observou Paul Freston. O Brasil tem observado uma crescente atuação de movimentos religiosos que convergem para as instituições públicas, dinâmica muito criticada pelos movimentos feminista e LGBT. Durante a campanha de 2010, a então candidata Dilma Rousseff mudou sua posição em relação à descriminalização do aborto, adotando uma postura contrária à que defendia até então. Eleita, já no primeiro ano do governo, a presidente foi obrigada a recuar em iniciativas de ampliação da cidadania LGBT e a modificar o foco das políticas de saúde da mulher. O kit anti-homofobia foi suspenso diante da pressão da bancada religiosa no Congresso Nacional. Nesse contexto de pressão conservadora, a concepção maternalista prevaleceu nas ações do Ministério da Saúde – que priorizou a ideia da mulher gestante e mãe em detrimento de outros momentos da trajetória reprodutiva. Para Maria das Dores Campos Machado, especialista no estudo dos evangélicos, a atuação política de grupos religiosos tem se intensificado. “A ação constante e vigorosa de grupos religiosos evidencia que eles reconhecem a política como uma instância central da vida nacional. Os neopentecostais acham que a política é um campo positivo, que a política partidária e eleitoral é relevante. É uma situação distinta da dos anos 1980, quando o discurso pentecostal era apolítico. Além disso, temos percebido que há um forte diálogo com o discurso dos direitos humanos. Eles se apropriam deste campo para argumentar e defender seus valores e ideias. No entanto, é uma apropriação seletiva, focada na questão da liberdade religiosa e na desigualdade social. Questões como aborto e direitos LGBT não são pronunciadas”, afirmou Maria das Dores Machado. De acordo com a socióloga, cada vez mais estes grupos religiosos participam das discussões e das definições da agenda política. “É importante observar que há um componente geracional no momento atual. Os pentecostais estão em sua 3ª geração, cujos integrantes têm escolaridade maior que a de seus pais e avós. São, por exemplo, médicos, juízes e jornalistas que circulam pelas mais variadas instituições, como a universidade, a mídia, o poder judiciário”, analisou Maria das Dores Campos Machado. O movimento pentecostal surgiu e se desenvolveu concomitantemente aos movimentos feminista e LGBT algumas décadas atrás. Nesse sentido, afirmou a socióloga Brenda Carranza, a atuação destes grupos religiosos esteve associada ao combate ao feminismo e às demandas LGBT. “Os meios de comunicação têm sido largamente utilizados com esse propósito. Dessa forma, questões como os direitos da mulher estão sob constante vigilância e ataque na televisão aberta,” afirmou, chamando a atenção para os inúmeros programas religiosos que algumas igrejas exibem em emissoras comerciais, algumas vezes de domínio de grupos religiosos. Maria das Dores Campos Machado classificou como relação de ódio a que se estabelece entre tais movimentos religiosos e as feministas. “É um contexto que não pode ser analisado internamente. Há uma forte atuação articulada a movimentos nos EUA, especialmente aqueles ligados ao combate ao aborto (“pró-vida”). A atuação tem servido para estimular as ações políticas dos grupos brasileiros, facilitando, inclusive, a parceria entre evangélicos e católicos em temas que dizem respeito a direitos sexuais e reprodutivos. No entanto, temos que admitir que grupos conservadores e tradicionais podem e têm o direito de se manifestar e atuar. Não podemos desqualificar o direito deles se manifestarem por mecanismos democráticos”, explicou Maria das Dores Campos. Para Brenda Carranza, no entanto, a atuação política dos movimentos religiosos não se difere do padrão da política brasileira. “Vemos o uso constante da política como favor e barganha para ocupação de cargos – como no recente caso de Marcelo Crivella, cuja indicação para o Ministério da Pesca contemplou uma negociação de aliança eleitoral. Portanto, a religião, nesse aspecto, também serve como moeda de troca”, observou Brenda Carranza. Paul Freston avaliou que a participação crescente destes movimentos é legítima, embora apresente aspectos reprováveis. “As discussões que envolvem valores são muito caras aos grupos católicos e evangélicos. Dentro dos marcos democráticos, são embates saudáveis. O preocupante é quando as discussões se dão no grito, com o intuito de silenciar os opositores, como é o caso do aborto”, arrematou Paul Freston, que concluiu afirmando que as discussões e as mudanças possíveis em temas de sexualidade, gênero e reprodução são lentas. “São mudanças que demandam anos de avanços graduais, o que é natural, pois não estamos tratando de temas simples. São temas que incidem sobre a sensibilidade moral e religiosa de uma população”, finalizou. |
O medo é nosso, e não dos evangélicos, Marco Feliciano
por William De Lucca - 09/03/2012
O
exagero dos deputados da Bancada Evangélica chega a ser engraçado, para não
dizer ridículo, ante as demandas dos homoafetivos. Nesta semana, o deputado
federal e pastor Marco Feliciano (PSC-SP) disse, em artigo publicado em seu site:
“Tal grupo (os homossexuais) representa uma minoria, não destas que sofrem de verdade, mas que sob uma camuflagem de perseguição, tenta e consegue impor seu modo de vida promíscuo, seus pensamentos anti-família e anti-bons-costumes (…) O que virá a seguir? Que Deus nos ajude! E nos ajude logo, antes que, esses fascistas, expulsem de uma vez Deus da nação brasileira, como buscam exterminar programações religiosas na TV”
Vou
ignorar as falhas na argumentação do deputado, que normalmente carecem de
ligação com a lógica e com os fatos. Vou ignorar que o Brasil é o líder do ranking mundial de mortes de homossexuais em crimes
violentos e de natureza homofobia, e que esta discriminação é apenas a ponta de
um iceberg de crimes de preconceito e de intolerância que não chegam à luz da
justiça. Vou ignorar também o conceito de família do deputado (que também foi
ignorado pelo STF ao aprovar a união homoafetiva) e de muitos
fundamentalistas que se esquecem de atualizar seus conceitos morais para a
atualidade, e que querem privar outros de fazê-lo. Vou ainda fazer vista grossa
a utilização indevida do termo ‘fascista’ referindo-se a homossexuais, visto que
os fascistas (com a conivência da grande maioria de instituições religiosas)
mataram milhares de homossexuais durante a segunda guerra mundial (e ainda hoje), e seu espólio filosófico ainda inspira matadores de gays pelo Brasil.
Vou
me ater apenas ao ponto central da argumentação de Feliciano: o medo de que os
‘homossexuais expulsem deus (e seus seguidores) do Brasil. A liberdade religiosa
é uma clausula pétrea da Constituição Federal, que no artigo 5º, VI, estipula
ser inviolável a liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre
exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos
locais de culto e as suas liturgias.
Mesmo
que um presidente homossexual (outro além da egodistônica Dilma Rousseff) assuma
o poder, as liberdades religiosas estão garantidas. Mesmo porque, em nenhum
momento, em nenhuma declaração pública, nenhum homossexual (que eu tenha
registro) falou contra as liberdades religiosas, não importando a crença ou
denominação. O problema é que muitas destas denominações não querem apenas viver
suas ideologias, mas as impor sobre toda a sociedade, de forma autoritária e (aí
sim) fascista. Não compete ao Estado ou a Constituição versar sobre o que é
pecado e sobre os conceitos infundados de família que A ou B tenham criado, mas
garantir os direitos humanos a todos, independente de crença, baseados na
liberdade individual e no que há de mais moderno no mundo em relação a estes
direitos.
Agora,
os direitos dos homossexuais (inclusive de existir ou de morar no Brasil) podem
ser ameaçados se um grupo fundamentalista assumir o poder. O medo tem de ser
nosso e não dos evangélicos. O que garante que um presidente evangélico não
possa ‘proibir relações entre pessoas do mesmo sexo’? O que garante que uma
maioria absoluta no congresso não torne homossexualidade uma doença e o
tratamento compulsório? Mesmo sem maioria, eles já querem fazer tal absurdo, através do projeto de lei do Deputado Federal João Campos
(PSDB-GO), usando truques de lingüística simplistas chamando a cura de
‘tratamento’, sem buscar no dicionário o significado de ‘tratamento’.
O
que nos garante que teremos direitos assegurados com uma maioria de
fundamentalistas no poder, se hoje já não temos direitos respeitados? Como
esperar que a discriminação contra LGBTs cesse, se não ensinarmos as gerações
futuras a beleza da diversidade entre as pessoas? Sem a aprovação de um projeto
que torne obrigatório o ensino de orientação sexual e identidade de gênero nas
escolas públicas e particulares, obviamente adequadas a realidade pedagógica de
cada jovem, nunca sairemos deste ciclo vicioso de homofobia e preconceito.
Como
seus pensamentos em looping, os fundamentalistas querem que a existência dos
homossexuais seja miserável, para poder então ‘curá-los’, aumentar seus
rebanhos, e consequentemente seus lucros. Os LGTB seriam sempre discriminados
por terem seus direitos (inclusive a vida) negados por pessoas que não aceitam a
diversidade. E estas pessoas não aceitam ou compreendem a diversidade porque não
forem EDUCADAS para tal, pois nem em casa ou escola ensinam isso.
A
falta de coerência nos argumentos do Deputado Marcos Feliciano é aterradora, e a
forma como ele tenta manipular as massas que o seguem também. O medo de perder
direitos civis, de perder a dignidade, de perder o emprego, de perder o abrigo
em casa, de perder os amigos, a família, de perder dentes, de ter ossos
quebrados, de perder a vida em um beco de uma cidade qualquer, é NOSSO,
deputado. Porque este medo real, e não hipotético, já faz parte do cotidiano de todos os gays, lésbicas,
bissexuais, travestis e transexuais brasileiros.
--
Junior Vieira
Bibliotecário
Bibliotecário
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