quinta-feira, 15 de março de 2012

O medo é nosso, e não dos evangélicos, Marco Feliciano


por William De Lucca - 09/03/2012



O exagero dos deputados da Bancada Evangélica chega a ser engraçado, para não dizer ridículo, ante as demandas dos homoafetivos. Nesta semana, o deputado federal e pastor Marco Feliciano (PSC-SP) disse, em artigo publicado em seu site:
“Tal grupo (os homossexuais) representa uma minoria, não destas que sofrem de verdade, mas que sob uma camuflagem de perseguição, tenta e consegue impor seu modo de vida promíscuo, seus pensamentos anti-família e anti-bons-costumes (…) O que virá a seguir? Que Deus nos ajude! E nos ajude logo, antes que, esses fascistas, expulsem de uma vez Deus da nação brasileira, como buscam exterminar programações religiosas na TV”
Vou ignorar as falhas na argumentação do deputado, que normalmente carecem de ligação com a lógica e com os fatos. Vou ignorar que o Brasil é o líder do ranking mundial de mortes de homossexuais em crimes violentos e de natureza homofobia, e que esta discriminação é apenas a ponta de um iceberg de crimes de preconceito e de intolerância que não chegam à luz da justiça. Vou ignorar também o conceito de família do deputado (que também foi ignorado pelo STF ao aprovar a união homoafetiva) e de muitos fundamentalistas que se esquecem de atualizar seus conceitos morais para a atualidade, e que querem privar outros de fazê-lo. Vou ainda fazer vista grossa a utilização indevida do termo ‘fascista’ referindo-se a homossexuais, visto que os fascistas (com a conivência da grande maioria de instituições religiosas) mataram milhares de homossexuais durante a segunda guerra mundial (e ainda hoje), e seu espólio filosófico ainda inspira matadores de gays pelo Brasil.

Vou me ater apenas ao ponto central da argumentação de Feliciano: o medo de que os ‘homossexuais expulsem deus (e seus seguidores) do Brasil. A liberdade religiosa é uma clausula pétrea da Constituição Federal, que no artigo 5º, VI, estipula ser inviolável a liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias.
Mesmo que um presidente homossexual (outro além da egodistônica Dilma Rousseff) assuma o poder, as liberdades religiosas estão garantidas. Mesmo porque, em nenhum momento, em nenhuma declaração pública, nenhum homossexual (que eu tenha registro) falou contra as liberdades religiosas, não importando a crença ou denominação. O problema é que muitas destas denominações não querem apenas viver suas ideologias, mas as impor sobre toda a sociedade, de forma autoritária e (aí sim) fascista. Não compete ao Estado ou a Constituição versar sobre o que é pecado e sobre os conceitos infundados de família que A ou B tenham criado, mas garantir os direitos humanos a todos, independente de crença, baseados na liberdade individual e no que há de mais moderno no mundo em relação a estes direitos.

Agora, os direitos dos homossexuais (inclusive de existir ou de morar no Brasil) podem ser ameaçados se um grupo fundamentalista assumir o poder. O medo tem de ser nosso e não dos evangélicos. O que garante que um presidente evangélico não possa ‘proibir relações entre pessoas do mesmo sexo’? O que garante que uma maioria absoluta no congresso não torne homossexualidade uma doença e o tratamento compulsório? Mesmo sem maioria, eles já querem fazer tal absurdo, através do projeto de lei do Deputado Federal João Campos (PSDB-GO), usando truques de lingüística simplistas chamando a cura de ‘tratamento’, sem buscar no dicionário o significado de ‘tratamento’.

O que nos garante que teremos direitos assegurados com uma maioria de fundamentalistas no poder, se hoje já não temos direitos respeitados? Como esperar que a discriminação contra LGBTs cesse, se não ensinarmos as gerações futuras a beleza da diversidade entre as pessoas? Sem a aprovação de um projeto que torne obrigatório o ensino de orientação sexual e identidade de gênero nas escolas públicas e particulares, obviamente adequadas a realidade pedagógica de cada jovem, nunca sairemos deste ciclo vicioso de homofobia e preconceito.

Como seus pensamentos em looping, os fundamentalistas querem que a existência dos homossexuais seja miserável, para poder então ‘curá-los’, aumentar seus rebanhos, e consequentemente seus lucros. Os LGTB seriam sempre discriminados por terem seus direitos (inclusive a vida) negados por pessoas que não aceitam a diversidade. E estas pessoas não aceitam ou compreendem a diversidade porque não forem EDUCADAS para tal, pois nem em casa ou escola ensinam isso.

A falta de coerência nos argumentos do Deputado Marcos Feliciano é aterradora, e a forma como ele tenta manipular as massas que o seguem também. O medo de perder direitos civis, de perder a dignidade, de perder o emprego, de perder o abrigo em casa, de perder os amigos, a família, de perder dentes, de ter ossos quebrados, de perder a vida em um beco de uma cidade qualquer, é NOSSO, deputado. Porque este medo real, e não hipotético, já faz parte do cotidiano de todos os gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais brasileiros.


-- 
Junior Vieira
Bibliotecário 

Um comentário:

  1. Penso que a fé mal focada pode ser fonte de grandes males .,assim .,como já causou muita dor em épocas mais recuadas ,tais como a "santa" inquisição e as cruzadas , ora , se a mensagem de Deus é de amor pessoas como esse Marco feliciano traem a essência de Jesus , quando espalham sua maldade e e intolerância.

    ResponderExcluir

1-Este blog aceita comentários que sejam específicos, ou em diálogo com as postagens correspondentes, conteúdo fora do contexto da mensagem correspondente poderá não ser publicado.

2- São vedados comentários com conteúdo de pregação ou proselitismos de doutrinas específicas de igrejas cristãs, ou qualquer outra religião,salvo quando estes se referirem à crítica de uma postagem principal em concordância ou discordância da mesma, devidamente fundamentados.

3-Conforme art. 5º, IV da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

4-Todo conteúdo dos comentários será avaliado, sendo reservado o direito de não serem publicados, os comentários, caso seus fundamentos sejam ofensivos ou desrespeitem o direito dos homossexuais.