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sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

O EXTREMISMO DE BOLSONARO E A IDIOSSINCRASIA GAY (LGBT)




A figura do Messias (aqui, uma polissemia para além do nome do presidente), que se formou sobretudo dentro dos templos evangélicos e, para esse público aí, como a primeira possibilidade de uma liderança que comungasse dos valores extremistas das denominações que lideram o ranking de maiores igrejas do Brasil, traz, em si, um choque, mediante a todo retrocesso que representa, aos valores mais igualitários pautados nos últimos 14 anos, em nossa sociedade.

Embora carregado do símbolo e declaradamente representante deste retrocesso supramencionado, a comunidade LGBT mitigou a imagem dele, classificando-a como uma representação de bravatas. Bolsonaro jamais (no imaginário LGBT) cumpriria a cabo suas ameaças, seus medievalismos, tudo isso era só um marketing para ganhar as eleições.

A idiossincrasia do comportamento gay é algo que deve ser estudado de forma profunda e determinante. Parece-me assemelhar ao comportamento dos indivíduos esquizofrênicos (em que as identidades não se comunicam). Essa ruptura epistemológica vai para além da identidade pós-moderna e eu explico o porquê.

Na pós-modernidade, há o afastamento das grandes narrativas totalizantes, ela é marcada pela substituição de valores axiomáticos por valores menos fechados e/ou categorizantes. Como explicar à comunidade LGBT, que se funda nos valores da pós-modernidade (a multiplicidade, a fragmentação, a desreferencialização e a entropia - que, com a aceitação de todos os estilos e estéticas, pretende a inclusão de todas as culturas), que Bolsonaro, com seu extremismo cristão, é a antítese dessa postura?

Aliás, não apenas antítese (que não teria algum mal fazer a crítica em determinados pontos, sendo até um contrapeso), mas a sentença paradigmática, assinada pela igreja evangélica, encarnada por Bolsonaro, que a cultura LGBT tem que ser dizimada. Não parece sensato, aliás, é totalmente insano, é como se houvesse uma chave que liga o comportamento gay para a pegação, sauna, bares, cinemas, teatros, etc. e desliga o comportamento gay para uma moral austera, religiosa, preconceituosa, em que uma realidade não lembra da outra e nem com ela se comunica, tudo associado em um mesmo indivíduo, grupo de indivíduos.

É diferente, por exemplo, do Clodovil, que era assumidamente gay, mas nunca foi adepto à comunidade gay. Aliás, ele era um gay de valores heterossexuais. Aqui, nessa histrionia LGBT, o gay é gay, adepto da comunidade gay, dos valores gays, mas vota em Bolsonaro que carrega o cheque em branco das denominações evangélicas para a destruição dessa cultura gay, ou seja, o LGBT ora é adepto da inclusão de todas as culturas, ora é adepto da dizimação de sua própria cultura.

Basta olhar, no governo do Messias, o que foi feito em prol da comunidade LGBT? Entretanto, está tudo certo, o Grindr continua com seus usuários! O discurso em que ele se elegeu presidente, per si, era para ser rechaçado no meio gay, mas não foi... não é. Não é só a questão de se mitigar, é a questão de não ver problema onde existe problema.

Vive-se uma identidade de imbecis, consagrando a dissociação do estilo de vida X política, do nicho pessoal X do social. No passado recente, gritamos contra a então presidente Dilma que afirmou em seu governo não haveria lobby gay, para agradar os representantes da bancada evangélica e hoje somos a própria Dilma em afirmamos abaixo o lobby gay. PASME, ELEGEMOS BOLSONARO!

Há uma lacuna estrutural na sociedade e ela é de epistemologia identitária. Ou você é gay ou você será destruído pelos evangélicos. Idiossincrasias à parte, há coisas bem mais sérias a se olhar do que retirar o PT do poder.



domingo, 10 de setembro de 2017

A opinião de Aguinaldo Silva te incomoda? Ela é mais comum do que se possa imaginar.



Não é de hoje que vejo, com pesar, manifestações que agridem valores, que lutamos para construir, na boca de pessoas assumidamente gays, mas que não se incomodam de tê-las, pois foram "criadas" assim.

Para exemplificar bem o que digo, nada melhor que tomar de exemplo Clodovil Hernandes. Gay, assumidamente gay, que se orgulhava de reproduzir falas da sociedade heteronormativa, momento do qual ele se via aceito ou próximo de uma “normalidade”, em última análise, sendo ele o próprio culpado por toda rejeição social contra a sua sexualidade.

Vimos Ney Matogrosso declarar que gay é o caralho, que ele se recusa a pegar essa bandeira, pois sua defesa é mais abrangente, envolve índios, negros etc.

Aguinaldo Silva uma vez disse que em suas novelas não teria o beijo gay, pois o grande público não queria ver, pois estavam reunidos com suas famílias. Assim, a mensagem que essas personalidades passam, tacitamente, reproduz que o gay aceito é aquele que não faz “bichices” em público ou na presença da família.

Pode parecer estranho, quando isso vem de personalidades com grande alcance. Na verdade, o que elas fazem é repetir o ódio que nunca morre, disfarçando em sutilezas, justificando-o em maquiagens que o amenizam, mas o ódio é eterno.

Ódios sempre são alimentados, por isso o racismo ainda hoje existe, por isso que a homofobia sempre vai existir, o ódio é o sentimento mais fiel do mundo. Em um relacionamento em que houve ressentimento de um, o ex será permanente, nunca passará, a velha história de que: “é meu ex, não podemos ser amigos!”.  

Quando os famosos reproduzem a homofobia, o impacto é imediato; acontece, entretanto, que somos submetidos ao rancor homofóbico todos os dias e, às vezes, nem percebemos. A internet deu voz aos idiotas, dizia Umberto Eco... Ontem, por exemplo, observava pelo Facebook homossexuais discutindo, em que gays negros humilhavam os gays “padrõezinhos”, o motivo: eram padrõezinhos, entretanto, as agressões iam muito além disso. Gays estavam humilhando gays por serem gays. Ser padrãozinho era a maquiagem que disfarçava a homofobia internalizada.

Outro dia assistia, pelo You Tube, Academia de Drags, em que uma das provas era “gongar o outro” Travestis humilhavam-se mutuamente, disparando frases que retomavam a cultura heteronormativa, que inseria rancor e depreciação, mas era para ser engraçado. Às vezes, a maquiagem do ódio é a piada.

A opinião de Aguinaldo Silva te incomoda? Mas ela é corriqueira, é mais comum do que se possa imaginar. De fato, o repórter foi direto, acontece que Aguinaldo Silva foi tão sutil quanto Bolsonaro e essa sutileza está dentro das representações LGBT(s), todos os dias, pois o ódio em que fomos criados não morre. 

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Deus ama ao que dá com alegria



Pode parecer piada, pode ser provocador, pode até tirar a seriedade de nossa proposta inicial, mas não vamos deixar de usar o versículo bíblico que tem causado polêmicas neste blog. Não faremos por uma razão muito simples: a maldade da interpretação não é nossa! Ninguém nos perguntou a intenção primeira, ninguém quis saber, minimamente, o nosso posicionamento, todos já tinham ou têm em mente suas próprias conclusões. Fato que não nos surpreendem as opiniões nem os conceitos aduzidos da maldade estampada em vocês que nos leem, não em nós que criamos o slogan.

A verdade é que nem as intenções mais polidas estão livres da perversidade de nos julgar com o peso da moral austera e conservadora, que vem através dos milênios, causando tanta dor quando o assunto é sexualidade.

Há aqueles, prezando pelo bom nome das escrituras e a complacência da sociedade heteronormativa, que querem nos ensinar a “hermenêutica correta do texto”, o que me leva a perguntar: por que não agem assim, quando a interpretação recai em textos que supostamente condenam a homossexualidade? Por que efeminados, sodomitas e outros não podem ter contexto, sendo que a interpretação é imediata e “dar com alegria” tem que ter?

Aliás, muito oportuno dizer que: os capítulos 8 e 9 da segunda carta de Paulo aos coríntios dizem de uma vivência integral, plena, verdadeira, completa, em que os irmãos dividem tudo com todos, os mais abundantes e os menos abundantes, não havendo desigualdades entre eles. Isso culmina no capítulo 9, versículo 7, quando Paulo afirma que a contribuição deve ser feita de acordo com a consciência, com a vontade, com a liberdade e isso (consciência do que se faz, vontade de fazer e liberdade no que faz) gera a alegria que é amada por Deus.

Desta feita, quando usamos o final do versículo “Deus ama ao que dá com alegria”, fizemos no sentido de dizer que: tudo que é feito com liberdade, prazer e consciência; tudo aquilo que não é pecado e que promove a si e o outro em dignidade, igualdade, fraternidade, é amado por Deus. Sim, Deus ama quem dá com alegria, quem mergulha por completo, por inteiro, em uma causa não se entristecendo, com pesar ou servidão, mas por liberdade de ser o que se é e fazer o que se faz.

Assim, por sermos homossexuais e nos orgulharmos, nos envolvemos nessa causa, certamente, podemos dizer que Deus ama quem dá com alegria, ou seja: aquele que vive sua sexualidade, sem desigualdade ou pesar, com consciência e liberdade, amando, vivendo, aprendendo, respeitando e lutando para que o mundo seja um lugar melhor para todos nós, integralmente nessa causa. Nisso somos amados por Deus.

Respondendo a um comentário em relação do que o meio inclusivo precisa ou deixou de precisar: nunca o Gospel LGBT voltou suas ações para as “igrejas inclusivas”, aliás, muitas vezes discordamos das abordagens inclusivas de um evangelho heteronormativo e opressor vivido dentro dessas comunidades. Não é por que se usa do álibi de ser inclusivo que se é livre de homofobias e preconceitos. Ao contrário, alguns editores deste blog já travaram as mais duras oposições, da mais sórdida homofobia, vindas das igrejas que incluem LGBT(s). Ao que nos parece, essas igrejas incluem tudo, inclusive, a homofobia contra seus adeptos.


Portanto, este blog segue sua independência interpretativa teológica, não sendo prisioneiro de nenhum conceito denominacional. Assim, continuaremos a promover uma espiritualidade livre que reflita a ética de ser homoafetivo e cristão.

sábado, 26 de agosto de 2017

A desconstrução da homofobia



Quando Umberto Eco disse que as rededes sociais deram voz aos imbecis, ele resumiu como os 17 primeiros anos do século XXI estão nos desafiando a selecionar o que permitimos chegar através delas a nós. É impressionante como devaneios pessoais, que outrora não passariam de meras esquisitices, ganham ares de intelectualidade e verdade.

Não é sem razão que: os Bolsonaros transformaram-se em mitos, Olavo de Carvalho é dito filósofo, Danilo Gentilli encarado como intelectual... Tempos estranhos, em que o idiota da pequena aldeia consegue viralizar seu ódio pessoal e contaminar milhões.

Na tendência desse início de século, algumas coisas estranhas também acontecem dentro da comunidade LGBT, entretanto, para a surpresa de muitos, a fórmula viral é antiga e a Inglaterra, dela se utilizando, conseguiu jogar árabes contra judeus, ocidente contra oriente.

Na cupidez da inclusão e visibilidade, houve o intento de dar forma a todos os representantes do acrônimo LGBT, sem embargo, penso que a iniciativa é fantástica, afinal, somos uma diversidade conceitual, construindo uma identidade social diferente da imposta pelo modelo heteronormativo. Assim, o nosso modelo é conceituado a partir de nós mesmos, de nossos significados, significantes e orgulho. Foucault já nos dizia isso: inventarmos o nosso jeito de ser homossexuais.  

O tiro no pé de toda essa empreitada veio por aquilo que dentre séculos tem sido a coisa mais sofrível para nós: a homofobia, ou melhor, a desconstrução dela. É modismo no meio reclassificá-la, relativizá-la, dizer dela com outros parâmetros, tudo em nome de uma tendência não refletida, o social, a visibilidade fluída. Tendência perigosa, ardilosa, sorrateira, que faz o preconceito sofrido pela lésbica, homofobia, ganhar o nome de lesbofobia; que faz o preconceito sofrido pelo gay, homofobia, ganhar o nome de gayfobia; que faz o preconceito sofrido pelo bissexual, homofobia, ganhar o nome de bifobia; que faz o preconceito sofrido pela transexual, homofobia, ganhar o nome de transfobia e por aí vai. Qualquer preconceito sofrido por um homossexual, hoje, ele pega, insere dentro da letrinha do acrônimo que se acha representado e diz: “é “X” fobia, ao invés de se enxergar no todo, naquilo que de fato ele é, naquilo que de fato o preconceito lançado contra ele é.

Pode não parecer, a comunidade LGBT talvez ainda não tenha percebido, mas essa visibilidade particular de grupos destrói o consenso, a unidade, enfraquece o movimento como todo. Eu sinto orgulho de ser homossexual, pois eu sou gay, assim todos na comunidade LGBT devem sentir orgulho de ser homossexuais. O preconceito que advém contra nós é pelo fato de sermos atraídos pelo mesmo sexo, não importa qual seja a letra que nos abrace no acrônimo.

Ter movimentos próprios dentro da comunidade é fantástico, mas esses movimentos não podem se encher de “nacionalismos”, fechando-se em seus próprios círculos. Afinal, uma lésbica não é mais homossexual do que um bi, do que uma trans e vice e versa.

A Inglaterra destruiu o império Otomano por acentuar as particularidades das nacionalidades que compunham tal império em demérito do todo. As consequências de tais ações foram: a queda do império, a guerra sem fim dos árabes contra os judeus, a guerra do “Estado Islâmico” contra o ocidente. Ódios plantados pelos ingleses nos séculos XIX e XX, que hoje em dia resvalam em nós.

Dessa forma, quando Mara Maravilha fala de Adão e Ivo na TV, a fala dela não é transfóbica. A fala dela é homofóbica, pois diz do desejo de pessoas que têm o mesmo sexo se relacionarem, coabitarem, constituírem família e terem seus direitos reconhecidos.

É fantástico que todos tenham visibilidade dentro da comunidade LGBT, que todos tenham representações e voz, mas em hipótese alguma essa visibilidade pode ser feita na desconstrução da homofobia, pois ela é real, epistemológica e sua relativização pode nos custar direitos e garantias, pode alimentar o ódio de grupos, contra outros, dentro da própria comunidade.

Nossa primeira identidade é sermos homossexuais, nosso primeiro orgulho é de sermos homossexuais, nosso primeiro preconceito é por sermos homossexuais e aquilo que sofremos na sociedade é HOMOFOBIA.


De resto, são as redes sociais, dando vozes aos idiotas como se fossem idôneos, ou tivessem conquistado algum premio Nobel. 

terça-feira, 9 de junho de 2015

Trans crucificada na Parada Gay




A trans crucificada na Parada, ou a blasfêmia que não existe

por João Marinho

É duro ser óbvio.


Mas uma performance artística como a da Viviany utilizou um forte simbolismo que não é cristão, é universal: a crucificação, de Cristo, como forma de martírio dos excluídos.

Esse simbolismo aparece ao longo de toda a história ocidental nas artes, na filosofia e em numerosas outras instâncias – e nunca foi monopólio das igrejas. Aparece até em países não ocidentais e não cristãos.

É tão correto e universal utilizar esse simbolismo quanto utilizar os simbolismos trazidos pela mitologia grega, por exemplo – que, igualmente, estão presentes nas artes, na filosofia, na psicologia e, vejam só, até nas produções de pensadores cristãos!

Será que Freud precisou ser um grego converso e consultar o Oráculo de Delfos para fazer referência a Eros e Psique e até nomear alguns elementos da psicanálise assim?

Será que, quando você chama uma pessoa de "Judas", não está fazendo uma referência ao simbolismo da traição, mas dizendo categoricamente que está prestes a ser morto numa cruz porque aquela pessoa acabou de vender você por algumas moedas de prata (boa sorte em encontrar a pena de cruz em pleno século 21, aliás)?

O que é cristão é tão-somente a crença no sacrifício de Cristo como redentor dos pecados e a natureza divina de Cristo. Assim mesmo, nem esta última é considerada correta por todos: as testemunhas de Jeová, por exemplo, acreditam na redenção dos pecados por meio do sacrifício, mas rejeitam a divindade de Cristo.

Com esta parte religiosa, a Viviany não mexeu em nada. Por caso, ela se posicionou como uma nova Salvadora da humanidade?

Ela pregou um novo Evangelho? Recrutou doze novas apóstolas (dica: não é autodeclarado "apóstolo", por acaso, o organizador da "Marcha para Jesus"? A se pensar...)?

Por acaso, ela disse que estava, na Parada, crucificada para salvar o mundo do pecado? Por acaso, ao menos, ela disse que o sacrifício de Cristo nada valia e que o dela é que deveria ser considerado em seu lugar?

Não.

E ela só poderia ser considerada blasfema, pelos dogmas cristãos, se tivesse dito qualquer dessas coisas – e abram parênteses, porque ser blasfema é direito de liberdade de expressão também.

Viviany, no entanto, não mexeu com nenhum desses dogmas. Fez uma representação artística, buscando inspiração no simbolismo universal da morte de Cristo como martírio dos excluídos da mesma forma que MILHARES de pensadores, artistas, filósofos e religiosos, até de outras religiões, já fizeram antes – e utilizou esse forte símbolo para fazer uma denúncia social contra a intolerância religiosa que vitima LGBTs todos os dias.

Ora, não precisa "ser mais cristão" que ninguém para fazer uso desse simbolismo. Não precisa ser "mais cristão que todos os outros" para entender esse simbolismo que, como acabei de mencionar, foi utilizado até por sábios de outros credos.

O espanto, isso sim, é que os próprios cristãos não entendam o uso do símbolo e tratem como "blasfêmia" aquilo que nem mesmo sua doutrina autoriza a tratar como.

E se vamos falar de imposição, sinceramente, quem precisa rever conceitos são os cristãos.

Defendemos aqui uma representação simbólica da morte de Cristo e a denúncia social que ela traz. Não estamos rejeitando o direito de os cristãos exercitarem sua fé por causa dessa defesa.

Já você, caro cristão fundamentalista, critica a manifestação da transexual, dizendo que "foi desrespeitosa", "agressiva", porque a crucificação é "santa e superior".

Ora, eu não acredito que o simbolismo da crucificação é "santo e superior" – e, no entanto, defendo o direito de utilizá-lo tanto quem acredita que é quanto quem não acredita que é.

você defende que quem não acredita na mesma "santidade" que você se abstenha de fazê-lo, apenas porque você e sua comunidade acreditam nela.

Quem é que está impondo seu credo a outros mesmo?

E se quiserem prova do que digo, leiam o que diz a própria Viviany Beleboni: http://www.revistaforum.com.br/blog/2015/06/tudo-bem-encenar-a-paixao-de-cristo-mas-quando-e-uma-travesti-nao-pode-nao-e/

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Quanto aos gays que fazem coro a Feliciano e afins, só tenho a dizer uma coisa: lamentável!

Vira e mexe, aparecem com aquele discurso de que a "Parada perdeu o propósito", de que "é só festa e deveria ser política", que deveria "reivindicar em fez de tocar música e haver pessoas fazendo sexo".

Aí, quando alguém faz uma denúncia política e social por meio da arte e de um símbolo forte e universal, reclamam porque "foi desrespeitoso" e "há outros meios de exigir respeito"?

Querem um dica? Vão, então, à Parada LGBT do próximo ano e proponham esses "outros meios". Garanto que nós outros, e a Viviany, muito nos aproveitaríamos de suas iluminadas sugestões.

domingo, 13 de julho de 2014

O QUE ACONTECEU COM OS PASSIVOS?



Esta é uma crônica. 
Por JOÃO MARINHO

Então, se soar injusta ou generalista, me perdoem, pois não tem o objetivo de ser um texto de verdade científica. São impressões pessoais, e elas, muitas vezes, são injustas... Mas preciso perguntar: o que aconteceu com os passivos? Ou, pelo menos, com boa parte deles que venho conhecendo?

Anos atrás, solteiro, lembro quando fui a um desses estabelecimentos de sexo fácil: paga-se a entrada e espera-se encontrar alguém lá dentro para as tais brincadeiras lúdicas, sem compromisso e com o conforto de todos os equipamentos em volta.

Achei interessante o comportamento de praticamente todos os passivos – ou versáteis que estavam abertos à passividade: de toalha, como todos estávamos, passavam, sem cerimônia, a mão sobre a “zona sul frontal” de qualquer incauto. Não notando sinal de excitação, imediatamente o descartavam.

Interessante... E deselegante.

Na época em que comecei, não me recordo de ser uma prática tão comum. Entendíamos – ou EU entendia? – que a excitação vinha da própria brincadeira, ao longo dela... E não antes, sem a qual ninguém brincava de nada.

Penso que eu talvez seja da época em que ser passivo tinha sua magia, mesmo que essa época seja mais mítica que real. Então, talvez eu só goste de pensar assim.

De qualquer forma, acredito que havia um quê de “cortesã”, no sentido do termo que se aplicava às acompanhantes e amantes de luxo nas antigas cortes.

Às vezes, tenho a impressão de que, conforme aumentou o interesse na passividade, perderam qualidade os adeptos.

Hoje, vejo muitos passivos, e muitos tão jovens, que ficaram muito chatos, muito carentes ou muito deselegantes.

Na época em que comecei, ou talvez seja por causa do lugar em que comecei, parecia haver até o senso de uma “irmandade passiva”. Éramos, sim, caçadoras e concorrentes entre nós – mas com regras na disputa.

Por exemplo: nunca, nunca, nunca tirávamos a carne da boca de outra, entendam isso no sentido denotativo ou figurado.

Se alguém de nós via “a caça” primeiro e a pegava, nada fazíamos com esta sem autorização daquele. Às vezes, até perdíamos o “bofe” para manter “a amiga” – ou, ao menos, tínhamos a finesse de aproveitá-lo fora da vista dela e manter a discrição para não machucá-la gratuitamente.

Hoje, não.

As “bees” que veem você com um, mesmo que seja o menos bonito do pedaço, não só querem gongar você e roubar o outro pra si – como ainda empatam seu sexo. De propósito. E com cara de desafiante: “que que você vai fazer, mona?!”

Outro exemplo, só para ter mais um, mas há outros... Muitas vezes, também não sabem manter a discrição sobre seus amantes, e sabemos que há tantos homens que, por qualquer que seja o motivo, se veem obrigados a viver as relações entre iguais na clandestinidade.

Não sei se cabe a nós julgar, mas, para o sexo, isso não deveria importar, porém. Não estou falando de namoros ou relacionamentos estáveis, de casamento – mas das toalhas.

Então, muitos passivos viraram carentes, invasivos, ameaçadores – e esses homens clandestinos ficam atemorizados.

Aí, o que fazem?

Viram "g0ys".

Preferem confiar no "parça de futebol", que, enfim, também tem algo a esconder – que no passivo mais assumido que, um belo dia, pode ficar histérico e mandar um e-mail para a mulher ou namorada dele contando tudo. Com fotos e mensagens gravadas, é claro. Ou um Whatsapp, que é mais moderno.

... E depois muitos reclamam que faltam ativos "no mercado". Não sei se faltam... Ou se eles estão se escondendo  .

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Dilma: desgraça para gays


 Dilma: a pior desgraça para os LGBTs


por João Marinho

Quando estive na audiência pública do Senado, em 2007 (uma das vááárias que o projeto já teve: me pergunto por que ainda precisa de MAIS!), que discutia o PLC, vi Ideli Salvatti fazendo um apelo emocionado a favor do PLC 122, quase que com lágrimas nos olhos. Dizia ela que, se o projeto merecesse reparos, que fossem feitos, mas que não se deixasse de aprová-lo, dada a sua importância contra a violência, que vitima tantas famílias.

Seis anos depois, agora assisto à mesma Ideli atendendo ao pedido do Planalto para que adiem o PLC até as eleições de 2014, mostrando novamente como o governo petista e de Dilma Rousseff está de joelhos, desde já, frente ao fundamentalismo – e que papelão da Ideli! Eu pediria para sair, se agir significasse ir contra valores morais que eu mesmo preguei e condenar toda uma população a permanecer à margem do direito positivo, deixando de gozar um direito que seus algozes, os evangélicos, já possuem (a lei já protege contra a discriminação por motivo religioso).

Quero ver agora algum amigo petista ainda defender a "senhora presidenta". Não há dúvida alguma: Dilma Rousseff e seu governo foram a pior desgraça que já aconteceu no Brasil para lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais desde a redemocratização.

Jamais terá meu voto novamente. Sim, voto nulo em 2014 se for necessário, mas nessa pessoa inescrupulosa que colocamos como presidente, jamais. Nem para síndica de prédio. Espero com ardor o dia em que será engolida pela história e envenenada pelas alianças espúrias que se propôs a fazer. Eu, que simpatizava com o PT.

"Vamos votar em uma mulher, um marco histórico para o Brasil", diziam os petistas que me convenceram em 2010. Que piada! Talvez Margaret Thatcher fosse menos pior para o Brasil. Ela, pelo menos, era franca: não se fazia de "defensora" dos direitos de minorias, enquanto dava a rasteira nessas mesmas minorias nos bastidores.

E anotem esses nomes, LGBTs: Wellington Dias (PT-PI) e Walter Pinheiro (PT-BA) não são merecedores de seus votos em 2014 .

Mais e por quê:
http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2013-12-13/por-2014-planalto-freia-projeto-que-criminaliza-homofobia.html

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Homem feminista? Repensando



O Deus Forseti, movimento de homens e a imagem da igualdade como meta




por João Marinho



Por muitos anos, eu me considerei um homem feminista, como até já postei várias vezes aqui e em textos meus.

Afinal, sempre fui a favor da igualdade de condições entre homens e mulheres – desde criança, como minhas irmãs podem atestar.

No entanto, tenho repensado essa classificação.

Na semana passada, tivemos eu e meu amigo, Ricardo, uma experiência péssima com mulheres feministas na discussão sobre os vagões exclusivos para mulheres que querem os políticos implantar no metrô de São Paulo.

Tratava-se de um evento das feministas contra a implantação, e, embora eu concordasse com isso desde o começo, e o Ricardo, posteriormente, logo fomos acusados de coisas nada agradáveis.

Ricardo, verdade seja dita, é muito mais feminista que eu. Embora, a princípio, discordasse das mulheres do manifesto contra a implantação dos vagões, sempre escreveu a partir de uma visão feminista e do direito e bem-estar das mulheres.

Eu não.

Estava defendendo outros valores, entre eles a injustiça de considerar qualquer homem um abusador/estuprador em potencial apenas por ser homem e por prevenção (Minority Report?) e ainda reduzir, para nós, a oferta de um serviço público pela metade (mantendo o mesmo custo).

As acusações? De estarmos fazendo "mansplaining" até sermos parte dos opressores apenas porque somos homens.

Argumentei que era impossível que nos colocassem nessa posição, não apenas por nosso histórico, mas também por nossa própria condição de gays. Afinal, que "opressores" são esses que se assumem e são demitidos, levam lampadada na rua se demonstram seu amor, são expulsos de casa por suas famílias (mesmo suas mães) e são mortos ou presos apenas por serem quem são em mais de 80 países?

Algumas concordaram comigo, mas as mais radicais deletaram tudo, em represália. Outro amigo meu teve experiência similar.

Ocorreu-me, então, que eu talvez não seja, afinal, feminista. Isso porque o que defendo é uma igualdade de condições e, eventualmente, para atingi-la, a necessidade de leis diferenciadas para contrapor desvantagens prévias ou impostas.

Essa posição, muitas vezes, me fará estar ao lado das feministas... Mas, muitas vezes, me fará estar em oposição a elas – e não para "reafirmar o poder do macho", como faz um machista.

No entanto, como não posso sair e deixar meu gênero, minha identidade de gênero, minha cissexualidade e minha orientação sexual em casa, sempre vou me colocar contra qualquer pauta que represente para mim, enquanto homem gay, algo que considero injusto ou a inclusão em um grupo que perde direitos quando o meu grupo sequer os atingiu todos. Ser homem e ser gay significa defender meus interesses como tal, um direito que me assiste.

Por isso, por exemplo, sou contra aposentadoria diferenciada para mulheres e homens. Contra licença-maternidade e paternidade diferenciadas apenas pelo sexo do pai/mãe (proponho a licença-parentalidade flexível, uma estendida e outra reduzida) e contra a Lei Maria da Penha não estar escrita em termos jurídicos neutros.

Por quê? Porque os argumentos que usam para justificar esses desníveis não me concernem e não me incluem enquanto homem gay. Enquanto homem gay, jamais contribuirei para a "dupla jornada" feminina e não vejo razão para que eu seja responsabilizado se parte dos héteros não encontram arranjos mais igualitários em seus casamentos; sou a favor da igualdade de salários e vencimentos, mas discordo que deva ser resolvida na aposentadoria, especialmente colocando para trabalhar 5 anos a mais quem, estatisticamente, vive 5 anos a menos e, não raro, começa mais cedo; enquanto gay que deverá adotar com seu companheiro, considero injusto que não gozemos de uma licença similar e negociada para nossos rebentos; e, enquanto gay e sabendo de caso de violência doméstica em relação homoafetiva (e de violência em que a mulher é agressora), causa-me desconforto que esses casos tenham sido deixados fora da legislação positiva apenas por não serem majoritários.

Pelo que entendo, sobretudo para as feministas que consideram que "ter pênis = ser do mal", tais posições entram em conflito com as suas demandas.

Então, o que sou? As imagens de alguns Deuses me vieram à cabeça. Têmis, a titânide que segura a balança visando ao equilíbrio, mas sem a espada de sua filha Dice ou da romana Iustitia, foi uma: o equilíbrio sem violência, dosando as diferenças até a balança ficar horizontal – aliás, "equilíbrio" é uma palavra que inclui, em sua origem, a palavra latina para "balança": "libra".

No entanto, alguém poderia imaginar que automaticamente eu seria acusado de "roubar" uma imagem feminina, uma vez ser Têmis uma representação em forma de mulher.

Forseti, então, me pareceu mais adequado. Um Deus da mitologia nórdica, Forseti (c) também é identificado com a justiça naqueles povos antigos e da forma que me veio à cabeça.

Filho de Balder, um Deus de paz e muito amado, tanto a ponto de ser assassinado por Loki, e Nanna, Forseti é identificado com Fosite, dos frísios, e seu domínio era resolver querelas entre homens e deuses, promovendo a reconciliação. Ouvia ambos os lados com imparcialidade e seus julgamentos eram tão justos que jamais couberam correções. Mais aqui.

Uma imagem forte... E quem sabe não criamos nós outros uma palavra? Será que soa bem me definir como forsetista? Podia virar até um movimento de homens – e de homens gays...

sábado, 3 de agosto de 2013

Felix, um personagem da ficção das 21h00

A militância sempre exagera com as questões LGBTs e a exposição nas teledramaturgias. Eu fico a pensar
que muitos gays acham que a vida deles, em família, tomará uma guinada de 180 graus uma vez que seus pais virem um beijo gay em uma novela da Globo, ou como aquele moço (bom moço) sofreu com a morte de seu namorado, tentando levar uma vida totalmente digna, dentro da “normalidade”, da moral cristã e seus costumes “nobres”, ainda que seja gay. Seria isso um lobby gay ou um lobby heteronormativo? Deixo essa para  outra oportunidade.

É, sem embargo, a coisa mais estúpida e contraproducente que eu já vivenciei por aqui e, pelo jeito, não está longe de ter um fim... Essa ingenuidade  intelectual só se explica pela sofreguidão da vontade em fazer as coisas acontecer, mas que na verdade enterra uma gama de assuntos mais imperiosos e pontuais que deveríamos lutar e defender.  Por exemplo, é muito mais fácil, e muito mais eficaz, que sua família veja você protagonizando um beijo gay do que o casal homossexual da novela;  é muito mais profícuo que você saia do armário em sua casa, que o Felix, na novela, seja exposto em sua homossexualidade a Suzana Vieira e ao Antonio Fagundes...  

O que eu quero dizer com isso? Será que eu desejo destruir as estruturas familiares? Será que eu desejo que os gays sejam deserdados e postos para fora de suas casas, tocados como cachorros sarnentos, jogados ao vento? Absolutamente, não! Mas, se há a vontade sequiosa de que se tenha mudanças, não espere que elas venham por conta dessa ou daquela novela da Globo. Para sua família ser gay é algo extremamente aceitável, desde que gay seja o filho do vizinho, nunca o meu filho... “o meu melhor amigo tem um filho gay, o rapaz é até gente boa, desejo o melhor para ele, ainda bem que você tem uma noiva linda Godofredo!”. Assim, o deputado federal Jean  Wyllys comenta em seu artigo para o sitio IG: “...A família sempre é a primeira saber e a última a acreditar...”. Diria eu, a última a aceitar e, talvez, não aceite nunca!

Os gays apostam todas as suas fichas nas mudanças que a teledramaturgia pode promover, o ledo engano que a exposição muda o Ethos... Não muda, traz o fato como algo próximo, expõe, mas não transforma, pois essa transformação só acontecerá quando dentro do nicho familiar o ethos cultural for possível para minha família, for verificado nela, dentro dela, arraigado, amalgamado, intrínseco em sua condição final.

Não estou dizendo com isso que a teledramaturgia seja descartável, ou que ela não deveria abordar tais assuntos, não é isso, mas apenas digo que as fichas da mudança do preconceito não acontecem por conta de uma novela, ou da exposição que essa possa promover, mas as fichas da mudança devem ser alçadas no comportamento do homossexual e a sua submissão cega à vontade de seus familiares, no desejo desses de ter uma família normal, e nisso o homossexual é descartado sumariamente.

Quer mudanças? Mude você! Não espere que a novela faça isso por sua felicidade, por sua condição existencial, pois ela não fará e nem poder para isso ela tem. Quer respeito? Tenha orgulho de si mesmo e se enxergue como algo digno, como uma pessoa que tem identidade própria, direitos e deveres, afinal, o Felix continuará sendo um personagem da ficção das 21h00 e você continuará sentindo as consequências disso.



terça-feira, 30 de julho de 2013

Estratégia católica?

Francisco e os gays

por João Marinho

De verdade, penso que nós, LGBTs, devemos ter cuidado com Jorge Mario Bergoglio, atualmente conhecido como papa Francisco. Tenho visto muitos empolgados com suas declarações recentes, de que gays não devem ser marginalizados, e até dizendo que ele “defendeu nossos direitos”.

Na verdade, não defendeu, não.

Na continuação da entrevista, ao falar sobre o “lobby gay” no Vaticano, ele declarou que o problema não era a orientação sexual, mas o “lobby” envolvendo a orientação – e que o problema estava em qualquer “lobby”.

É uma declaração dúbia, que tanto pode ser entendida como uma crítica direta aos bastidores nem sempre limpos da política e do alto escalão vaticano – quanto, mais perigosamente, pode ser entendida como uma “condenação generalista”, de que qualquer “lobby gay” é algo a ser visto com desconfiança.

O problema é que, no Ocidente, a maioria dos países vive em regimes democráticos. A união de grupos em torno de interesses comuns faz parte da democracia e é saudável, como já observava Alexis de Tocqueville em sua obra A Democracia na América, análise do regime norte-americano.

Só que, para os adversários de uma demanda, qualquer união nesse sentido pode ser entendida e referida, negativamente, como “lobby”. Do ponto de vista geral, lobby é a pressão que grupos organizados fazem em cima do poder público para aprovar suas propostas, mas, do ponto de vista restrito e negativo, é a mesma pressão visando a atender a interesses privados, em vez de uma genuína preocupação com a coisa pública.

Seria “lobby” a tentativa LGBT de instituir o casamento homoafetivo, o reconhecimento da identidade de gênero dos/as transexuais e o acesso à cirurgia, a proteção contra a homofobia? Para os adversários, sim, e de forma negativa – afinal, não argumentam eles que são demandas que “atendem somente a uma minoria” e não representam “avanço” para a coisa pública? Ora, se lobby é ruim, como disse Francisco, como é que fica, então, a pressão política LGBT para aprovação de suas demandas?

Pensando assim, a frase de Francisco sobre integrar os gays à sociedade ganha outros ares. Uma vez que ele não vai – e nem pode ir – contra o catecismo oficial da igreja católica, essa integração pode ser entendida, também, do ponto de vista heteronormativo. Vale informar que o catecismo faz diferenciação entre orientação sexual e ato sexual. Uma vez que uma pessoa é homossexual, é sua “cruz” praticar a castidade, segundo o catecismo, pois os atos homossexuais são intrinsecamente desordenados.

A que integração Francisco se referiu, então? Ok, não se pode julgar os gays que buscam a Deus e estes devem ser integrados à sociedade – desde que mantenham a prevalência da heterossexualidade como único caminho digno e desistam de fazer “lobbies” em torno de seus direitos mais fundamentais, contra os quais a igreja católica formalmente se opôs em todos os países em que foram levados à discussão? Garanto que muitos não viram as declarações por esse ângulo – mas vejam o perigo...

É claro que é difícil dizer a real intenção de Francisco sem cair em injustiça ou especulações vazias. No entanto, dado o histórico da igreja católica e a atitude dos últimos dois papas que pude conhecer em vida (Jesus, como tô velha!), os patentemente homofóbicos João Paulo 2º (que vai ser canonizado pelo mesmo Francisco!) e Bento 16, que vociferavam – ainda que disfarçadamente, com voz doce – contra nós outros e nossos direitos até em pronunciamentos de Natal, eu diria que “pôr as barbas de molho” é a coisa mais certa a fazer. Prudência e canja de galinha não fazem mal a ninguém, não é assim?

Também não podemos deixar de ter em mente que, enquanto cardeal, Bergoglio se opôs veementemente à aprovação do casamento gay sob o governo de Cristina Kirchner, na Argentina – e não apenas como religioso, mas incutindo-se na esfera pública para influenciar a política de um Estado laico, o que é sempre perigoso... Um... Lobby? Curioso, né? E não, Bergoglio e Francisco não são duas pessoas diferentes só porque trocou o homem de nome. A encíclica escrita a quatro mãos com Bento 16 reforçou seu histórico de oposição a tais direitos de homossexuais, inclusive – e, mesmo não sendo eu católico, sei perfeitamente que uma encíclica tem mais importância que uma declaração a jornalistas.

Há, porém, ao menos um fato que merece ser analisado positivamente nas declarações de Francisco. O tom com que falou dos homossexuais representou, de fato, uma mudança na abordagem feita por seus antecessores. Enquanto cardeal, diz-se, se opôs ao casamento gay, mas admitiu a união civil. Eu diria que a dubiedade a que me aludi mais atrás, inclusive, não foi fora de propósito.

Francisco está francamente atrás de conter o escape de fiéis, e assim, você pode não ter notado, mas, sob o “manto do amor”, tem reforçado os dogmas católicos. Reza com pastores na assembleia de deus, mas a posição de que a igreja católica é a única onde encontrar a salvação está “positiva e operante” como nunca. O papa, no fim, é pop e bastante inteligente – um excelente garoto-propaganda, que se mostra humilde e conquista simpatia, ao mesmo tempo em que solidifica a ideia de correção e hegemonia de tudo que é dito por sua igreja. Para o bem e para o mal. Isso pode ser percebido na questão dos gays, se minha chave interpretativa estiver correta.

Embora suas declarações possam ser um “morde e assopra”, têm a vantagem, que também não me é casual (ele é inteligente, lembre-se!), de marcar uma diferença entre a forma católica e a forma não católica (em outras palavras, evangélica) de tratar a questão. As reações de Silas Malafaia e Marco Feliciano, respectivamente, à popularidade e ao discurso de humildade do papa e à declaração sobre gays mostram que eles também sentiram isso – e se incomodaram, mesmo negando.

Se o papa estiver mesmo engajado numa “guerra fria” contra as religiões evangélicas – mordendo-as e assoprando-as também –, religiões essas que, via políticos fundamentalistas, têm se tornado uma verdadeira pedra no sapato do Brasil laico, tanto melhor. O inimigo do meu inimigo é meu “amigo”. Entretanto, enquanto LGBTs, precisamos ser maquiavélicos (no sentido de Maquiavel), saber aproveitar esse momento, mas estar cientes de que essa “amizade” vai até à página dois, antes de ir beijar os pés de Sua Santidade. Todo cuidado é pouco: e essencial para que não compremos um cordeiro e terminemos com um lobo nos devorando em casa.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Porque investem as prefeituras em eventos gays?


Pink money com autoestima

Sim, gays têm dinheiro, mas pode não ser tanto assim –
e, principalmente, não deve ser para todo mundo!

por João Marinho

Dois milhões e duzentos mil reais. Informados por seu diretor executivo, Nelson Matias, em uma reportagem publicada no portal iG e assinada por Pedro Carvalho, os custos da Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, cuja 17ª edição foi realizada em 2 de junho de 2013, impressionam – e se tornaram fonte de crítica por parte de setores conservadores e religiosos tradicionalmente avessos a eventos com foco no público de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais.
Isso porque, do total de R$ 2,2 milhões, a Prefeitura de São Paulo bancou, ainda segundo a reportagem, R$ 1,6 milhão. Foi o que bastou para que religiosos e conservadores reclamassem, em sites da imprensa, evangélicos e afins, da “conta absurda” a ser paga por dinheiro público, que deveria ser usado para o bem de todos – e não de uma “minoria”.

Lucro alto
A Parada de São Paulo, como outras pelo Brasil e pelo mundo, surgiu espontânea, fruto da mobilização de ativistas LGBTs. Apenas posteriormente, passou a fazer parte de calendários oficiais do poder público. A verdade nua e crua, porém, é que não existe almoço grátis – e isso se aplica ao apoio dos governos.
Dito isso, é necessário considerar que os custos da Parada de São Paulo, tradicionalmente a maior do País, representam apenas a ponta do iceberg – e o que está debaixo dela se reverte, sim, em benefícios extremos para a população e para o poder público.
Sem levar em conta que os gastos da Prefeitura são com infraestrutura, o que já os justificaria, a mesma reportagem do iG informa que, segundo dados da São Paulo Turismo (SPTuris), 39,5% do público da Parada é de turistas, que gastam, em média, R$ 1.272 no fim de semana do evento.
Bem, 39,5% de 600 mil pessoas (estimativa do público segundo a Polícia Militar no ano de 2013) ou 39,5% de 220 mil pessoas (estimativa do Datafolha) resultam, respectivamente, em 237 mil pessoas e 86,9 mil pessoas. Cada uma gastando, em média, R$ 1.272, isso significa que os turistas deixaram aproximadamente, na cidade de São Paulo, quase R$ 301,5 milhões, ou, se apelarmos para os números de público do Datafolha, mais de R$ 110,5 milhões.
Com esse retorno – dinheiro que os turistas gastam em hotéis, alimentação, transporte, lojas, etc. –, quem, em sã consciência, não gastaria R$ 1,6 milhão no evento? Em termos comparativos, isso significa que, para cada R$ 1 gasto pela Prefeitura de São Paulo no evento, são retornados cerca de outros R$ 187 que ficam na cidade, ou mais de R$ 68, seguindo as estatísticas do Datafolha.
Se a Parada fosse uma poupança e o dinheiro público fosse ali aplicado, ela renderia, em um fim de semana, 18.741,50% de juros, considerando o público estimado pela PM, ou 6.808,55%, considerando o público estimado pelo Datafolha. Isso falando apenas dos turistas, sem levar em conta o dinheiro que os próprios habitantes da cidade e municípios próximos gastam, em transporte, comida, compras.
Posso estar errado, mas acredito que nenhum banco, no Brasil ou em outros países, forneça taxas de juros tão formidáveis em sua carteira de investimentos. Portanto, em vez de reclamar porque o poder público gastou R$ 1,6 milhão, por que não agradecer pelo verdadeiro investimento que ele fez?
Parte dos outros R$ 600 mil não bancados pela Prefeitura veio de empresas públicas, como Caixa e Petrobras. Não foi possível definir, para este artigo, quanto do dinheiro deixado em São Paulo é recolhido em impostos federais, mas a julgar por números tão expressivos e impostos tão universais quanto os brasileiros, não soa imprudente dizer que o governo federal recebe, também, um gordo quinhão.

Marginalidade e baixa autoestima
Os números impressionantes se repetem em outra cidade com uma tradição de eventos LGBTs: Juiz de Fora, em Minas Gerais, que realiza sua 36ª edição do Miss Brasil Gay em agosto/2013 e seu igualmente tradicional Rainbow Fest, no mesmo mês. As últimas estatísticas sobre o Rainbow, datadas de 2006, mostram que, naquele ano, 10 mil turistas injetaram nada mais, nada menos que R$ 4 milhões na cidade. Estratosféricas, novamente.
Os dados de São Paulo e Juiz de Fora parecem fazer jus à fama do pink money. A expressão é oriunda do final da década de 1970, nos Estados Unidos. Na época, grupos de direitos de homossexuais não dispunham de patrocinadores para suas ações e tiveram uma ideia brilhante: em um dia de protesto nacional, toda nota de dólar que passasse na mão de um gay deveria ser riscada com uma caneta rosa, no canto. Isso mostraria o potencial que os patrocinadores estavam perdendo.
De lá para cá, cresceu o interesse no “dinheiro cor-de-rosa”, que movimentaria mercados bilionários envolvendo a população LGBT: respectivamente, cerca de US$ 100 bilhões anuais no Brasil e US$ 800 bilhões nos Estados Unidos, segundo reportagem publicada há dois anos na revista IstoÉ Dinheiro. O texto ainda se refere a uma estatística do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), segundo a qual essa população gasta, em média, 30% mais que seus pares heterossexuais em consumo e lazer.
No entanto, toda essa “orgia financeira” tem três lados que são bem negativos.
O primeiro e mais premente é que, no Brasil, não se vê as empresas – sobretudo as grandes marcas – envolvidas fortemente na conquista desse público. Com uma visão embotada de negócios e com receios extremados de “desagradar” a população conservadora, LGBTs permanecem, para essas marcas, relegados a uma posição marginal e oculta.
Se, nos Estados Unidos, companhias como Apple e Google se envolvem em campanhas pró-diversidade sexual, no Brasil, são comuns comerciais polêmicos, como o da marca de cuecas Lupo – que, se não pode ser considerado homofóbico per se, ao menos é de gosto duvidoso e flertou com uma ideologia, no mínimo, questionável. Na Parada de São Paulo, para manter o exemplo, a única empresa privada a adquirir uma cota de patrocínio foi a marca de camisinhas Olla.
Os empresários com negócios voltados diretamente aos LGBTs não fazem mais bonito. Tirando honrosas exceções, investem pouco pelo dinheiro que recebem e falham no treinamento de funcionários, sobretudo seguranças. Casos de espancamentos homofóbicos em boates GLS – absurdo! – têm tomado os jornais ultimamente. Finalmente, o poder público tampouco faz jus ao que recebe. Como se explica o desbotado combate à homofobia em cidades que recebem tantos milhões de reais do bolso do público LGBT?
O segundo lado diz respeito ao fato de que a tese do pink money esconde uma questão social importante: não; o público LGBT não é necessariamente endinheirado, branco, de classe média e disposto a gastar centenas ou milhares de reais por noite. Em termos estatísticos, se, no Brasil, a maioria da população é de classe média-baixa (a atual classe C) a classes menos abastadas, isso se reflete entre os LGBTs. Especialmente no caso do/as transexuais e travestis, tão maltratados/as que, não raro, são vítimas da evasão escolar, com oportunidades profissionais mais restritas.
Essas pessoas têm de ser tratadas com respeito – não por causa do dinheiro que podem gastar, mas por seu lugar como cidadãos e cidadãs. O pink money pode nublar a existência de demandas sociais, reais, objetivas e prementes para a população LGBT. Ora, se está endinheirada, o que falta a essa população? Na verdade, falta tudo, a começar pelo combate à homofobia/transfobia, passando por políticas públicas de prevenção à violência e promoção da saúde e de promoção da autoestima. Gay morto não gasta. Gay agredido não consome: deixa o salário no hospital – e tanto pior quando se está frente à realidade de que não há tanto dinheiro assim no bolso.
Finalmente, um terceiro lado ecoa uma questão que acabamos de mencionar: a autoestima ela-mesma. Cercados por uma cultura homofóbica e sofrendo de preconceito internalizado, LGBTs estão ainda longe de serem “craques” nessa faceta tão importante para o ser humano. É comum que “encontrem” desculpas para a homofobia de terceiros, especialmente quando compram e consomem.
Se, nos Estados Unidos, boicotes promovidos pela GLAAD (antes, Gay & Lesbian Alliance Against Defamation) são efetivos e temidos pelas marcas, no Brasil, consumidores LGBTs se esmeram em “justificar” comportamentos discriminatórios de empresas e comerciais, mesmo quando patentes. Pior: às vezes, sequer se preocupam em investir em lugares que os respeitam.
Quem nunca teve um amigo ou amiga que se recusa a ir a um lugar porque “é gay demais” ou “tem muito ‘viado’”? Ou que, ao presenciar um flagrante desrespeito em um ambiente comercial, como em um restaurante que tenta impedir uma simples troca de beijos homoafetiva (“selinho”), concorda com o estabelecimento, em vez de se colocar ao lado do consumidor injustiçado que, no limite, é gay como ele?
É preciso, portanto, ter em mente que o pink money tem, sim, sua relevância, mas que ele, por si só, é insuficiente para conquistar cidadania. Esta se conquista por meio de luta política, de mobilização social – e, sobretudo, por meio de um intenso e interno trabalho de autoestima. Inclusive na hora de se recusar a deixar parte do salário, normalmente ganho a duras penas e em ambientes nem sempre liberais e libertários, nas mãos de quem não merece.

Pense nisso. 
 

 
Texto originalmente publicado no Rainbow Guia do 16º Juiz de Fora Rainbow Fest.
 

Referências: