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terça-feira, 3 de junho de 2014

Ser um homem feminino

por João Marinho
"Salve, salve a alegria,
A pureza e a fantasia
[…]
Se Deus é menina e menino,
Sou masculino e feminino”

(Letra: Baby Consuelo, Didi Gomes e Pepeu Gomes;
Vocal: Pepeu Gomes)

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Sempre quis entender de onde vem essa paranoia da “macheza” que encontro em tantos gays.

Entendo que as pessoas tenham seus fetiches e preferências – mas não necessariamente que sejam tão inflexíveis em seus gostos ou que julguem as demais com base neles, sem reconhecer o valor destas.

Confesso que, para mim, a “macheza” típica do homem-alfa não é um valor.

Com algumas exceções, os “machos” que conheci e foram comigo para a cama se constituíram em experiências bastante negativas, incapazes que eram de abandonar uma máscara social que permitiria a evolução dos sentimentos e muito ruins no sexo, com um número pouco tolerável de “não faço isso, não faço aquilo, não pego ali”.

Mais do que isso, eram extremamente controladores e excessivamente preocupados com a opinião alheia, com que os “outros iriam pensar”, a ponto de policiarem qualquer levantadinha de dedo mínimo na hora de tomar uma xícara de café…

Existe, porém, outro dado, esse bem mais profundo.

Essa cobrança tão pesada em cima de “ser macho” me remete bastante negativamente a minhas primeiras experiências de infância e adolescência, quando agências como igreja, família, vizinhos e amiguinhos de escola exerciam um controle tão rígido que impossibilitava qualquer manifestação dotada de algum exotismo ou delicadeza, por ser “coisa de veadinho”.

Sim, entendo que as pessoas tenham seus fetiches e preferências – mas não necessariamente como essa triste experiência dos primeiros anos de vida, que machucou tantos de nós e que certamente não foi unicamente minha, possa se desenvolver em um valor inquestionável e sexualizado na vida adulta.

Verdade seja dita, gosto de muitos e diferentes tipos de homem, e isso inclui os que têm um quê de masculino – mas não exijo que sejam “machos”, nem que a “pegação” seja “coisa de machos”, o que quer que isso signifique.

Gosto de saber que existe a possibilidade do riso, do escracho, da pinta, da sensibilidade, da brincadeira, da exteriorização do que socialmente se diz ser feminino – ainda que não seja e nunca tenha sido exclusividade das mulheres –, seja na forma de um ato sério e terno, seja na forma de uma efeminação histriônica.

Gosto, enfim, de homens flexíveis, que tenham um lado de vulnerabilidade e, segundo penso, de humano. Que não tenham medo de chorar, nem de rebolar, nem de pintar o cabelo, nem de soltar uma “pétala” em algum momento, nem de beijar, nem de demonstrar fraqueza e nem mesmo de desmunhecar vez ou outra “com as amigas” só porque tais coisas são consideradas “femininas” ou “coisa de veadinho”.

Gosto, enfim, de homens livres.

Seguros o suficiente de sua própria homossexualidade para questionarem o status quo e buscarem formas de construir diferentes masculinidades – e não dos que se seguram demasiado, forçando a si mesmos a estar em um sarcófago, para corresponderem a um único padrão que mais engessa do que traz felicidade.

Gosto, enfim, de homens que entendem e festejam que, se há “pegação” entre eles, ela pode ser tudo… Menos “coisa de machos”.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Homem feminista? Repensando



O Deus Forseti, movimento de homens e a imagem da igualdade como meta




por João Marinho



Por muitos anos, eu me considerei um homem feminista, como até já postei várias vezes aqui e em textos meus.

Afinal, sempre fui a favor da igualdade de condições entre homens e mulheres – desde criança, como minhas irmãs podem atestar.

No entanto, tenho repensado essa classificação.

Na semana passada, tivemos eu e meu amigo, Ricardo, uma experiência péssima com mulheres feministas na discussão sobre os vagões exclusivos para mulheres que querem os políticos implantar no metrô de São Paulo.

Tratava-se de um evento das feministas contra a implantação, e, embora eu concordasse com isso desde o começo, e o Ricardo, posteriormente, logo fomos acusados de coisas nada agradáveis.

Ricardo, verdade seja dita, é muito mais feminista que eu. Embora, a princípio, discordasse das mulheres do manifesto contra a implantação dos vagões, sempre escreveu a partir de uma visão feminista e do direito e bem-estar das mulheres.

Eu não.

Estava defendendo outros valores, entre eles a injustiça de considerar qualquer homem um abusador/estuprador em potencial apenas por ser homem e por prevenção (Minority Report?) e ainda reduzir, para nós, a oferta de um serviço público pela metade (mantendo o mesmo custo).

As acusações? De estarmos fazendo "mansplaining" até sermos parte dos opressores apenas porque somos homens.

Argumentei que era impossível que nos colocassem nessa posição, não apenas por nosso histórico, mas também por nossa própria condição de gays. Afinal, que "opressores" são esses que se assumem e são demitidos, levam lampadada na rua se demonstram seu amor, são expulsos de casa por suas famílias (mesmo suas mães) e são mortos ou presos apenas por serem quem são em mais de 80 países?

Algumas concordaram comigo, mas as mais radicais deletaram tudo, em represália. Outro amigo meu teve experiência similar.

Ocorreu-me, então, que eu talvez não seja, afinal, feminista. Isso porque o que defendo é uma igualdade de condições e, eventualmente, para atingi-la, a necessidade de leis diferenciadas para contrapor desvantagens prévias ou impostas.

Essa posição, muitas vezes, me fará estar ao lado das feministas... Mas, muitas vezes, me fará estar em oposição a elas – e não para "reafirmar o poder do macho", como faz um machista.

No entanto, como não posso sair e deixar meu gênero, minha identidade de gênero, minha cissexualidade e minha orientação sexual em casa, sempre vou me colocar contra qualquer pauta que represente para mim, enquanto homem gay, algo que considero injusto ou a inclusão em um grupo que perde direitos quando o meu grupo sequer os atingiu todos. Ser homem e ser gay significa defender meus interesses como tal, um direito que me assiste.

Por isso, por exemplo, sou contra aposentadoria diferenciada para mulheres e homens. Contra licença-maternidade e paternidade diferenciadas apenas pelo sexo do pai/mãe (proponho a licença-parentalidade flexível, uma estendida e outra reduzida) e contra a Lei Maria da Penha não estar escrita em termos jurídicos neutros.

Por quê? Porque os argumentos que usam para justificar esses desníveis não me concernem e não me incluem enquanto homem gay. Enquanto homem gay, jamais contribuirei para a "dupla jornada" feminina e não vejo razão para que eu seja responsabilizado se parte dos héteros não encontram arranjos mais igualitários em seus casamentos; sou a favor da igualdade de salários e vencimentos, mas discordo que deva ser resolvida na aposentadoria, especialmente colocando para trabalhar 5 anos a mais quem, estatisticamente, vive 5 anos a menos e, não raro, começa mais cedo; enquanto gay que deverá adotar com seu companheiro, considero injusto que não gozemos de uma licença similar e negociada para nossos rebentos; e, enquanto gay e sabendo de caso de violência doméstica em relação homoafetiva (e de violência em que a mulher é agressora), causa-me desconforto que esses casos tenham sido deixados fora da legislação positiva apenas por não serem majoritários.

Pelo que entendo, sobretudo para as feministas que consideram que "ter pênis = ser do mal", tais posições entram em conflito com as suas demandas.

Então, o que sou? As imagens de alguns Deuses me vieram à cabeça. Têmis, a titânide que segura a balança visando ao equilíbrio, mas sem a espada de sua filha Dice ou da romana Iustitia, foi uma: o equilíbrio sem violência, dosando as diferenças até a balança ficar horizontal – aliás, "equilíbrio" é uma palavra que inclui, em sua origem, a palavra latina para "balança": "libra".

No entanto, alguém poderia imaginar que automaticamente eu seria acusado de "roubar" uma imagem feminina, uma vez ser Têmis uma representação em forma de mulher.

Forseti, então, me pareceu mais adequado. Um Deus da mitologia nórdica, Forseti (c) também é identificado com a justiça naqueles povos antigos e da forma que me veio à cabeça.

Filho de Balder, um Deus de paz e muito amado, tanto a ponto de ser assassinado por Loki, e Nanna, Forseti é identificado com Fosite, dos frísios, e seu domínio era resolver querelas entre homens e deuses, promovendo a reconciliação. Ouvia ambos os lados com imparcialidade e seus julgamentos eram tão justos que jamais couberam correções. Mais aqui.

Uma imagem forte... E quem sabe não criamos nós outros uma palavra? Será que soa bem me definir como forsetista? Podia virar até um movimento de homens – e de homens gays...