O Deus Forseti, movimento de homens e a imagem da igualdade como meta
por João Marinho
Por muitos anos, eu me considerei um homem feminista, como até já postei várias vezes aqui e em textos meus.
Afinal, sempre fui a favor da igualdade de condições entre homens e mulheres – desde criança, como minhas irmãs podem atestar.
No entanto, tenho repensado essa classificação.
Na semana passada, tivemos eu e meu amigo, Ricardo, uma experiência péssima com mulheres feministas na discussão sobre os vagões exclusivos para mulheres que querem os políticos implantar no metrô de São Paulo.
Tratava-se de um evento das feministas contra a implantação, e, embora eu concordasse com isso desde o começo, e o Ricardo, posteriormente, logo fomos acusados de coisas nada agradáveis.
Ricardo, verdade seja dita, é muito mais feminista que eu. Embora, a princípio, discordasse das mulheres do manifesto contra a implantação dos vagões, sempre escreveu a partir de uma visão feminista e do direito e bem-estar das mulheres.
Eu não.
Estava defendendo outros valores, entre eles a injustiça de considerar qualquer homem um abusador/estuprador em potencial apenas por ser homem e por prevenção (Minority Report?) e ainda reduzir, para nós, a oferta de um serviço público pela metade (mantendo o mesmo custo).
As acusações? De estarmos fazendo "mansplaining" até sermos parte dos opressores apenas porque somos homens.
Argumentei que era impossível que nos colocassem nessa posição, não apenas por nosso histórico, mas também por nossa própria condição de gays. Afinal, que "opressores" são esses que se assumem e são demitidos, levam lampadada na rua se demonstram seu amor, são expulsos de casa por suas famílias (mesmo suas mães) e são mortos ou presos apenas por serem quem são em mais de 80 países?
Algumas concordaram comigo, mas as mais radicais deletaram tudo, em represália. Outro amigo meu teve experiência similar.
Ocorreu-me, então, que eu talvez não seja, afinal, feminista. Isso porque o que defendo é uma igualdade de condições e, eventualmente, para atingi-la, a necessidade de leis diferenciadas para contrapor desvantagens prévias ou impostas.
Essa posição, muitas vezes, me fará estar ao lado das feministas... Mas, muitas vezes, me fará estar em oposição a elas – e não para "reafirmar o poder do macho", como faz um machista.
No entanto, como não posso sair e deixar meu gênero, minha identidade de gênero, minha cissexualidade e minha orientação sexual em casa, sempre vou me colocar contra qualquer pauta que represente para mim, enquanto homem gay, algo que considero injusto ou a inclusão em um grupo que perde direitos quando o meu grupo sequer os atingiu todos. Ser homem e ser gay significa defender meus interesses como tal, um direito que me assiste.
Por isso, por exemplo, sou contra aposentadoria diferenciada para mulheres e homens. Contra licença-maternidade e paternidade diferenciadas apenas pelo sexo do pai/mãe (proponho a licença-parentalidade flexível, uma estendida e outra reduzida) e contra a Lei Maria da Penha não estar escrita em termos jurídicos neutros.
Por quê? Porque os argumentos que usam para justificar esses desníveis não me concernem e não me incluem enquanto homem gay. Enquanto homem gay, jamais contribuirei para a "dupla jornada" feminina e não vejo razão para que eu seja responsabilizado se parte dos héteros não encontram arranjos mais igualitários em seus casamentos; sou a favor da igualdade de salários e vencimentos, mas discordo que deva ser resolvida na aposentadoria, especialmente colocando para trabalhar 5 anos a mais quem, estatisticamente, vive 5 anos a menos e, não raro, começa mais cedo; enquanto gay que deverá adotar com seu companheiro, considero injusto que não gozemos de uma licença similar e negociada para nossos rebentos; e, enquanto gay e sabendo de caso de violência doméstica em relação homoafetiva (e de violência em que a mulher é agressora), causa-me desconforto que esses casos tenham sido deixados fora da legislação positiva apenas por não serem majoritários.
Pelo que entendo, sobretudo para as feministas que consideram que "ter pênis = ser do mal", tais posições entram em conflito com as suas demandas.
Então, o que sou? As imagens de alguns Deuses me vieram à cabeça. Têmis, a titânide que segura a balança visando ao equilíbrio, mas sem a espada de sua filha Dice ou da romana Iustitia, foi uma: o equilíbrio sem violência, dosando as diferenças até a balança ficar horizontal – aliás, "equilíbrio" é uma palavra que inclui, em sua origem, a palavra latina para "balança": "libra".
No entanto, alguém poderia imaginar que automaticamente eu seria acusado de "roubar" uma imagem feminina, uma vez ser Têmis uma representação em forma de mulher.
Forseti, então, me pareceu mais adequado. Um Deus da mitologia nórdica, Forseti (c) também é identificado com a justiça naqueles povos antigos e da forma que me veio à cabeça.
Filho de Balder, um Deus de paz e muito amado, tanto a ponto de ser assassinado por Loki, e Nanna, Forseti é identificado com Fosite, dos frísios, e seu domínio era resolver querelas entre homens e deuses, promovendo a reconciliação. Ouvia ambos os lados com imparcialidade e seus julgamentos eram tão justos que jamais couberam correções. Mais aqui.
Uma imagem forte... E quem sabe não criamos nós outros uma palavra? Será que soa bem me definir como forsetista? Podia virar até um movimento de homens – e de homens gays...
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