por João Marinho (joaomarinho@uol.com.br)
Ontem, 05/05, nos trending topics do Twitter, a palavra-chave #todoscrentechora chegou entre as primeiras. Com certeza, algo a ver com a #uniaohomoafetiva - e foi a deixa para muitos acusarem os gays de preconceito contra evangélicos, ou ainda, de pagarem preconceito com preconceito.
Não digo que eu seja totalmente a favor da #todoscrentechora, pois, sim, conheço evangélicos esclarecidos - minha própria família, por exemplo - que apoiaram a decisão do Supremo. Ricardo Gondim é outro, que veio a público manifestar seu apoio ainda que colocando a cara a tapa frente a seus pares. Além de que a TT em questão assassinou o português (pausa para uma pequena piada em um assunto sério).
No entanto, por outro lado, é possível entender a reação de gays, lésbicas e de héteros que os apoiam. Graças a figuras como Silas Malafaia, Marco Feliciano, Júlio Severo, Rozangela Justino e outros, fomos continuamente aviltados em um sem-número de audiências públicas na Câmara e no Senado, na internet, no rádio, na tevê.
Embora digam "amar o pecador, mas não o pecado", muito pouco se viu, na realidade, de "amor ao pecador", pois, em seus pronunciamentos, o pecador amado era o ofendido, sendo relacionado a toda sorte de práticas indesejáveis e até a crimes bárbaros, como a pedofilia. Foi tratado como "risco à família" (como se não tivéssemos família e brotássemos da terra) e daí para baixo.
Infelizmente, para quem vê de fora a realidade evangélica (ou mesmo para quem vê de dentro!), vozes similares às de Malafaia & Cia. são mais numerosas e interferem mais no público do que as do ponderado Gondim - e esse eixo do mal evangélico (sim, me aproprio da figura de linguagem de George W. Bush) é seguido por milhares, que reproduzem, sem o mínimo de reflexão, as coisas absurdas que aqueles declaram.
O último acinte foi ouvido ainda anteontem, no próprio STF, da boca de advogados católicos que nos compararam a incestuosos e polígamos. Nessa realidade, não querer que haja reação soa como um sonho dourado inatingível.
Se há tantos evangélicos - e católicos! - praticantes e esclarecidos assim, é preciso, portanto, haver um movimento de dentro. Um movimento para que assumam a tribuna e diminuam a influência e poder de pessoas como Malafaia. Afinal, respeito é bom e todo mundo gosta: mas se você desrespeita primeiro, querer que o outro respeite você em seguida "não se aplica", para adotar a expressão utilizada por Ayres Britto em seu voto - e ponhamos na balança.
O que é mais ofensivo? Um "#todoscrentechora" ou ser chamado de pedófilo e igualar nossas demandas, de casais que se uniram pelo afeto há anos e simplesmente queriam REGULARIZAR ISSO, à zoofilia, à necrofilia, ao incesto, à poligamia não-legalizada?
Peço desculpas aos evangélicos esclarecidos pelos LGBTs que tripudiaram com a vitória no STF - mas peço também que eles entendam o porquê disso e que, mais do que ofensa, considerem um chamado para lutar contra a injustiça.
Sim, pois não importa de que religião você seja, se seu Deus apoia ou não a homossexualidade, se você concorda ou não com o ser gay: se duas pessoas adultas e capazes se unem, constroem patrimônio juntas, dividem amor e responsabilidade juntas, deixá-las DESAMPARADAS legalmente é, sob quaisquer perspectivas, injustiça. E até onde sei, é ela também um pecado - e Deus tampouco se compraz de injustos. Amém.
Excelente artigo, lúcido comentário! É preciso rechaçar todo tipo de preconceito, toda e qualquer demonização do "outro" que é diferente de mim. Isso em nada contribui para a construção de uma sociedade mais justa, igualitária e fraterna. Um grande abraço! :-)
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