Ainda pensando sobre o
comportamento sexual, algumas pessoas tendem a confundir a promiscuidade com a
prostituição, obviamente, tendo, a partir de uma leitura cristã, os valores
elencados.
Essa seria uma discussão
exaustiva, caso se fosse aprofundar no mérito, entretanto, pode-se compreender
o conceito prostituição dentro da cultura cristã e, para a surpresa de muitos, é
mutável , tal conceito, dentro da própria Bíblia. Assim, muitas vezes a
prostituição é somente feminina, no caso da mulher pega em flagrante adultério,
somente a mulher é levada em julgamento; outras vezes, ela é somente uma
questão ritualística, alguém está adorando outros deuses e não Yahweh; outras
vezes, adquire um sinônimo abrangente, sendo todo aquele que vive uma vida sem
regras, desregrada, entretanto, no caso do Filho Pródigo, que vivia essa vida
dissoluta, ele não é acusado de prostituição; ainda há a prostituição cultual,
envolvendo homens e mulheres, o sexo ganha a esfera sagrada e, por ser prática
dos cananeus que rivalizavam com Israel,
assume o peso da abominação.
Há ainda o comportamento
bíblico, perfeitamente aceitável na cultura hebraica, mas que hoje seria, para os ocidentais cristãos, atos de
prostituição, por exemplo: Abraão teve
mais de uma mulher; Salomão um harém; no Novo Testamento há a recomendação
apostólica que o bispo seja esposo de apenas uma mulher, tal recomendação
revela a prática da poligamia entre os próprios cristãos como algo natural.
Como a questão é
cultural, a promiscuidade, muitas vezes levantada contra os homossexuais, é um
entendimento que não foge à esfera. Nossa sociedade foi educada, por anos, por
séculos, a primar por um comportamento “ideal”: o homem monogâmico e macho, que
se casa com uma mulher monogâmica submissa e tem filhos. Os gays não têm espaço
nessa construção de mundo, a eles resta apenas à sentença de viverem marcados
com a desonra da promiscuidade, dos encontros furtivos, à noite, nos becos,
vielas, nos guetos, contraindo todas as espécies de doenças, correndo todos os
riscos de mortes imagináveis, vivendo solitários, sem família, destruídos pelo
próprio comportamento sexual, marginal.
Obviamente, que o ser
humano é capaz de ressignificar o seu espaço, inclusive os espaços de opressão,
não sendo diferente com a comunidade homossexual que, através de alguns
pensadores ilustres e gays, assumiram o
modus vivendi , trouxeram expectativas e chocaram a sociedade conservadora,
quando declararam o orgulho de serem gays, e de viverem à moda gay.
A intensificação do
discurso da promiscuidade como pecado e a tentativa de se negar os direitos civis
aos mesmos, por exemplo, o casamento gay, são as apelações dos reforços de se deixar na
marginalidade aqueles que não se enquadram nos parâmetros heterossexuais
cristãos dessa sociedade. Ou seja, não
dar espaços iguais para que o preconceito e a segregação continuem regendo um
valor injusto. Aqui, nesse aspecto, tem-se uma questão crucial, como a
promiscuidade gay é renegada ao subcomportamento desde o século XIX, e o
orgulho gay ser uma novidade do final do século XX, a compreensão de que a
promiscuidade seja algo imundo, seja pecado, seja nefasta, é compreensão
tácita, o que faz de muitos gays, muitos deles jovens, que vivem às voltas com
o mundo, entrarem em verdadeiras crises existenciais por não compreenderem
adequadamente o papel social que desempenham e a conformidade de seus desejos e
satisfações, enquanto seres humanos.
Nestes aspectos a
promiscuidade é tão somente uma questão de leitura a quem serve o discurso e
para onde se caminha na construção da identidade gay no século XXI. Tentadora a
reflexão, que continuaremos em uma próxima oportunidade.
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