quarta-feira, 24 de agosto de 2022

HIV+ NÃO É O FIM




Estava na sala de aula, quando Jamil entrou. Seus olhos estavam marejados, como quem havia chorado muito, pálido, uma tristeza profunda vinha do seu ser e era algo quase palpável. Olhei para aquele rapaz, 25 anos, loirinho, pela macia e sedosa, 1,77m de altura, olhos azuis que mesclavam com o vermelho das lágrimas. Eram 18h33 minutos de uma terça-feira do mês de maio...

Ontem, dia 23 de agosto de 2022, concidentemente, terça-feira, estava eu na sala de aula, quando Tyler entrou. Chorava copiosamente e dizia que sua vida tinha acabado. Ele, um rapaz de 22 anos, negro, pele macia e sedosa, 180m de altura, olhos negros que mesclavam com o vermelho das lagrimas. Eram 09h da manhã...

O que esses dois fatos narrados têm em comum? Os dois rapazes em questão foram diagnosticados com o HIV+, os dois rapazes em questão perderam o chão debaixo dos pés, os dois rapazes procuraram seu professor como uma luz no fim do túnel pela vergonha, pelo desprezo, pela culpa, pelo PRECONCEITO.

Há muito dou aulas e trabalho com inúmeras pessoas durante o ano. São diversas pessoas, de diversos lugares diferentes, culturas e condição social diversas, mas o que choca é que ser HIV+ ainda, pasmem! É sinal de um estigma cruel imposto pela sociedade que nunca se educa, que nunca aprende, que nunca se esforça e apenas segue o baile como uma canoa desgovernada na correnteza.
Tyler

Aqueles rapazes choraram suas mágoas, expressaram suas revoltas, seus medos, incertezas, inseguranças. Tyler chegou dizer que envelheceria 15 anos em sua idade, enquanto eu via um rapazote de 22 anos, belíssimo, malhado, pronto para ter o mundo aos seus pés, mas que se convenceu, por ter lido não sei em que lugar, que pessoas com HIV+ são 15 anos mais velhas em suas biologias do que sua idade temporal. Eu sinceramente não sei de onde vem esses conceitos, mas sei o estrago que eles fazem em pessoas fragilizadas. Na ocasião, eu intervim dizendo que ele me parecia ter 22 anos e não 37 anos, que a expectativa de vida dele era exatamente a mesma do que os outros rapazes da turma dele! Foi quando ele sorriu...
Jamil

O Jamil dizia que todos os seus sonhos tinham ido para o lixo com o diagnóstico, que ele jamais chegaria a envelhecer e que só trouxe tristezas para sua família. Eu intervim, disse que sonhos geralmente costumam ir para o lixo quando não lutamos para concretizá-los, que ele não envelheceria caso morresse: atropelado (Deus o livre), baleado (Deus o livre), envenenado (Deus o livre), mas por ter tido um diagnóstico positivo para HIV não o mataria e sim traria qualidade de vida para ele, que pode viver normalmente como qualquer pessoa. Tristezas para a família, perguntei se ele era traficante ou assassino, ele me olhou curioso, deu um sorriso amarelo, disse não ser, então afirmei que tristezas todos temos, é normal, inclusive, mas que se a família sentisse tristeza, no sentido de desonra, ela precisaria de rever os conceitos, fazer terapia e parar de frequentar a igreja evangélica. 
Diogo

Em 2003, um grande amigo meu, Diogo, veio com o choro parecido, tinha sido diagnosticado com o HIV+, na ocasião, ele que se formara em jornalismo, dizia que não chegaria a velhice e que esteva condenado. Intervim, disse que não chegaria se ele não quisesse, mas que teria uma vida normal. Bem, 19 anos depois, ele está bem, namorando e desenvolvendo inúmeros projetos pessoais.
A vida normal

O importante saber é que: ser diagnosticado com HIV+ não é o fim, não é o começo (aliás, começo só do tratamento), não é nada, não vai modificar em nada a sua vida. Então tirando o impacto inicial, você vai tomar o remédio (que não vai curá-lo, mas também não vai deixar você morrer e nem transmitir), que irá te proporcionar uma vida saudável e duradoura até seus 120 anos (queira Deus!). No mais, as pessoas falam dos efeitos colaterais e eu pergunto: você já leu a bula do paracetamol? Você já viu os efeitos colaterais daquilo? Quantos deles você teve? Pois é, efeito colateral não é que você terá ao tomar, é que você pode ter, não é regra, é exceção.

Infelizmente, vivemos em meio a preconceitos, em que ser normal é ser perfeito e quem não é está excluído. Não é à toa que a humanidade nunca deixou de guerrear, ter mendigos, pessoa com depressão, suicidas e mazelas em geral. Os valores nobres da humanidade fazem o inferno aplaudir. 

Se você é HIV+, viva a vida normalmente, pois não há nada de errado com você. Errado é a hipocrisia social, o resto é vida!

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