Ontem, dia 04 de março, um aluno meu, do 8º período de filosofia, procurou-me com uma indagação inquietante. Confessadamente ateu, questionador e bastante esforçado em seus deveres acadêmicos, seu questionamento trazia um desconforto enorme, um apelo sôfrego, honesto e, de certa forma, justificado.
Dizia o jovem: “Renato, os cristãos são INIMIGOS do movimento gay, e de todas as expressões homossexuais, das mais despretensiosas, às organizações que militam por algum direito, por que ainda se dizer evangélico?”
Bem, não lhe falta razão para a proposição e, de fato, concordo quando o rapaz diz que os cristãos são os nossos inimigos, aliás,os nossos maiores inimigos. Contudo, não vejo, ou não vislumbro a dissociação entre a perseguição cristã e minha fé, só pelo fato dos cristãos nos perseguirem.
Há um problema clássico desde a época da Reforma: A denominação proeminente acredita, piamente, ser a DONA DAS ESCRITURAS OU DA TRADIÇÃO. E não importa qual seja a denominação.
Na Reforma, se desconsiderarmos as circunstâncias, ainda restará essa premissa- que lá se fez por elementar. Católicos e protestantes se digladiavam para estabelecer quem é que poderia ter a VERDADEIRA (poder, dominação, senhorio) interpretação das Escrituras. Hoje, as denominações em evidência reivindicam as mesmas categorias lógicas para dizer que os gays não podem ser cristãos, e o combate à militância LGBT se dá em nome da suposta verdade escriturística como símbolo desse poder e senhorio.
Ora, já nos furtaram os direitos civis em igualdade, nos subjugaram, em nome de Deus, de Jesus e das Escrituras, nos colocando à margem, como minoria degradante dos bons costumes e da moral- conceito mais do que subjetivo, nos tomaram empregos, nos tomaram a liberdade das ações, de sermos tão somente aquilo que somos, nos torturaram psicologicamente, nos elegeram ao inferno, colocando na boca de Deus um hálito que a ele não pertence, mau cheiroso e torpe, nos espancaram e mataram nossa gente. E agora, como uma ultima tentativa querem nos saquear a fé.
Bem, felizmente, o rapaz que me questionou é matriculado na disciplina filosofia da linguagem, da qual sou titular da cadeira, quando então pude reavivar em sua memória, que o símbolo só tem validade, quando nele depositamos os significados que o farão ser o que é. Assim, a fé é simbólica e cheia de significantes e significados, validade que é dada pelo sujeito que neles depositam tal condição. Desta feita, por que nós, homossexuais, deveríamos nos sujeitar a um significado que nos toma a possibilidade da esperança? Por que não ressignificar a fé, uma vez que os símbolos escriturísticos não são de exclusiva propriedade dos cristãos, e sim das tradições humanas? Por que não reavaliar o contexto histórico , trazendo a mensagem de Cristo para nós sem os preconceitos judaicos, onde o próprio Cristo fez questão de desautorizá-los? Em último, por que eu deixaria um cristão tomar a minha fé, ou dizer o que eu devo fazer com ela, uma vez que a fé é pessoal, intransferível e personalíssima?
Não vou deixar o meu inimigo cristão tomar a minha fé, simplesmente vou continuar vivenciando o que acredito, a mensagem de Jesus, pelo fato dessa mensagem ter sido vida para mim, independente daquilo que Paulo, Pedro, Afonso, Maria, Aline, Bento ou qualquer outro diga. Se Jesus não disse, não serão eles que dirão, aliás, podem até dizer, mas eu não os significo, então é o dito pelo não dito. E a graça de nosso Senhor Jesus, o amor de Deus o Pai, e a consolação do Espírito Santo continuam penetrando meu ser e revelando a verdadeira essência de Deus: O AMOR.
Sou gay, sou de Cristo!
Adorei ler esse texto. Estava agora a pouco numa crise depressiva muito grande, lembrando de todo o mal que me fizeram na igreja que frequentava e um deles foi ser agredida dentro dela. Até hoje meu agressor nunca foi punido e, geralmente, esse povo que gosta de jugar os outros têm lingua solta pra falar e o rabo preso pra punir. Obrigado pelo belo texto. Fiquem com Deus!
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