quinta-feira, 28 de julho de 2011

Ana Paula Valadão usa dinheiro publico para gravar DVD



O Ministério Público solicitará à Prefeitura explicações sobre o convênio de R$ 250 mil firmado com o instituto mineiro Fundação Oásis para divulgação do show da banda Diante do Trono, realizado em Natal. O extrato do convênio, publicado ontem no Diário Oficial do Município, define que o dinheiro foi destinado "a proporcionar a divulgação turística da Cidade do Natal, por intermédio da realização do evento". O show da banda Diante do Trono ocorreu no dia 16 de julho e reuniu, segundo cálculos da Polícia Militar, 60 mil pessoas na Praia do Meio. Durante o show, foram gravadas imagens para a edição de um DVD da banda.

Em contato com a TRIBUNA DO NORTE, um dos integrantes da Promotoria do Patrimônio Público confirmou que solicitará informações e a cópia completa do convênio firmado entre a Secretaria Municipal de Turismo e a Fundação Oásis, que é ligada à Igreja Batista de Lagoinha, a qual pertence o grupo Diante do Trono. O convênio foi assinado pelo secretário de Turismo Tertuliano Pinheiro e pelo diretor da Fundação Oásis Rodolfo Luís Aquino Hauck.

Em entrevista à imprensa local, ainda durante a gravação do DVD, a cantora Ana Paula Valadão, líder da banda Diante do Trono, negou que a apresentação tivesse patrocínio financeiro da Prefeitura do Natal. Segundo ela, o Executivo da capital potiguar havia oferecido apenas incentivos de natureza logística. "O apoio da Prefeitura e do Governo é com estrutura de segurança, banheiros, trânsito. Enfrentamos dificuldades em outras cidades para esse apoio. Aqui, não", disse a cantora.

No total, o show da banda Diante do Trono custou aos cofres públicos R$ 290 mil. Isso porque além dos R$ 250 mil repassados pela Prefeitura de Natal, o Governo do Estado gastou outros R$ 40 mil.Segundo a Assessoria de Imprensa do Governo, no Diário Oficial de hoje será publicado o convênio firmado pela Secretaria Estadual de Turismo e a Fundação Oásis, prevendo o valor de R$ 40 mil para "divulgação turística".No dia do show da banda Diante do Trono, tanto a governadora Rosalba Ciarlini quanto a prefeita Micarla de Sousa estiveram na Praia do Meio.

Na ocasião, Micarla de Sousa afirmou que, com a gravação do DVD do grupo Diante do Trono, a capital potiguar se consolidou para sediar eventos de grande porte. "Natal se consolida, cada vez mais, como um lugar, além de abençoado por Deus, propício para realização de eventos de grande porte como este, de repercussão nacional, a exemplo da Copa do Mundo de Futebol, de 2014, uma vez que a Cidade do Sol será uma das sedes", disse a prefeita.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Nem tudo que se diz inclusivo, inclui!



Estive ontem a me perguntar: por que a Acalanto fechou às portas?

Tudo começou como flores em 2003, o movimento gay impactava, chocava a sociedade, dando para mesma uma nova concepção de fé, o inclusivismo! Uma igreja surgia, graças à mídia, que a divulgava, não por sua proposta teológica, mas pelo escândalo que tal possibilidade aferia a si mesma.

E aí, o primeiro erro... A empolgação de alguns evangélicos, desejos em se afiliar, não possibilitou o refletir da proposta teológica que essas “novas igrejas” traziam para sociedade, e, de fato, aquilo que começou como flores: murchou; o sonho de poucos se tornou, em pouco tempo, o pesadelo de muitos...

A Igreja Acalanto é o exemplo vivo dessa desorganização conceitual, não obstante o carro chefe, imposto pela mídia, que fechou às portas devido ao fanatismo fundamentalista de sua liderança.

Construíram uma igreja, que em tese, deveria ser inclusiva, mas, que na prática, era apenas uma reprodutora do gueto denominacional ultraconservador; reproduzia conceitos estigmatizastes, opressores e, às vezes, até mais cruéis do que às igrejas tradicionalmente reconhecidas. Seus líderes, pasmem! Vinham de uma ruptura teológica, de identidade, sem precedentes: do pentecostalismo radical, assembleiano, ao metodismo histórico e tradicional, pós-reformado. Tais igrejas se constituíam num movimento histriônico, disforme e, com uma doutrina suspeita, onde seus líderes usavam (e usam) os púlpitos para condenar às práticas promiscuas dos fiéis (uso e costumes) e, às noites, eram vistos em guetos da famosa “pegação” gay.

Isso foi um reflexo por onde caminha o discurso de muitas igrejas que se dizem inclusivas: na crise de identidade pessoal dos seus líderes, da falta de amadurecimento humano, do histrionismo de papéis representados em identidades falaciosas. Não obstante, o discurso bíblico radical, digo, a idolatria pela bíblia, muitas vezes, torna-se o único “porto seguro” para as pessoas que nessas comunidades se afiliam, contudo, sem um remédio que possa, de fato, combater a doença; apenas um paliativo.

Óbvio que outras igrejas surgiram, até antes, como precursor o Rev. Neemias Marien, mas que não deu ibope à mídia, pois não se submeteu ao sensacionalismo barato, devido sua proposta séria em tratar do assunto. Por esse fato, o Rev. Márcio Retamero, amigo querido a quem muito estimo, trata das igrejas inclusivas, hoje, dividindo bem a proposta em ser igreja que se tem gays, e ser uma igreja que inclui os gays.

Mas, o fato é, tem muito pastor por aí, extremamente reacionário, com problemas psicológicos profundos que só querem ser reconhecidos como líderes, ou pastorear um rebanho, como forma de punir sua revolta e complexo de inferioridade na homossexualidade alheia, projetando nos outros, como um espelho, suas frustrações interiores. E então vocês devem se questionar, vale a pena, de fato, seguir determinados líderes só por que dizem algumas coisas com um ar de retórica e verdade sem questioná-los?

Nem tudo que se diz inclusivo, inclui!

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Eis o mistério da fé! (2)




Pedi a Cindy para reproduzir um belíssimo texto que ela escreveu, em diálogo com o post aqui: Eis o mistério da fé, mas, quero fazer melhor:

ESTOU RECOMENDADO A VOCÊ LEITOR DO GOSPEL LGBT QUE CLIQUE AQUI NO LINK PARA TER ACESSO A ESSE FANTÁSTICO PENSAMENTO DA CINDY, NO SITE A CAPA! Gente, vale a pena, de fato, porque ficou show!

domingo, 24 de julho de 2011

Eis o mistério da fé!


Interessantíssimo como os blogs cristãos se silenciaram em relação ao massacre da Noruega. Aliás, interessante nada, CONVENIENTE MESMO! Pouco tempo atrás, em um debate contra a ala conservadora, dita não fundamentalista, mas tão fundamentalista quanto os que se declaram, diziam a mim que os cristãos são pacíficos e que não pregam a violência; numa clara amnésia histórica, eles apagaram as inquisições católicas e protestantes; retiraram Hitler e a Segunda Guerra mundial de cena; esquecerem-se de Bush pai e filho, na empreitada “santa”, metodista, no Iraque; dos grupos terroristas cristãos (católicos e protestantes) na Irlanda do Norte, dentre outros fatos.

Óbvio, e não estranho, pelo menos a mim, que para se advogar uma passividade cristã em relação ao mundo, nós teríamos que nos esquecer, sinicamente, em prol de manipular os fatos, toda a HISTÓRIA CRISTÃ (afinal quando se trata de cristãos, nem os cristãos homossexuais passivos, são passivos! Pelo contrário, tem muita biba que fica macho no momento de defender a igreja e o fundamentalismo). E quem assim procede tem um intuito claro, específico, obsessivo, a defesa da “Bíbria”: o mau-hálito de Deus, a Palavra de Deus.

O que na oportunidade, não posso fugir do fato dos próprios cristãos, aqui no Brasil, no massacre de Realengo, virem com a historinha do: “toma que o filho é teu meu senhor!”. Numa tentativa, desesperada, de jogarem para os islâmicos a responsabilidade pelo fanatismo religioso, que consumou na morte de doze crianças numa escola no Rio de Janeiro. Tudo para não vincular a agressividade fundamentada na fé cristã do rapaz aos próprios cristãos, que durante anos o bombardearam com conceitos esquizofrênicos, paradoxais, bipartidos de uma realidade física e outra espiritual, em choque, em luta pelas almas pecadoras. Óbvio, que na primeira oportunidade a Igreja tentou se livrar do efeito vinculador, etnocentricamente, jogando para o Islã à agressividade da ação. Até que descobriram que o garoto acreditava na ressurreição dos mortos, mensagem EXCLUSIVAMENTE cristã, e inegável! O que houve? Um silêncio profundo da cristandade, que começou desviar o assunto e pensar sobre outros temas, menos comprometedores.

Assim, o massacre da Noruega foi provocado POR UM CRISTÃO FUNDAMENTALISTA, que em nome de Deus, do Cristo, da “Bíbria” o mau-hálito de Deus, a Palavra de Deus e da fé, abriu em fogo em uma ação que consumou a vida de dezenas de pessoas, dizem, até o momento, mais de 90 vítimas e feriu outras 97.

Assim quero destacar a reportagem do SÍTIO IG, nas seguintes partes:

“... O autor do duplo atentado na Noruega, Anders Behring Breivik, que qualificou seu ato de "cruel, mas necessário", colocou na internet um manifesto de 1,5 mil páginas conclamando à violência contra muçulmanos e comunistas. O longo documento intitulado "2083 - Uma Declaração Europeia de Independência", postado em inglês no dia do atentado duplo, afirmou que a elite europeia, "os multiculturalistas" e os "enaltecedores da islamização" seriam punidos por seus "atos de traição". O texto também declara a "guerra de sangue" contra os imigrantes muçulmanos e os marxistas.

O manifesto está assinado como Andrew Berwick.O uso de um pseudônimo anglicano poderia ser explicado por uma passagem no manifesto descrevendo a fundação, em abril de 2002 em Londres, de um grupo chamado de Cavalheiros do Templo - uma ordem medieval fundada para proteger os peregrinos cristão na Terra Santa depois da Primeira Cruzada.

O norueguês é ligado a grupos ultradireitistas, fundamentalistas cristãos e islamófobicos. A polícia e o advogado disseram que Breivik, de 32 anos, confessou ser autor dos dois atentados, mas rejeitou responsabilidade criminal pelo dia que chocou a pacífica Noruega e representou o mais mortal para o país desde a Segunda Guerra Mundial. Ele foi acusado de terrorismo e deve ser indiciado na segunda-feira.

Segundo Lippestad, conhecido por ter defendido famosos neonazistas, Breivik disse ter como motivação para os ataques o desejo de causar uma revolução na sociedade norueguesa. "Ele queria uma mudança na sociedade e, sob sua perspectiva, precisava forçar isso por meio de uma revolução", afirmou. "Ele queria atacar a sociedade e sua estrutura."

EIS O MISTÉRIO DA FÉ!

sexta-feira, 22 de julho de 2011

II Coríntios 9,7


MENSAGEM BÍBLICA DO DIA:

Deus ama ao que dá com alegria (II Co 9,7)




Homossexualidade Feminina: embates e desafios de assumir-se lésbica



1. INTRODUÇÃO

Por: Conceição Alves*

O presente trabalho tem como objetivo identificar quais os embates e desafios de assumir-se lésbica numa sociedade hegemonicamente heterossexual e patriarcal. Bem como estudar as conseqüências da publicização do amor entre mulheres, de que forma a visibilidade desse amor pode acarretar reações socais homofóbicas e quais são as práticas homofóbicas mais freqüentes nesta sociedade.

A sexualidade humana tem sua gênese firmada na história da humanidade. Segundo Góis (1991, p.119) “somos educadas por mulheres, numa sociedade onde a virilidade e o prestígio do macho estão longe de serem apagados”. A mesma, ainda afirma que as mulheres são educadas para agirem como filhas e mães sem passarem pelo estágio de mulher, tornando-se assim, alvo da sociedade heterossexista.

As mulheres foram sendo criadas com base numa sociedade heterossexual e patriarcal, que nada mais é que um modo de estruturação e organização da vida coletiva baseado no poder de um pai, ou seja, o que prevalecem são as relações masculinas sobre as femininas; onde o poder dos homens são mais fortes que os das mulheres.

Didaticamente podemos dizer que a sociedade patriarcal teve início na Grécia Antiga, onde a mulher era basicamente objeto de satisfação masculina. Segundo Góis (1991), a mulher quando criança é obrigada a ter bons modos e controle sobre as suas vontades, pois aquelas que não possuem esse dote são afastadas. Na adolescência, as mulheres não são preparadas para a vida, mas sim para negarem aquilo que é próprio delas, o prazer humano, tornando-se alguém que é cheia de culpa, censura e medo. Nesta fase, as questões sobre sexo acabam gerando constrangimentos e são respondidas de maneira incompleta, já que são ignoradas.

O autor Diamantino (1993) é de opinião que a mulher brasileira desde muito cedo, ou melhor, desde que nasce é educada ‘para dentro’, ou seja, é criada para servir, para ser obediente, casar, respeitar seu marido, ter filhos, ser dona de casa, expor-se a um trabalho exaustivo, sem folgas ou reconhecimento. E desta forma, vive, sem condições alguma de lhe ser proporcionado o prazer. Para ela, a sexualidade “refere-se ao impulso e à emoção que a proximidade do sexo pode produzir, transcende definições físicas e se coloca como algo mais difuso permeando todos os momentos da vida” (Diamantino 1993, p. 1154).

Como uma das variantes da sexualidade humana surge a Homossexualidade, que nada mais é que a atração física e sentimental entre pessoas do mesmo sexo. O termo homossexualidade deriva do grego homos, que significa "semelhante", "igual"; e foi criado em 1869 pelo escritor e jornalista austro-húngaro Karl-Maria Kertbeny.

Historiadores afirmam que, embora o termo seja recente, a homossexualidade existe desde os primórdios da humanidade tendo havido diversas formas de abordar a questão.

Para se ter uma idéia, registros arqueológicos mais antigos apontam para 1.200 a.C., na Era Paleolítica, onde algumas pinturas de caverna retratavam a atividade sexual da época. Elas foram encontrados na caverna de Gorge d'Enfer em Dordonha na França, e desde então, se tem indícios de que haviam relações homossexuais entre os povos. (MOTT, 2003)

Nos últimos anos houve, no Brasil e na América Latina, um crescente interesse por estudos sobre a homossexualidade, tanto masculina quanto feminina. Paralelamente a isto, percebe-se uma multiplicação significante de movimentos homossexuais no Brasil, os chamados LGBT . A temática lésbica, alvo de nosso estudo, nem sempre teve espaço, e por isto mesmo, é que adentramos no assunto, uma vez que este tema surgiu fundamentalmente das nossas inquietações teóricas no decorrer da formação acadêmica, pois são vários os problemas que esse grupo de mulheres vem passando ao longo dos anos.

O surgimento de novas formas de elaboração para identidades sexuais não é uma novidade na sociedade brasileira, foram observadas mudanças nas três últimas décadas e constatou-se uma acelerada modernização na área dos costumes, fazendo surgir novos códigos relativos à sexualidade em geral, e a homossexualidade em particular. A propagação da homossexualidade demonstra uma fragilização da hegemonia do modelo tradicional, que guiado por uma oposição de gênero e fundado numa lógica significativa da atividade homossexual como sendo anormal, passa a admitir para esse grupo uma classificação estigmatizante. (FRY, 1982).

A classificação de anormalidade que os homossexuais receberam ao longo dos anos, desenvolve uma forma de preconceito estabelecido pelos heterossexuais, onde, os homossexuais passam a ser vistos como pecaminosos, desenvolvendo, assim, a homofobia. Este termo deriva das palavras gregas homo (semelhante; igual) e fobia (medo). Ao juntá-las, o psicólogo clínico norte-americano George Weinberg (1972) utiliza-o como conceito que designa o complexo emocional, que no seu entender é a fonte do medo de amar e/ou relacionar-se afetiva ou socialmente com alguém do mesmo sexo.

O vocábulo homofobia constitui um neologismo, ou seja, é um vocábulo novo, embora tenha sido desenvolvido por muitos na antiguidade. Este vocábulo procura representar o ato de repulsa aos homossexuais e às suas práticas tanto afetivas quanto sexuais. A aversão nem sempre é direta, mas é perceptível através de chacotas, expressões de nojo, por meio de agressões verbais como xingamentos, desqualificação; ou ainda por meio de violências físicas como espancamentos e assassinatos. (MOTT, 2003)

Atualmente, pode-se compreender homofobia como uma série de atitudes e ações revestidas de intolerância à homossexualidade, materializada através do nojo, gestos obscenos, agressões verbais e físicas. Assim, pode-se conceituar homofobia como o ato de repulsa e intolerância contra homossexuais. Tal sentimento tem sua gênese, muito forte nos valores judaico-cristãos, que supervaloriza a figura masculina em detrimento da feminina, esta última sendo considerada frágil e indefesa.

Dentro disto, encontram-se as lésbicas, que já sendo uma minoria, acaba por sofrer preconceitos exacerbantes em relação à sua orientação sexual. Elas são ainda praticamente invisíveis na sociedade, pois assumir sua condição significa expôr-se às violências diversas. Ao longo da história sabemos que existiram mulheres lésbicas que, por sua orientação sexual, permaneceram ou ainda permanecem invisíveis.

O termo “Lésbica” surgiu originalmente na Antigüidade, entre os século VI e VII a.C., e referia-se somente às habitantes da ilha de Lesbos, na Grécia. Nesta época, morava naquela ilha a poetisa Safo, admirada por seus poemas sobre amor e beleza, em sua maioria dirigidos às mulheres. Ela nasceu na ilha de Lesbos, provavelmente por volta de meados do século VII a.C. Por esta razão, o relacionamento amoroso entre mulheres passou a ser conhecido como lesbianismo ou safismo. A poetisa Safo parece ter deixado Lesbos em conseqüência de perturbações políticas na ilha, em relação ao amor entre ela e as mulheres. Muitos termos foram usados para descrever o amor entre mulheres nos últimos dois séculos, entre os quais: amor lesbicus, urningismo, safismo, tribadismo, dentre outros. Entre os mais variados termos, muitos foram criados como formas pejorativas, como sapatão, popocha, maria-homem, etc. Estes, no entanto, aumentam a possibilidade de se praticar aquilo que chamamos de homofobia. (OLIVEIRA, 2005).

A questão da visibilidade da mulher é muito complexa, e falar em visibilidade lésbica, foco principal do nosso trabalho, pior ainda; já que as lésbicas exercem e discutem a sua sexualidade à margem da sociedade, repleta de discriminação, sociedade esta que não lhe dá o devido espaço, o qual lhe pertence. Segundo Swain (2000) houve uma política de esquecimento e de silêncio sobre a multiplicidade das relações humanas que acabaram excluindo as mulheres dos demais, pois essa exclusão se deu não só socialmente, como sexualmente. Mott (2003) acrescenta ainda que o tabu do silêncio insiste em abafar a voz e a visibilidade dos homossexuais como se eles mesmos não tivessem uma história passada a resgatar, um presente para viver com dignidade e um futuro melhor a reivindicar.

O processo de visibilidade das mulheres traz consigo a necessidade social de uma melhor análise dos discursos e das práticas em todos os níveis. Segundo o psicólogo Paulo Bonança (2007), membro da Sociedade Brasileira de Estudos da Sexualidade Humana (Sbrash), a luta dos movimentos que reivindicam a visibilidade da mulher lésbica enfrenta hoje uma dupla batalha: uma frente à sociedade patriarcal, determinista, estruturalista, centrada na figura da dona de casa submissa ao esposo, mãe dedicada, despojada de autonomia econômica e liderança social.

A outra dificuldade dessas mulheres - que lutam por seus direitos ao amor e ao afeto - é encontrar apoio e solidariedade junto a outros grupos que lutam por direitos semelhantes, ou seja, buscar apoio aqueles que carregam a mesma bandeira colorida do arco-íris como símbolo de unidade e diversidade, para que assim, possam combater o preconceito de forma justa. Mas a dificuldade se encontra justamente no fato de que não é encontrado o apoio necessário dos grupos, com isso, essas mulheres lutam de forma solitária, ou seja, sem o devido apoio de outros grupos mais sólidos

Diante disto, foi escolhida, para desenvolvimento do trabalho, a pesquisa de caráter exploratório e descritivo, pelo fato de apresentar a descrição do fenômeno e posteriormente compreendê-lo numa dada realidade. A técnica de coleta de dados foi o roteiro de entrevistas de cunho qualitativo, já que esta não se define por números, mas sim por abranger experiências humanas e dar-lhes significados, além de permitir uma visão dos indivíduos, associada ao estilo de vida e valores de cada sujeito. Segundo Gelain (1991, p. 61) "a pesquisa qualitativa identifica as características, os significados das experiências humanas que são descritas pelos sujeitos e interpretadas pelo pesquisador em vários níveis de abstração".

Adotamos o Enfoque Fenomenológico, que de acordo com Forguieri:

"(...) é aquele que abarca o existir humano em sua totalidade, abrangendo a tristeza e a alegria, a angústia e a tranqüilidade, a raiva e o amor, a vida e a morte como pólos que se articulam numa única estrutura, e cuja vivência dá a cada um dos extremos, aparentemente opostos, o seu real significado". (FORGUIERI; 1990, p.8)

Para a autora, este enfoque vê o homem como um ser no mundo, que vivencia o tempo presente, relacionando este às experiências passadas e o que espera do futuro. Assim, optamos por uma amostra de dez mulheres, as quais foram abordadas em boates LGBT, como a Clone Mix Bar, e em lugares pré-determinados para a realização da entrevista. Esta abordagem se desenvolveu através de redes de contatos, ou seja, algumas pessoas íam indicando quais lugares deveríamos freqüentar para encontrar as mulheres que precisávamos a fim de realizar as entrevistas. Em primeira instância, determinamos o local a ser realizada as entrevistas, após isto, era o momento de abordar fisicamente essas mulheres, objeto de nosso estudo. Perguntávamos primeiramente qual era a sua orientação sexual, uma vez que o local também era freqüentado por heterossexuais, e após a resposta das mesmas, apresentávamos e explicávamos o nosso trabalho que estava sendo desenvolvido. No início foi desafiador, pois algumas mulheres que abordamos não preenchiam o perfil que procurávamos, ou seja, não eram lésbicas; além de que muitas lésbicas que abordamos, se recusavam a dar a entrevista que precisávamos.

Para análise dos dados cruzamos as mais variadas respostas que nos foram concedidas através da entrevista e pudemos identificar quais os desafios e enfrentamentos do assumir-se lésbica numa sociedade hegemonicamente heterossexual e patriarcal, além de conhecer de que forma o processo de publicização afeta a vida dessas mulheres. Quanto à construção do TCC, este compreende-se em dois capítulos. O primeiro, intitulado de Sexualidade, Lesbianismo e Feminismo, faz um histórico acerca da sexualidade e homossexualidade feminina. Além disso, este mesmo capítulo caracteriza o feminismo e faz uma relação do mesmo com o lesbianismo. Já o segundo capítulo, Os desafios e enfrentamentos do assumir-se lésbica, traz toda a análise dos dados coletados nas entrevistas, relatando quais foram esses desafios no que diz respeito a sua aceitação enquanto lésbica e a aceitação dos outros em relação a sua orientação sexual.

Em suma, esperamos que esta pesquisa seja uma forma de sensibilizar as pessoas para que possam de alguma forma, respeitar a orientação sexual das lésbicas. Esperamos também que preconceitos e tabus enraizados na história possam ser quebrados de forma que venham a garantir uma maior liberdade de expressão das pessoas tidas como anormais, ou seja, desse grupo de mulheres que nada mais são do que seres humanos merecedoras de respeito, com suas particularidades e singularidades. Continue lendo ►

    2. SEXUALIDADE, LESBIANISMO E FEMINISMO.

    2.1. Sexualidade Feminina no Brasil

    O cotidiano e a sexualidade feminina entre os séculos XVI e XVII, época do descobrimento, é analisada a partir de relatos de viajantes que observaram a cultura daquela época. Assim, eles observaram as mulheres que ali habitavam a terra brasileira por volta de 1.500 e encontraram uma população indígena. A cultura indígena foi descrita a partir do paradigma teológico e do princípio de que os brancos eram os eleitos de Deus, e por isso eram superiores a esses povos. (Raminelli apud Del Priore, 2008)

    Para entender os comportamentos sexuais das primeiras mulheres que habitavam o Brasil, aqui conhecidas como Índias Tupinambás, faremos pequenos relatos desde o nascimento da mulher até a fase adulta. Uma mulher grávida na aldeia era motivo de alegria, porém, essas mesmas mulheres chamadas de puruabore, não deixavam de exercer suas atividades normalmente, a realizavam até o momento do parto, que, aliás, nesse momento, não procuravam um leito para isso, elas simplesmente, se sentavam e comunicavam às outras que daria à luz. Após o parto, a mulher continuava realizando suas tarefas, e era o marido que ficava de resguardo em uma cama e era tratado como se tivesse sido ele que teria dado à luz.

    O nascimento de um tupinambá contava com a presença de todas as mulheres da tribo, ou seja, o parto ocorria na presença de todas elas. O pai participava do parto apenas nos momentos complicados e para cortar o cordão umbilical dos meninos, pois o cordão das meninas era cortado por uma mulher. A mãe dava os primeiros cuidados às meninas nascidas, já que os meninos eram primeiro cuidados pelos pais. Essas mães, porém, possuíam uma grande fragilidade materna, ou seja, o amor maternal e a preservação da família pouco representavam para aquelas mulheres da comunidade nativa. RAMINELLI (apud Del Priore, 2008)

    As meninas atingiam a idade adulta após a primeira menstruação. Esse momento era representado por um ritual relacionado à sua sexualidade que provocava temor entre as jovens. Antes da cerimônia, seus cabelos eram cortados rente à cabeça com alguns instrumentos cortantes ou fogo. Depois, as moças subiam numa pedra e os índios faziam incisões em seu corpo por completo com dentes de animais, e neste instante, seu corpo ficava ensangüentado. Ainda assim, os índios esfregavam-lhe substâncias com capacidade corrosiva semelhante à pólvora e ao salitre. Essas marcas deixadas em seus corpos ficavam pelo resto de suas vidas. Esse ritual tinha a intenção de mostrar que agora eram mulheres e dar às futuras mães um ventre sadio e filhos bem formados, uma vez que a figura feminina era relacionada à procriação.

    Após esse ritual, eram dadas às jovens algumas restrições como permanecer em uma rede de dormir por três dias sem alimentação alguma. Ao término desse prazo, voltavam à pedra e sofriam novos cortes. Após essa segunda etapa do ritual, retornavam à rede e se alimentavam apenas de farinha e raízes cozidas e bebiam apenas água. Assim eram mantidas até o momento do segundo fluxo menstrual e passavam pelo mesmo ritual. Para alívio das jovens, nas demais menstruações guardavam as mesmas proibições, mas o ritual já não era mais realizado. O primeiro fluxo menstrual de uma jovem era motivo de festa, já que a mesma estava entrando no mundo adulto e, em breve, poderia se casar e ter filhos. Mas esse casamento só ocorria depois que seus cabelos voltassem ao comprimento normal. (RAMINELLI, apud Del Priore, 2008)

    A virgindade da moça era marcada por um fio branco de algodão que as envolvia, mas após o primeiro ato sexual esse fio era rompido. O primeiro ato sexual nem sempre ocorria após o casamento, pois os índios não se preocupavam em manter uma jovem virgem, tudo era mais voltado para as mulheres após o casamento. Por isso, as jovens podiam ter vários parceiros antes de seu casamento, mas após este acontecimento, elas só poderiam ter um único marido, e se o traíssem, poderia até ser morta. (RAMINELLI, apud Del Priore, 2008)

    Como os homens, as mulheres andavam nuas e tiravam todos os pêlos que cresciam sobre a pele, inclusive pestanas e sobrancelhas. Elas tinham um grande apreço pelos cabelos, que lavavam, penteavam e faziam minuciosas tranças com fios de algodão. Diferente dos homens, elas não furavam os lábios nem as faces, mas furavam as orelhas e penduravam conchas.

    Alguns europeus da época relacionavam a nudez das índias com a luxúria, mas, segundo Raminelli (apud Del Priore, 2008, p. 11), as índias, apesar de sua nudez, “(...) não possuíam gestos, palavras ou atos ofensivos ao olhar (...)”, isso ocorria porque as mulheres agiam naturalmente. Por conta disto, os europeus acreditavam existir entre os índios perversões sexuais, pois segundo os relatos dos europeus, os índios eram possuidores de pecados nefandos.

    Para os europeus, as índias cometiam desvios contra a ordem natural, uma vez que algumas delas abandonavam as funções ditas femininas da aldeia e passavam a imitar os homens. Elas cortavam os cabelos como os homens e iam à guerra com seus arcos e flechas. Além disso, elas possuíam uma outra mulher para serví-las, desenvolvendo condutas de marido e mulher, uma vez que se diziam casadas.

    As mulheres em 1590 eram desprovidas de afeto, já que os homens eram tidos como superiores, fazendo com que as mesmas não compartilhassem da vida em sociedade com maior tranqüilidade. Segundo Araújo (apud Del Priore, 2008), as mulheres eram tão vigiadas que só havia três ocasiões em que a mulher poderia sair do lar: para se batizar, para se casar e para ser enterrada.

    Na época do Brasil colonial temos a figura da Igreja exercendo uma forte pressão sobre a mulher, pois havia certo estereótipo em relação a elas. Aqui, o objetivo era abafar a sexualidade feminina, pois a mulher era uma ameaça aos padrões locais da época. Segundo os preceitos religiosos, o homem era superior à mulher e com isso, tinha o livre direito de exercer fortemente sua autoridade. A tirania dos pais era muito presente, pois existia uma cultura de adestramento da sexualidade feminina, que tinha como objetivo, o pleno respeito ao pai e ao marido, além de uma educação rígida com direção exclusiva aos afazeres domésticos. Esse tipo de aprendizado era bem diferente do dirigido aos meninos, já que, de forma geral, as mulheres eram direcionadas ao casamento, tendo como ensinamento a sedução, o encanto. ARAÚJO (apud Del Priore, 2008)

    Assim, os pais afastavam suas filhas do convívio com os rapazes para garantir que as mesmas pudessem seguir para o casamento, cuja cerimônia era arranjada pelo próprio pai. A idéia principal era que as meninas de doze anos de idade estavam em um bom tempo para casar, por isso que desde muito cedo a mulher tinha seus sentimentos abafados, retraídos.

    Com todos esses desejos e sensações reprimidos, vinha, mais cedo ou mais tarde, o casamento. Agora, essa mesma mulher que sempre foi regulada, recebe um homem bem mais velho , como seu marido. Apesar de casada, a mulher não deixava de ser regulada pela Igreja, uma vez que esta pregava o não erotismo, o controle da carne, pois o ato sexual não era para o prazer, mas sim para a procriação.

    A Igreja também prezava pela sexualidade feminina, por este motivo, tinha a responsabilidade, através da religião, de reprimir esta sexualidade. Uma vez que, no confessionário, as mulheres eram instruídas para que não cometessem pecados. Ela vigiava os gestos femininos, os atos e até os sonhos através de perguntas objetivas no confessionário.

    A única forma que as mulheres tinham de demonstrar sua sexualidade era através de suas roupas. O vestuário era a melhor e preferida forma de ser notada. Havia diferenças na qualidade do tecido entre as mulheres, pois, era o tecido quem definia a classe social a qual pertencia as mulheres. As ricas, usavam sedas, veludos, ouros, além de seus penteados exuberantes. Já as mais pobres, usavam saia de chita, algodão, xales, etc. Assim, elas se apresentavam bonitas e faceiras com seus trajes para as outras. (Araújo, apud Del Priore, 2008)

    Nesta época, a pretensão era justamente, controlar a sexualidade feminina das mais variadas formas. Desta forma, ou as mulheres se submetiam aos padrões misóginos impostos, ou então, elas reagiam com o exercício da sedução e da transgressão. Uma das maneiras que essas mulheres encontravam para violar, agredir e se defender dos padrões estava justamente em se refugiar no amor de outra mulher. (Araújo, apud Del Priore, 2008)

    As mulheres casavam cedo, e com isso sua sexualidade era despertada cedo, por isso, era comum que, enquanto o casamento não chegava, as meninas praticavam-na como podiam. Desta forma, cerca da metade das mulheres acusadas de homossexualidade à Inquisição no Brasil, confessaram ter cometido o tal 'pecado' muito jovem, entre os 7 e 15 anos de idade. Muitas, apesar de casadas, continuaram a ter relações sexuais com as mais variadas parceiras. (ARAÚJO, apud Del Priore, 2008)

    A homossexualidade era condenada com muita severidade, mas algumas mulheres não se amedrontavam. Na primeira visita ao Brasil em 1590, o Santo Ofício da Inquisição assinalou para 29 mulheres que, ou praticavam atos homossexuais esporádicos, ou assumiram a transgressão. A sexualidade feminina registrada nos documentos da Inquisição não era tão perceptível e as descrições dos atos sexuais neles contidos trazem uma forte marca de jargões do tipo 'beijos e abraços' ou ainda, 'ficavam uma sobre a outra, como se fosse macho sobre fêmea'. Nesta última percebemos com nitidez a projeção do modelo de cópula heterossexual julgado natural pelos teólogos. (VAINFAS, apud Del Priore, 2008)

    Essa homossexualidade se tornava cada vez mais presente quando a reclusão feminina era praticada com severidade. Assim, aumentavam os contatos entre as mulheres, uma vez que frequentemente ocorriam visitas, proporcionando assim, uma troca de confidências e experiências e uma maior compreensão umas com as outras. Segundo relatos da época, essas mulheres não tinham o interesse em tornar públicas suas ligações amorosas, já que tudo se passava em círculos de amizade e muitas vezes nem era preciso sair de casa, pois aproveitava-se a hierarquia e a intimidade em que conviviam senhoras e escravas.

    Era nos conventos em que não acreditavam existir a manifestação da sexualidade feminina, pois teoricamente, as mulheres se recolhiam lá por espontânea vontade e renunciavam os prazeres sensuais. Mas nem sempre a escolha pela clausura ocorria pelas mulheres, na maioria das vezes, o pai era quem decidia. isso porque ele acreditava que desta forma poderiam salvar a alma da família e ganhariam um maior status social.

    Agora enclausuradas, ainda meninas de dez anos, pensava-se que a vida conventual, com sua disciplina, seu ambiente, sua rotina, levaria as mulheres à piedade e ao recato próprios de sua condição. O problema era que freiras à força, muitas jovens continuavam a se comportar como se estivessem em casa, rodeadas de escravas realizando seus desejos, uma vez que na clausura também haviam escravas. A própria cela, que devia ser despojada de confortos, reproduzia ou até amplificava o luxo e o bem-estar da vida doméstica anterior, encontrando-se ali, cortinas, pias de cristal, espelhos, porcelanas, esculturas, perfumes, bancos com franjas de seda ou de ouro, móveis caros, tetos com relevos ou pinturas. ARAÚJO (apud Del Priore, 2008)

    No convento, essas jovens, agora freiras, aproveitavam a distância da família para extravasar toda a sexualidade reprimida em casa. O dia a dia no convento levava à excitação dos sentidos, pois essas jovens vivam num extremo luxo, com vestuários belos, atraindo os olhares masculinos quando apareciam fora do convento. Apesar da clausura, as mulheres não deixavam de possuir relações amorosas com os homens. E mais ainda, passavam a ter relações com as amigas com quem dividiam o ambiente do convento. Mesmo aquelas que mantinham relações com outros homens, não deixavam de realizar seus desejos amorosos, através de carinhos, carícias e atos sexuais umas com as outras, dividindo suas emoções. Vale ressaltar que isso não acontecia com todas as freiras. ARAÚJO (apud Del Priore, 2008)

    Seja como for, o certo é que as relações homoeróticas entre as mulheres, quase não eram perceptíveis. E não é improvável que elas mesmas tenham contribuído para este obscuramento da sua própria sexualidade.


    2.2. Homossexualidade Feminina

    É muito difícil determinar o momento exato do surgimento da primeira relação homossexual feminina no mundo de forma mais geral. A relação homossexual é tão antiga quanto a humanidade, e alguns registros tendem a datar para além de cinco séculos antes de Cristo. Mas, através de alguns documentos históricos, faremos neste capítulo, uma relação acerca da evolução do lesbianismo na história.

    A começar com o primeiro registro , temos o Código de Hammurabi, datado de 1770 a.C e, segundo Bouzon (1992), é o mais antigo e conhecido corpo legal. Criado por Hammurabi foi baseado em antigas leis semitas e sumerianas. Neste documento existe a figura de SALZIKRUM , que caracteriza uma “mulher-homem”, que segundo a história, podia ter uma ou mais esposas.

    Segundo a poeta, historiadora e pesquisadora da cultura homossexual, Judy Grahn (apud Godoy, 1997), o primeiro texto poético foi criado por uma mulher chamada Enheduanna. Ela, que era filha do rei Sárgon I de Acádia, compunha, em 2.300 a.C, para Inanna, considerada a deusa do amor. Enheduanna exaltava a beleza de sua deusa e se referia a ela como esposa.

    Segundo Mott (2003), em algumas comunidades antigas, como da Albânia, foram aceitas relações lésbicas no passado. Tomemos como exemplo as zonas montanhosas de Cabira, onde existiu uma sociedade aborígine composta apenas de mulheres, chamada de SBRAIE. Na China, essa relação homossexual também foi encontrada. Segundo historiadores, havia mulheres que intergesticulavam como marido e mulher, uma relação chamada de DIUSHI. Em Roma havia os chamados ‘banhos públicos’ para mulheres, que era uma simples forma de as mulheres satisfazerem seus desejos sexuais femininos. Até mesmo as mulheres casadas com homens não deixavam de ir aos banhos pois era lá que se realizavam alguns desejos lésbicos incumbidos. (RICHARDS, 2003)

    Segundo o autor Richards (1993), na Grécia antiga as relações homossexuais supriam a necessidade de relações pessoais de uma intensidade não encontrada no casamento. As mulheres, por terem sido consideradas como inferiores intelectualmente, fisicamente e emocionalmente em relação aos homens, eram excluídas das reuniões e encontros masculinos, obrigando-as a formarem entre si, um grupo para tratar dos mais variados assuntos. Desta forma, eram compartilhadas, umas com as outras, experiências sexuais, onde fazia permanecer entre elas o desejo pelo mesmo sexo.

    Na Idade Média há poucos documentos em relação ao lesbianismo praticado nesta época. Mas, analisando os pouco existentes, pode-se fazer uma análise da relação com que a homossexualidade era tratada. Partimos de uma época onde o sexo era permitido entre homossexuais e adentramos em uma em que é visto como condenável crime hediondo. Era desta forma que o sexo entre essas pessoas era visto.

    Neste período a Igreja mantinha o seu maior poder e o Cristianismo exercia grande influência no ocidente, fazendo uso da idéia de que o prazer deveria ser extinto. Nesta época, a Igreja desenvolveu uma caça contra os homossexuais, pois pregava que ‘Deus fez o homem para a mulher e a mulher para o homem’. Por conta dessa busca, centenas de lésbicas foram queimadas como bruxas e os homossexuais em geral foram usados como “lenha” para as fogueiras purificadoras da santa igreja. (ARAÚJO, apud Del Priore, 2008)

    Neste momento, na Idade Média, ainda não se usava o termo ‘homossexualismo’, este, no entanto, só surge a partir do século XIX, e era erroneamente vinculado a uma doença, a qual merecia tratamento. Essa concepção de doença vigorou até os anos 80, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1996 tira o homossexualismo da lista de doenças. Essa medida se deu, justamente por conta dos movimentos homossexuais internacionais que despontavam no mundo.

    A Idade Média foi o período em que a sexualidade passou a ser excessivamente controlada, já que se tinha o sexo como algo sujo, pecaminoso, repulsivo diante do sagrado. O clero mantinha uma postura de aversão as atividades homossexuais, pois seguia os preceitos de que o sexo só poderia ser feito se fosse para procriação, caso contrário, deveria ser passível a pena de morte. Em contrapartida, o clero era quem mais sofria com as acusações de que mantinha relações homossexuais nos mosteiros, uma vez que os monges mantinham esse tipo de relação com os rapazes. As penas para esse tipo de atividade variavam a depender do status social do praticante. As penas dos monges geralmente eram mais leves, mas quem não tivesse um bom status eram condenados a morte, como queimados vivos na fogueira, enforcado, castrado, dentre outros.(ARAÚJO, apud Del Priore, 2008)

    Adentrando a Idade Moderna, século XV, não é perceptível mudanças em relação às formas de tratamentos com os homossexuais, uma vez que as torturas e crueldades ainda permaneciam para aqueles que contrariassem a lei.

    Com relação à Idade Contemporânea, século XVIII, algumas mudanças bastante perceptíveis irão ocorrer. A sexualidade humana passa a ser vista como doença e o desejo pelo mesmo sexo passa a ser mais observado. No século XIX foram surgindo algumas teorias que explicavam a homossexualidade como doença, desvio patológico, deixando prevalecer o conceito de heterossexualidade como sendo um padrão lícito e normal da sexualidade.

    No século XX, a visibilidade das diversas orientações sexuais começou a aumentar, principalmente a partir dos anos sessenta, quando houve um incremento dos movimentos tendentes a mudar a conceituação individual e social das relações homoafetivas.

    Esses movimentos homossexuais surgiram na Europa, com o propósito de repensar a identidade homossexual, de lutar contra o preconceito social contra a homossexualidade e o reconhecimento dos seus direitos civis.

    Foi neste mesmo século, mais especificamente em 1960, que os movimentos passaram a aparecer de forma mais efetiva, tornando as reivindicações mais audaciosas. Nessa época, a primeira organização lésbica era bem pequena, pois muitas mulheres preferiam não participar de nenhum movimento, muitas tinham receio de entrar em algum movimento e serem descobertas como homossexuais e sofrerem discriminação em seu convívio social. No entanto, com o desentendimento das homossexuais femininas com os masculinos dentro de alguns grupos, impulsionou para que muitas dessas homossexuais resolvessem fazer seu próprio grupo. Então a partir desse embrião, vários grupos ativos foram formados.

    2.3. O Feminismo e o Lesbianismo

    O Feminismo é o movimento social que defende a igualdade de direitos entre homens e mulheres em todos os campos. Ele teve origem no ano de 1848, na convenção dos direitos da mulher em Nova Iorque e adquire cunho reivindicatório por conta das grandes revoluções. O feminismo surgiu, principalmente, no contexto das idéias transformadoras da Revolução Francesa, a qual tinha como lema Igualdade, Liberdade e Fraternidade. Esta idéia era reivindicada pelas feministas, porque elas acreditavam que os direitos sociais e políticos adquiridos a partir das revoluções deveriam se estender também a elas enquanto cidadãs, e não apenas aos homens. (ALAMBERT, 1986)

    É exatamente na Revolução Industrial, no final do século XVIII e início do XIX, que o movimento feminista se fortifica, pois é neste momento que a mulher passa a assumir postos de trabalho e a ser explorada, uma vez que esta assume uma tripla jornada de trabalho, dentro e fora do lar.

    “No século XIX, grandes mudanças ocorreram na vida das mulheres. Com a consolidação do capitalismo, elas entraram em massa na produção, junto com seus filhos, como mão de obra barata (...), principalmente nos grandes centros têxteis, que ocupavam o maior número de mulheres.” (ALAMBERT; 1986, p.11)

    A situação da mulher aparece como parte das relações de exploração na sociedade de classes. Assim, o movimento feminista reaparece e se fortifica aliando-se aos movimentos operários e a alguns partidos de esquerda, já que as mulheres encontravam espaço para as reivindicações. A partir de então, os movimentos feministas passaram a ficar intimamente ligado aos movimentos políticos, buscando ampliar as idéias liberais.

    Na década de 1960 os movimentos feministas se influenciaram com a publicação do livro “O Segundo Sexo” de Simone de Behavoir, pois a mesma diz que “[...] a hierarquização dos sexos é uma construção social e não uma questão biológica.” (BEHAVOIR, 1970)

    No Brasil o movimento feminista sofreu influências européias e norte-americanas onde o sufragismo obteve, como uma repercussão mundial, o direito de votar. Neste momento, as mulheres saíram às ruas reivindicando seus direitos de cidadã. Apesar disso, em alguns lugares da América Latina, existia na Constituição a proibição do voto feminino, uma vez que as mulheres eram consideradas seres inferiores, insignificantes, onde a supremacia masculina prevalecia e somente aos homens era dado o título de cidadão. (PINTO, 2003)

    Durante décadas as mulheres foram dominadas pela Igreja e pelo Estado que determinava o certo e o errado, sendo eles os responsáveis por tomar decisões sem se quer dar o direito às mulheres de participação nas decisões.

    Na busca pela sua identidade, a mulher vem lutar pela auto afirmação enquanto cidadã que possui direitos, mesmo estes indo de encontro a uma sociedade patriarcal que resume o papel da mulher a simplesmente, dona de casa, mãe e esposa. Junto ao movimento feminista, que tinha como lema igualdade entre homens e mulheres, as reivindicações se davam também na busca do direito ao voto, incluindo o direito à educação e à equiparação salarial. O movimento feminista brasileiro teve como sua principal líder a bióloga e zoóloga Berta Lutz, que fundou, em 1922, a ‘Federação Brasileira pelo Progresso Feminino’. Essa organização tinha entre suas reivindicações o direito de voto, o de escolha de domicílio e o de trabalho, independentemente da autorização do marido. (PINTO, 2003)

    No final do século XIX e início do século XX, as mulheres começam a ter um lugar na sociedade, aparecem as primeiras romancistas, cantoras e os primeiros jornais editados por mulheres. Neste momento, as mulheres reivindicavam também o direito à saúde, ao pré-natal, ao planejamento familiar e ao prazer sexual.

    Mas, qual a relação do movimento feminista com o lesbianismo? Como já foi citado anteriormente, o movimento feminista tinha a sexualidade como seu tema central, ou seja, ele tinha como meta a conquista da igualdade de direitos entre homens e mulheres, garantindo a participação da mulher na sociedade de forma equivalente à dos homens.

    Segundo Borges (apud Alambert, 1986) o lugar da sexualidade é tratado pelo feminismo como “(...) um lugar de desconstrução de idéias, práticas sociais, regras, imagens (...)”, apontando para a necessidade de conceber a sexualidade como uma construção e não simplesmente como um fenômeno biológico.

    A palavra lesbianismo surgiu no século XIX ligado a patologia cujo objetivo era estudar as perversões sexuais da época praticada por mulheres. No Brasil, em 1894, essa palavra também teve sentido de inversão sexual, justamente neste aspecto, como sendo algo pejorativo, ligado a doença. (SWAIN, 2000)

    Por este motivo, só a partir dos anos 70 é que o movimento feminista passou a dar um novo significado e uma nova definição acerca do lesbianismo. Uma vez que este até a época possuía uma imagem altamente deformada, cercada de preconceitos, onde era visto pelos médicos como doença, limitando assim, seu acesso ao movimento.

    Assim, juntamente com o despontar do movimento homossexual, as lésbicas trouxeram poderosas teorias que buscavam explicitar seus direitos. É neste momento que as mulheres lésbicas, antes escondidas, encontram no movimento feminista dos anos 70 as interpretações necessárias para se definir enquanto grupo com legitimidade própria. Embora, o movimento feminista, como todo movimento social, seja composto por várias tendências, sua trajetória tem sido marcada por aproximações e silenciamentos no que tange a sexualidade lésbica. (PINTO, 2003)

    Nos anos 80 o lesbianismo, juntamente com o movimento feminista, aparece interrogando a categoria “gênero”, buscando resposta para o que viria a ser o natural que era tão defendido pelos heterossexuais da época. E é justamente através da sexualidade que as lésbicas buscam a centralização da dominação e da libertação, pois é com esta que se constrói a personalidade. Foi com o movimento feminista que a construção da mulher enquanto sujeito tornou-se possível, desta forma, essas mulheres buscam sua capacidade de agir livremente.

    É pelo fato de essa experiência ser tão forte que as lésbicas lutam por um reconhecimento legal, através de reivindicações de direito, lutando por uma participação maior na política, deixando para trás o a imposição de mulher enquanto ser submisso ao homem. Esse reconhecimento de liberdade é uma luta de difícil afirmação, pois a imagem que sempre foi criada da mulher é alguém que possui papéis femininos a cumprir, sendo assim, o seu lado natural, justificando que a natureza define o papel de cada um na sociedade.

    3. OS DESAFIOS E ENFRENTAMENTOS DO ASSUMIR-SE LÉSBICA

    3.1 A aceitação de si mesma

    A descoberta do desejo homossexual é o que define a homossexualidade. (FERRARI, 2007). Filosoficamente, o desejo é uma tensão em direção a um fim, considerado pela pessoa que deseja como uma fonte de satisfação. Uma vez que se deseja e se pratica este desejo podemos afirmar que isto se torna algo positivo, bom, belo e justo. Esta descoberta pelo desejo tem se tornado cada vez mais natural numa sociedade onde os valores estão cada vez mais íntimos, sendo este, o elemento principal para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária com respeito às diversidades.
    Segundo 60% das entrevistadas, em relação à pergunta 'Como você se descobriu tendo desejo por mulheres?', a descoberta do desejo se deu de forma natural, já que essa descoberta parte do princípio da intimidade de cada uma. As mulheres defendem seus desejos como interior, uma vez que o desejo “é um movimento interno erótico impulsionado por uma carga de atração física e emocional” (FERRARI, 2007)

    “Naturalmente, algo biológico, através do desejo físico, emotivo.”(informação verbal)

    “Natural, porque era uma coisa que eu percebia que ia acontecer comigo.”(informação verbal)

    A naturalidade com que é encarada essa descoberta do desejo por mulheres ocorre pelo fato das entrevistadas possuírem idade inferior aos 25 anos, pois a partir da década de 80 houve maiores informações acerca da homossexualidade, acarretando uma quebra de tabus existentes em uma sociedade machista. Segundo Jackson (apud Soares, 2007), a sexualidade tem sido uma área com maior debate teórico nos últimos anos, refletindo diretamente na descoberta e aceitação enquanto lésbica por parte daqueles mais jovens.

    A naturalidade com que é relatada pelas entrevistadas, é algo que tem servido como justificativa para uma então diversidade de atos e valores questionados na atualidade. Assim, o desejo torna-se cada vez mais importante na construção de uma identidade sexual, uma vez que essa identidade é uma construção social estabelecida a partir de uma discussão acerca do saber e do poder. Em suma, o desejo é posto como uma definição da homossexualidade. (FERRARI, 2007)

    Em contrapartida, no decorrer das entrevistas, 10% das mulheres admitiu ter sido extremamente difícil se descobrir tendo desejos por mulheres. As mesmas afirmaram que não viram, em momento algum, normalidade em relação a este sentimento.

    “Muito difícil, eu me apaixonei pela minha professora, um processo complicado, de difícil aceitação, desejo, vontade, sem saber o que fazer e em que mundo estar, o porquê daquilo está acontecendo, “você” vive numa sociedade machista, “você” é criada pra isso. Nesse momento eu era noiva, e pra mim as coisas se confundiam, os sentimentos se confundiam e eu achava que eu não era normal”. (informação verbal)

    De acordo com este relato, podemos perceber uma influência dos valores da sociedade machista, colocando a heterossexualidade em primeiro plano e dentro dos padrões normais. A idade dessas entrevistadas varia entre 25 e 30 anos, nos alertando para uma possível socialização pautada num discurso machista, onde a homossexualidade é vista como conduta errônea. Portanto, para essas mulheres, aceitar o fato de sentir desejos por outras mulheres, requer uma quebra nos valores pré-estabelecidos numa sociedade guiada estritamente pela heterossexualidade.

    Embora a descoberta do desejo por mulheres tenha se dado de forma comum para as 90% das entrevistadas, desse total, quando perguntamos como foi a aceitação enquanto lésbica, 33% afirmou ter sido muito mais difícil a sua aceitação enquanto lésbica. Isso se dá por conta da não afirmação de sua identidade enquanto homossexual, uma vez que a partir desta, é que se constroem valores, condutas e julgamentos em relação a si mesmas e perante a sociedade. Isto se evidencia na fala da mesma entrevistada para as duas perguntas, como se descobriu tendo desejo por mulheres e como foi a sua aceitação enquanto lésbica, respectivamente.

    “Natural, porque era uma coisa que eu percebia que ia acontecer comigo”. (informação verbal)

    “Extremamente difícil, porque a pior coisa é você se assumir, assumir pra os outros é muito banal, agora pra você mesmo é altamente complicado”. (informação verbal)

    Para se aceitar enquanto lésbica, é necessário se defender enquanto tal, para que elas existam primeiramente para e por elas mesmas (TOURAINE, 2007). Trata-se de defender a aceitação de sua orientação sexual, aonde seus desejos e condutas venham a colocá-las diante delas mesmas com o olhar daquilo que elas realmente são e não com o olhar daquilo que querem que elas sejam.

    A identificação com o termo lésbica não está presente para 30% das entrevistadas, pois segundo as mesmas, trata-se de um termo pejorativo. “o termo lésbica é carregado de negatividade, isto leva a mulheres a sufocarem suas emoções diante do espectro da anormalidade, do pecado, da monstruosidade”. (GARCIA; 2004, P.68).

    Segundo Fry e McRae (1984) é preciso deixar de julgar as mulheres por conta do seu comportamento sexual e sim levar em conta suas identidades totais. Com isso, os autores atentam que ao invés de usar o termo “lésbica,” seria melhor chamá-las apenas de “mulheres identificadas com mulheres”.

    As entrevistadas afirmam também que o termo lésbica presume apenas rótulos. E esses rótulos, segundo Swain (2000) servem para categorizar a identidade sexual, pois as práticas sexuais não podem ser consideradas como único fundamento de uma identidade.
    “Eu acho que são rótulos, simplesmente rótulos”.(informação verbal)

    “Pra mim é indiferente, ‘lésbica’, ‘sapatão’, ‘trantantã’, ‘tontontá’, o que vale pra mim é o que eu sinto o que vem do outro lado é indiferente, o que vale pra mim é o que eu escolhi pra ser em minha vida, o resto é besteira”. (informação verbal)

    Outros 50% das entrevistadas afirma que se identificam com o termo, isso se dá porque as mulheres ao se identificarem com o termo lésbica, como caracterização da sua orientação sexual buscam a criação de um “mundo” que as definam enquanto sujeito. Dessa forma, segundo Touraine (2007), as mulheres têm uma imagem positiva delas mesma, onde tem como objetivo o desenvolvimento pessoal e uma participação ativa enquanto sujeito que compõe uma sociedade.

    “Sim... afinal é a definição de mulher homo e se sou então encaro numa tranqüilidade comum, sou acima de tudo uma GRANDE MULHER... uma mulher lésbica”. (informação verbal)

    Apenas 10% das entrevistadas acha indiferente no que diz respeito à nomenclatura. Para elas, não é o termo que vai definir a sua identidade.


    3.2 A aceitação dos outros

    Das entrevistadas 20% volta a reafirmar que o maior desafio é a auto-aceitação. São notórias as dificuldades enfrentadas pelas lésbicas ao ter se assumido, pois entre as entrevistadas 80% delas sofre rejeição, principalmente familiar. Isso decorre da educação familiar que é uma das que mais contribui para a produção e reprodução do preconceito, já que eles têm a crença que a sexualidade humana é biológica.

    Portanto, para a maioria dos familiares é como se tudo que se é humano se aprende com a cultura, na cultura, como cultura, em uma concepção naturalizante da cultura. E todo e qualquer movimento que seja estranho a isso se torne “anormal”.

    Então se pode afirmar que essa rejeição familiar que as entrevistadas sofrem ocorre devido a uma reprodução de preconceitos, tornando-se um circulo vicioso. Nota-se também nas falas a presença da religiosidade que julga a homossexualidade como algo “pecaminoso”.

    Esse tipo de discriminação não só vem do seio familiar, mas também do ambiente amigável, onde também existem pessoas criadas de forma preconceituosa, enfim é uma reprodução que atinge toda uma sociedade.

    “Desprezo familiar por parte da maioria”. (informação verbal)

    “Primeiro me aceitar, depois que eu me aceitei, eu passei a entender que a opção sexual independe de pessoa, de cor e o segundo preconceito é a família, é complicado, repito, agente nasceu numa sociedade machista, então até você ter o respeito da sua família, é um caminho longo, mas quando ele vem é muito gratificante”. (informação verbal)

    Para Souza (apud Lago, 2004), pais e filhos são vitimas de uma educação conservadora, orientada para a reprodução da ordem social, em que a sexualidade é também orientada no sentido de não variar do estabelecido, funcionando como metáfora do esforço global da ordem no sentido dela própria não variar. Pai e filho sofrem sem saber pelo que estão sofrendo: vitimas de uma ordem que necessita de preconceitos para se perpetuar, brigam, se insultam, se machucam, sofrem, adoecem, morrem pela sujeição a convenções que se fixam e se legitimam, dentre outras formas, também pela via do preconceito.

    Entre as entrevistadas, 60% afirmam encontrar limitações na sua vivencia em ser lésbica. Dessa porcentagem 40% volta a reafirmar que a sua maior limitação é a questão do preconceito e o desprezo existente na sociedade. A restante fala sobre a falta de liberdade de se relacionar com suas parceiras da mesma forma que os casais heterossexuais agem, o que não deixa de ser um preconceito que a sociedade transparece. Portanto para elas, não poder andar de mãos dadas, trocar carícias em público, falar de maneira espontânea sobre seu dia-a-dia, torna-se cada vez mais, uma limitação na sua convivência enquanto lésbica, pois o que essas mulheres realmente queriam era ter mais liberdade.

    “Não poder ser e agir como eu quero. Andar de mãos dadas com minha parceira... assim, são pequenas coisas que fazem diferença.” (informação verbal)

    Martinho (apud Lago, 2004) afirma que a visibilidade lésbica é uma estratégia de combate ao preconceito, ela afirma que muitos dos mitos existentes sobre as mulheres que amam mulheres advêm do fato que a sociedade não a conhece porque elas permanecem escondidas, “invisíveis”, temerosas dos efeitos da discriminação em suas vidas.

    Para Machado e Prado (2008, p. 67), “é mister assumir que o processo de visibilidade como resposta, ainda que insuficiente, é fundamental para desconstruir e ressignificar atribuições sociais construídas historicamente no campo da religião, da ciência e da moral acerca da homossexualidade”.

    Já para 40% das entrevistadas afirma não sofrer nenhum tipo de limitação e para justificar usam a independência financeira.

    “Ser independente, é a maior, porque quando você é independente ninguém pode falar de você.” (informação verbal)

    Quando perguntamos às entrevistadas quais as mudanças ocorridas na vida delas após terem se assumido lésbicas, 10% delas afirmam que não houve diferença alguma. Outras 90% afirmaram que provocou profundas mudanças, tanto positivamente, quanto negativamente. Desse total (90%) 88% acredita que essa mudança se deu de forma positiva, pois obtiveram felicidade e realização pessoal.

    Segundo Ferrari (2007), aceitar a sua orientação sexual e poder publicizá-la adquire um sentido de libertação dos controles, antes aprisionados, causando, necessariamente, uma sensação de felicidade, mesmo que não se vivencie essa felicidade, pelo menos há uma real expectativa dela. Dessa forma, a aceitação serve para uma maior afirmação da sua felicidade enquanto lésbica, uma vez que os sujeitos encontram em sua vivência, maior possibilidade de realizar-se enquanto ser social. Essa felicidade está associada à busca de uma auto-afirmação, pois a expressão “sair do armário”, citada por uma das entrevistadas, designa justamente a oportunidade de uma vivência mais feliz e realizada, pois estar fora do armário significa a não ocultação da sua orientação sexual.

    “Tudo, do olhar até o ato. Me senti muito melhor depois que me assumi.” (informação verbal)

    “Muita coisa, para melhor, ter saído do armário foi muito bom para meu ego, eu sei e diante de toda comunidade(...)” (informação verbal)

    Já a mudança de forma negativa (12%) se deu através de preconceitos antes não sofridos por elas, uma vez que não tornou público sua sexualidade. A sociedade moderna é detentora do controle, por meio de repressão, assim, o preconceito acaba gerando uma relação de inferiorização social em relação às lésbicas. Segundo Machado e Prado (2008), esse preconceito, no âmbito da homossexualidade, produz uma invisibilidade de certas identidades sexuadas, garantindo uma subalternidade de alguns direitos sociais e, por sua vez, legitimando práticas de inferiorizações sociais, como a homofobia.

    3.3. Desafios e enfrentamentos durante o processo de publicização de sua orientação sexual

    O prazer, mencionado por 50% das entrevistadas quando perguntamos o que sentiu ao se descobrir lésbica, é o sentimento de libertação dos seus desejos incumbidos. Esse prazer esta associado à forma com que sempre foi tratada a questão das lésbicas, pois agora, aceita enquanto tal, a mulher tende a manifestar o sentimento de liberdade, uma vez que precisou aprisioná-lo no seu interior.

    O sentimento de prazer está associados à idéia de felicidade, pois nada melhor do que afirmar para si mesma a idéia de ser lésbica, já que, uma vez definida como tal, pode construir sua real imagem enquanto homossexual, sem negar seus próprios valores. (TOURAINE, 2007)

    “Prazer, porque eu queria que isso acontecesse na minha vida”.(informação verbal)

    “Prazer”. (informação verbal)

    “Uma coisa mágica, inexplicável (...)”. (informação verbal)

    Embora este sentimento de prazer prevaleça entre as entrevistadas, outras 40% declarou ter sentido medo. Este, por sua vez, acontece por conta do novo momento em que estão vivenciando, pois isso se reduz ao sentimento de medo, vergonha de ser diferente, já que se trata de um mundo até então, desconhecido. Segundo Storr (1967) as lésbicas demonstram um sentimento de medo, quando se trata da sua sexualidade. Além de que a própria palavra lésbica designa e constrói todo um campo de representações negativas perante os outros (SWAIM, 2000).

    “Medo, vergonha, pensava porque isso está acontecendo comigo, o que é que eu tenho de diferente, um monte de emoções, que eu não sei nem explicar”. (informação verbal)

    “Medo, não imaginava aquilo acontecendo comigo”. (informação verbal)

    O sentimento de medo relatado pelas entrevistadas também está associado aos preceitos religiosos, pois admitem terem tido, desde muito pequena, orientações acerca da religiosidade e sua condenação diante da homossexualidade. Quando instaurado no Brasil em 1536, o Santo Ofício tinha como objetivo, perseguir e punir aqueles que praticassem atos sexuais com pessoas do mesmo sexo, pois isto era considerado um pecado nefando (Vainfas apud Del Priori, 2008). Assim, de lá para cá, o catolicismo passou a incorporar em seu discurso a idéia de que Deus, como ser superior, abominava a homossexualidade, fazendo com que aqueles que a praticassem, fossem impiedosamente, castigados de alguma forma. Muitos religiosos acreditam que o primeiro “castigo divino” contra os homossexuais tenha vindo na década de 80 através da AIDS. Essa idéia de castigo foi mencionada por algumas entrevistadas:

    “(...) eu achei que ia pro inferno, me senti culpada, sei lá.” (informação verbal)

    “Que ia pro inferno. Aff, foi triste, pensei que ia ser castigada por Deus, e sei que o que estou fazendo aqui, algum dia vou pagar, mais na frente(...).” (informação verbal)

    As outras 10% entrevistadas, relatou ter possuído um duplo sentimento, envolvendo prazer e medo. Isso, segundo Soares (2007) se dá por conta da dualidade existente entre sentimentos que são indefinidos e incertos, onde de um lado, existe um momento prazeroso, felicidade em relação a si; e do outro, o medo, a abominação, já que se trata de novas formas de agir e pensar. Essas incertezas acoplam-se ao “novo” para uma melhor forma de viver e se relacionar, pois esse momento é cercado de sufocamentos emocionais, tornando-se uma interferência na formação de sua identidade.

    “(...) uma mistura de sentimentos, alegria junto com culpa, medo de estar errando...” (informação verbal)

    Observa-se que 60% das entrevistadas procurou algum tipo de ajuda para assumir-se lésbica (mães, amigos, psicólogos), para desabafar nesta construção de uma nova identidade. Já que a sociedade determina padrões na construção de uma família e de um relacionamento, o papel de manter e reproduzir o modelo heterossexual. A mulher é reprimida por sentir desejo por pessoas do mesmo sexo que vai de encontro com os padrões que a sociedade impõe.

    A construção de si pelas mulheres é fundada sobre aquilo que resiste á sua identidade social, esta é sobre sua natureza que não se reduz a uma cultura ou a uma organização social. É assim que as mulheres vão se erguendo ate chegar à afirmação da singularidade e a liberdade de escolher sua própria vida, definida por sua oposição a toda definição imposta de fora (Touraine, 2007, pg. 47).

    Assumir-se lésbica não é uma tarefa fácil, uma vez que implica em várias questões como preconceitos, indiferença dos amigos, parentes e até a rejeição da família. As famílias educam as mulheres para serem donas de casa, esposas, mães. Em uma sociedade patriarcal e machista a construção da identidade da mulher que se assume lésbica é muito difícil, elas são massificadas por sentirem desejos e atração sexual por outras mulheres.

    “Não, a ajuda que eu procurei, foram os amigos que não eram próximos, porque não compactuavam do mesmo momento, pessoas que eu fui conhecendo que tinham a mesma opção e que podiam me dizer algum coisa daquilo que eu estava vivendo, mas em momento nenhum eu conseguir compartilhar isso com os meus amigos que eu dizia ser verdadeiros e que eu vivi e convivi a vida inteira e por isso você se prende num mundo sem respostas, de perguntas simplesmente vazias, o porquê isso está acontecendo comigo? porque eu sou assim? Será que eu não tenho solução? Será que não é um momento passageiro? Mas não passa! É um desejo e você vai à busca do seu desejo e descobre que o sentimento e o amor pela pessoa independem de sexo e aí eu passei a me aceitar, a viver.” (informação verbal)

    Mas 40% das entrevistadas não acha necessário procurar ajuda para assumir-se lésbica.

    “Eu?! De forma alguma. Não precisaria de alguém pra assumir minha própria identidade.”(informação verbal)

    Entre todas as entrevistadas, 70% afirma não ser necessário que os outros saibam que elas são lésbicas, já que para elas sua orientação sexual não interfere na sua personalidade, ela não deixa de ser “fulana” porque se relacionou com outra pessoa do mesmo sexo, portanto o termo lésbica acaba tornando-se para elas simplesmente rótulos, algo pejorativo. Vale ressaltar que mesmo não sendo necessário que outros saibam da sua preferência sexual, elas não veem nenhum problema em assumir, caso sejam perguntadas.

    “Não, não. Eu não gosto de rótulos, e acredito que rótulo não faz ninguém crescer, lésbica é um termo muito pesado e acredito que o sentimento é muito maior que isso, eu não compartilho com essa dedução das pessoas, eu acho e continuo dizendo que sexo não tem rótulos.” (informação verbal)

    Essa postura se dá justamente para que sua orientação sexual não venha a interferir no seu convívio social. Para Costa (1982), uma vez que identificada como homossexual o sujeito dificilmente consegue proteger sua privacidade sexual do espaço público, pelo simples fato se ser sempre interpelado em nome de sua preferência erótica, como se sua pessoa se resumisse à singularidade de sua inclinação erótica.

    Em contrapartida 20% das lésbicas entrevistadas acredita ser necessário que os outros tomem conhecimento de sua orientação sexual, para que desta forma, questões como a homossexualidade, tantas vezes massificada, ganhe visibilidade perante a sociedade. Acreditam também que desta forma possam adquirir respeito.

    “Talvez por questões de empoderamento de visibilidade, é necessário sim que a sociedade saiba sim para enfrentamento ao preconceito”.(informação verbal)

    Esse posicionamento de tornar a homossexualidade visível é a tentativa de quebrar as idéias preconcebidas da população sobre as mulheres lésbicas e de deixar de ser refém das culpas e vergonhas sem sentido que a sociedade impõe.

    Das entrevistadas apenas 10% teve uma postura diferente das outras, pois para elas é como se a questão de se assumir não interferisse na sua vida, nem negativamente, nem positivamente.

    3.4. Práticas homofóbicas mais freqüentes como conseqüência da publicização
    Quando falamos de violência, a primeira imagem que nos vem à cabeça é a da agressão física ou sexual. No entanto, os homossexuais sofrem as mais diferentes formas de violência, desde as mais sutis como a ironia até as mais graves como o espancamento, estupro e homicídio, resultando em lesões corporais, traumas psicológicos e morte.
    A agressão, seja ela verbal e psicológica ou física, é decorrente do preconceito social existente numa sociedade marcada pela heterossexualidade. Dentro dessa realidade 60% das entrevistadas assumiram ter sofrido agressão, já 40% afirmam não ter sofrido nenhum tipo de agressão.

    A agressão mais freqüente é a verbal, uma vez que ocorrem através de xingamentos, chacotas com palavras pejorativas como: “sapatão”, “bresca”, “popocha”, entre outras.
    “Sim. Agressões verbais como ‘Sapatão’, ‘Maria-homem’ e assim vai”.(informação verbal)

    O preconceito social produz uma invisibilidade de algumas identidades sexuais, provocando várias práticas de inferiorização, como a homofobia. Segundo Machado e Prado (2008), a homofobia representa o ato de repulsa aos homossexuais e às suas práticas (afetivas ou sexuais). Aversão nem sempre direta, mas perceptível através de chacotas, expressões de nojo, por meio de agressões verbais (xingamentos, desqualificação), ou ainda por meio de violências físicas (espancamentos e assassinatos).

    Isso se dá segundo Prado e Machado (2008) pelo fato de que a agressão é vista como um sofrimento advindo de uma relação de violência, onde sustenta e mantém formas de inferiorizarão, permitindo uma subalternidade desse grupo em relação às outras classes sexuais ditas “normais”. Dessa forma estamos diante de uma conseqüência daquilo que chamamos de homofobia, que é a exclusão dos homossexuais.

    3.5. Considerações Acerca da Entrevista

    A descoberta do desejo como definidor da homossexualidade é algo presente na fala das entrevistadas, uma vez que admitem que ocorreu de forma natural. Em contrapartida, essa normalidade não está presente quando se trata da aceitação de si mesma enquanto lésbica. Já que, segundo elas, a afirmação da sua orientação sexual é de extrema dificuldade, uma vez que esta atitude confronta seus valores, condutas e princípios subjetivos.

    Na medida em que se assumem lésbicas, essas mulheres afirmam possuir um sentimento de prazer relacionando-o com a felicidade, sendo este o momento em que elas alcançam sua liberdade enquanto sujeito homossexual, diante de uma sociedade marcada pela heterossexualidade.

    A necessidade da procura de ajuda para se assumir lésbica está presente na fala das entrevistadas. Vale ressaltar que essa ajuda não se dá apenas de forma profissional, mas também através de familiares e amigos, pois elas encontram nestes uma forma de compartilhar seus medos e angústias.

    O fato de se assumir lésbica não determina a necessidade de os outros saberem qual a orientação sexual do sujeito. Pois, as entrevistadas afirmam que essa atitude não vai interferir no seu convívio social. Apesar dessa afirmação, essas mulheres, agora assumidas, encontram no seu dia-a-dia a rejeição, principalmente familiar, como seu principal desafio.

    Apesar desses desafios, profundas mudanças de forma positiva ocorrem, em se tratando de realização pessoal. Elas afirmam se sentirem mais felizes após a decisão de se assumirem.

    Embora a falta de liberdade em se relacionar publicamente com suas parceiras ainda seja um limitação encontrada na vivência da lésbica, pois expressar-se naturalmente torna-se muito difícil numa sociedade onde os homossexuais ainda são alvos de preconceitos, assumir-se continua sendo uma forma de quebrar preconceitos e adquirir espaço de livre expressão.

    Portanto, para elas a identificação com o termo lésbica torna-se necessário por conta da legitimação desse grupo perante a sociedade e uma maneira de dizer “eu sou gente, eu existo”.

    Em contrapartida essa exposição acarreta em agressões, verbal, física e psicológica, desencadeando numa forma de preconceito social – a homofobia.

    4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Considerando o objetivo principal desta pesquisa, que foi estudar os embates e desafios de se assumir lésbica, percebemos que a sociedade ainda tem a heterossexualidade como algo normal e a homossexualidade, principalmente feminina, como anormalidade, aberração. Desta forma, as mulheres homossexuais têm em seu dia-a-dia inúmeras dificuldades no que se diz respeito a convivência social.

    No decorrer da pesquisa, percebemos que o feminismo teve uma grande contribuição em termos de conquista dos direitos das mulheres, pois podemos observar que as mulheres, tanto heterossexuais quanto homossexuais, vêm conquistando espaços sociais antes considerados exclusivamente masculinos. Mas apesar dessas conquistas, ainda se tem muito a conquistar no que se diz respeito às mulheres homossexuais.

    Ao longo do estudo, sentimos a necessidade de introjetar na pesquisa a questão da independência financeira, uma vez que não era ponto de nossa análise. Isso se deu, necessariamente porque percebemos que as respostas das entrevistadas iam se diferenciando a depender da situação financeira em que as mesmas se encontravam. Diante disto, percebemos que as mulheres que possuíam independência financeira, não sentiam tantas dificuldades em se assumir quanto aquelas que dependiam financeiramente de outrem.

    Estas dificuldades encontravam-se justamente no fato de que a sociedade, de maneira mais geral, ainda não havia quebrado algumas barreiras construídas ao longo dos anos. Com isso, a cobrança dos familiares e da sociedade tornava-se cada vez maior quando se tratava da publicização daquelas lésbicas que eram dependentes financeiramente.

    Outra questão que merece destaque é a idade, que antes não analisada, passa a ser ponto de divergências em relação as respostas, por este motivo, decidimos dividir o grupo de lésbicas em dois: aquelas que possuem idade entre os 19 e 27 anos, e aquelas que têm idade entre os 28 e 35 anos. Desta forma, pudemos perceber que aquelas que pertenciam ao primeiro grupo não sentiam tanta dificuldade em se aceitar lésbica, enquanto as do segundo grupo, essa questão de aceitação se tornou alvo de maior dificuldade.

    Isso se dá porque aquelas mulheres que possuem idade entre 19 e 27 anos vivenciam uma época em que viver novas experiências sexuais se tornou cada vez mais normal entre os mais jovens, pois este é o momento de experimentar.

    Já aquelas com idade entre 28 e 35 anos, no momento de descoberta enquanto lésbica aprenderam que a heterossexualidade era o normal, sendo a homossexualidade um pecado. Por este motivo, muitas delas mencionaram o fato de que ao se olhar no espelho, sentiram anormalidade em si mesma. Essa anormalidade foi introjetada por uma sociedade hegemonicamente heterossexual e patriarcal.

    Pudemos perceber também, que os dogmas religiosos ainda estão presentes em muita das entrevistadas, tornando-se assim, um embate no que se diz respeito a aceitação de si mesma. Essas mulheres, com bases religiosas, acreditam que a homossexualidade é um pecado e o que elas estão vivenciando aqui, futuramente irá ser punida por isso. Essa idéia de punição, segundo Araújo (apud Del Priore, 2008) teve início no final do século XVI, quando o Santo Ofício de Inquisição fez a primeira visita ao Brasil e começou a punir aquelas mulheres que praticassem atividades sexuais com outras. A partir daí, essas idéias de punição passou a ser utilizada pela Igreja como forma de fazer com que seus seguidores fosse da forma que ela queria que eles fossem, e não como eles eram por si mesmos.

    Outra questão de bastante relevância na pesquisa é o fato de as lésbicas não acharem ser necessário que os outros saibam sobre sua homossexualidade, pois o se assumir publicamente é um processo complicado, já que o preconceito ainda é muito forte na sociedade. Existe uma grande pressão para que os homossexuais assumam publicamente sua homossexualidade, mas, muitos afirmam que nem todos precisam assumir para os outros sua condição sexual. Diante disto, apontamos que o não se assumir publicamente, não significa negar a sua homossexualidade, e sim, vontade de resguardar sua individualidade.

    O desejo de resguardar a individualidade se dá porque as lésbicas ainda são altamente discriminadas, motivo de chacota, de xingamentos, enfim, são alvo de preconceitos, de atitudes homofóbicas. Estas se dão, na maioria das vezes, por agressão verbal através de xingamentos. Essa, portanto, é uma das grandes barreiras que as lésbicas encontram para se realizar afetivamente, são os preconceitos que a sociedade nutre contra essa forma de orientação sexual.

    Em suma, através desta pesquisa, pudemos perceber que a homossexualidade feminina, que durante anos foi reprimida e vista como uma doença vem atualmente ganhando espaço nas mais diversas áreas de estudo, embora isto não signifique que a questão da homossexualidade feminina passe a ser vivenciada sem preconceitos. Para o combate a essas atitudes, é necessário que além de ser aqui, um objeto de estudo, passe a ser lá fora, uma forma de ação para que esse grupo de mulheres tenha um maior espaço na sociedade. Desta forma, esperamos que esta pesquisa, intitulada de “Homossexualidade Feminina: embates e desafios de assumir-se lésbica”, não tenha a intenção de ser conclusiva, uma vez que a mesma possui aspectos complexos, o que exige uma constante e contínua discussão.

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    TOURAINE, Alain. O mundo das mulheres. Petrópolis: Vozes, 2007


    APÊNDICE

    ROTEIRO DE ENTREVISTA

    1.Como você se descobriu tendo desejo por mulheres?

    2.Como foi para você aceitar sua orientação sexual?

    3.O que você sentiu/pensou quando isso aconteceu?

    4.Procurou alguma ajuda para que pudesse se assumir lésbica?

    5.Você acredita ser necessário que as pessoas saibam que você é lésbica? Por quê?

    6.Quais foram ou são os principais desafios e/ou enfrentamentos que você encontrou ao ter se assumido lésbica?

    7.Que limitações você encontrou na vivência de ser lésbica?

    8.O que mudou na sua vida após ter se assumido lésbica?

    9.Você se identifica com o termo “Lésbica” como caracterização da sua orientação sexual?

    10.Já sofreu algum tipo de violência por conta da sua orientação sexual? Qual?

    *Assistente Social. Graduanda em Letras Português. Mestranda em Direção de Recursos Humanos. Especialista em Organização e Gestão de Políticas Sociais. Pós-graduanda em Docência e Tutoria em Educação a Distância. Possui experiência em educação, gênero e diversidade. Atualmente é professora tutora do curso de Serviço Social da UNIT.