
Sem entrar no mérito de tal propositura, quero trazer neste post, o que é para mim, a principal mensagem de Lutero: SUA ANGUSTIA, e essa mensagem nós esquecemos, ela não acompanhou os pós-reformados, e nem é lembrada na herança da Igreja Reformada, mas sem tal angustia a reforma não teria sido o que foi. A conveniência posterior é esquecê-la, porque de fato esse elemento angustiante é sempre reformador, é sempre protesto, é sempre inquietação, e isso não é bom para as instituições, mas é essencial à salvação e a santidade. Assim Lutero compreendeu, viveu e pregou, reformou a Igreja por ter nele tal angustia inquietante, que não o permitia calar-se diante do pecado e diante de si mesmo!

Era ele um teólogo bíblico, um exegeta, sobretudo do Antigo Testamento. Ele começa a romper com o nominalismo, depois de haver mergulhado completamente nessa tradição escolástica. Condena a razão a ser porca, prostituta, quando trabalha em termos que não concerne sua habilidade de discernir. A razão para ele era um princípio ordenador na qual a revelação deveria ter primazia, iluminando a razão, e fazendo desta cativa à Palavra de Deus.
Lutero imaginava a existência humana in coram Deo, na presença de Deus. Deus jamais poderia ser o princípio primeiro, ou o Ser necessário, para Lutero não era objeto colocado em etapas- o grande pensamento escolástico. Para o reformador Deus não é raciocinado, sua existência não será verificada na razão, mas sim no encontro em juízo e misericórdia, significa exatamente que enquanto estamos à disposição de Deus, sempre, ele (Deus) nunca está à nossa. Segundo Lutero, acreditar em Deus dessa maneira é ter que cair de joelhos.

Christus pro me, em Cristo, o Deus soberano, realmente é por nós, não contra nós. Essa boa nova não poderia ser aprendida em abstrato, mas nas profundezas da experiência, apoderada na fé.
O caráter atormentado de Lutero faz dele o teólogo de sua época, uma época atormentada com o conceito de “quem pode ir para o céu”, assim o teólogo é o eterno Anfechtung, afetado, atormentado, angustiado, tentado, desesperado, agredido. Foi o próprio reformador que se utilizou do termo ao descrever seus “conflitos espirituais” na torturante busca do Deus misericordioso. Interessante, aqui, mas de fato esse legado não está na essência da Reforma- está na essência do reformador- de Lutero- mas não de seu legado. Não nos restou isso; essência é aquilo que permanece quando se retira tudo, é aquilo que faz algo ser, e não ser diferente daquilo que é. Sendo, exatamente, aquilo que fica. Diz Lutero: “ninguém deve seguir seu caminho, despreocupadamente, seguro, como se o diabo estivesse longe de nós.”. O anfechtung não deixa para o reformador, um dos lemas da reforma, cair na banalidade que chegou à nossa época, o tema sola fides não é uma crença fácil, a tentação e a experiência, nos diz da fé como uma arte difícil, afirma Lutero. Até mesmo, irritou-se com muitos por descaracterizarem o caráter do desespero à fé.

Entretanto Lutero fala do amor que é manifesto como a obra da regeneração; a vivência diante de Deus, manifestada no Cristo é expressa no próximo em amor. Esse amor é espontâneo, a justificação pela fé liberta o cristão para amar desinteressadamente, não como meio calculado dos próprios interesses e desejos. Mas em Cristo, como ele, despojados de ter que amar, mas completa doação por causa do outro.
Esse legado não nos restou, infelizmente não temos cristãos angustiados, mas sim juizes que apontam e dizem quem são os salvos e os que não são! 491 anos depois da Reforma e se Lutero estivesse vivo gritaria por outra urgente.